Mais de
200 espetáculos estiveram em cartaz no morno primeiro trimestre teatral paulistano
deste ano; só de autores brasileiros foram apresentadas 162 peças. Assisti a
cerca de 40, e considerando que algumas das montagens eu já havia assistido em
2012, devo ter coberto mais de 25% do total apresentado. Com exceção da
belíssima e pouco vista Cais ou Da
Indiferença das Embarcações, da contundente e engajada Morro Como Um País , da delicada Ensaio e da boa surpresa que foi o musical Quase Normal, nada mais foi digno de nota e de me tirar os pés do
chão, a não ser alguns notáveis espetáculos estrangeiros trazidos pelo The Wooster Group dos Estados Unidos (Hamlet),
pelo inglês Theatre Ad Infinitum (Translunar Paradise) e, principalmente,
pela arrebatadora coreana Jaram Lee com sua versão pansori de Mãe Coragem (experiência única, capaz de
surpreender um espectador com quase 50 anos de vivência como tal). De resto
foram espetáculos de medíocres a efetivamente ruins que desestimularam a saída
de casa para ir ao teatro.
JARAM LEE EM MÃE CORAGEM
Eis que
o segundo trimestre começou de forma animadora; pude assistir a cinco ótimos
espetáculos neste mês que ora finda:
- Escravas
do Amor: deliciosa adaptação de João Fonseca do folhetim homônimo de Suzana
Flag (Nelson Rodrigues) com o grupo Fudidos
Privilegiados do Rio de Janeiro.
- O
Líquido Tátil: após alguns espetáculos mal sucedidos, o grupo Espanca de Minas Gerais retoma o seu
humor corrosivo numa peça escrita e dirigida pelo argentino Daniel Veronese.
Metateatro envolvendo uma divertida discussão do que é melhor: cinema ou teatro
e fazendo muitas referências às obras de Tchekhov. Trio de atores excelentes.
- Armadilhas
Brasileiras: espetáculo da Cia.
do Feijão recém-estreado com texto de Pedro Pires e Zernesto Pessoa, com
direção do primeiro. Baseado na obra de Mário de Andrade, a montagem usa
recursos do metateatro para discutir a realidade brasileira. Bom elenco com
destaque para a interpretação visceral de Vera Lamy. As apresentações são gratuitas.
- Esta
Criança: texto do francês Joël Pommerat em mais uma ótima encenação do
paranaense Marcio Abreu da Companhia
Brasileira de Teatro. Dez cenas curtas apresentando relações limites entre
pais e filhos. Participação despojada de Renata Sorrah numa ótima
interpretação.
- Os
Vivos e os Mortos; mais uma incursão dramatúrgica de Kiko Marques que
mais uma vez prima pela delicadeza no tratamento de seus textos. Trata-se da
adaptação de um conto indiano sobre uma mulher que supostamente morreu e volta ao
mundo dos vivos. Flávia Pucci faz a morta com seu habitual talento e Kiko
Marques faz o seu guia de maneira hilária e com um toque de mineirice. Direção
de Francisco Gomes. Espetáculo com um alto astral.
Vamos
torcer para que essa tendência continue até o final da temporada.