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quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

A DRAMATURGIA BRASILEIRA NOS PALCOS PAULISTANOS EM 2020

  


1.   Balançando 2020

A classe teatral está sofrendo muito com o isolamento social provocado pela pandemia da covid 19. Teatros fechados e paralisação total das atividades em grupo há quase dez meses refletiram sobremaneira em todos aqueles ligados ao fazer teatral uma vez que a maioria só ganha quando há um espetáculo em ensaio ou em cartaz.

Muitos atores, atrizes, diretoras e diretores se refugiaram nos espetáculos virtuais que, se por um lado, não dão total realização (uma vez que teatro de verdade pressupõe a presença de público), por outro lado, lhes dá algum sustento nessa época difícil. Alguns, mas poucos, elementos da parte técnica podem se beneficiar desta nova atividade, mas a maioria ficou ao deus dará, muitos nem recebendo o auxílio emergencial do governo. Situação semelhante sofrem os assessores de imprensa e o pessoal de produção.

Abro esta matéria prestando a minha solidariedade a esses elementos tão importantes para o teatro como aqueles cujos nomes brilham nas marquises.

Já citei em outra matéria, mas repito aqui, a importância da série Protagonistas Invisíveis criada por André Grecco onde ele entrevista cenotécnicos, diretores de cena, camareiras, figurinistas, maquiadoras, técnicos de som e de luz, maquinistas, iluminadores e contrarregras. Não tenho maiores informações, mas sei que o Itaú Cultural desenvolveu projeto nos mesmos moldes. 

2.   E o autor brasileiro?

De maneira diversa, outro elemento da cadeia teatral bastante abalado em função da pandemia foi a dramaturgia brasileira.

O ano de 2020 começou bem. Nos três primeiros meses do ano estrearam ou reestrearam 147 espetáculos de dramaturgos brasileiros.

Em levantamento mensal realizado com dados do Guia de Teatro, chega-se à seguinte distribuição (média) para os espetáculos realizados nos palcos da cidade de 1º de janeiro a 15 de março:

- Dramaturgia brasileira: 45%

- Dramaturgia estrangeira: 14%

- Stand up: 8%

- Teatro infantil: 33%

 

Considerando apenas o teatro adulto, a distribuição seria:

- Dramaturgia brasileira: 76%

- Dramaturgia estrangeira: 24% 

O levantamento nos guias de teatro de São Paulo (Guia OFF, Guia de Teatro, Boca a Boca, Guia de A Folha de S. Paulo e Guia de O Estado de São Paulo) revelou a presença de 147 títulos de autores nacionais nesses primeiros dois meses e meio de 2020, onde podemos deduzir que, nesse curto período, a cidade abrigou cerca de 327 espetáculos teatrais, assim distribuídos:

- Dramaturgia brasileira: 147

- Dramaturgia estrangeira: 46

- Stand up: 26

- Teatro infantil: 108 

Um promissor começo que teve triste fim no domingo dia 15 de março quando os últimos teatros cerraram suas portas.

Foram 147 peças brasileiras, entre estreias e reestreias, no curto período de dois meses e meio das quais se pode destacar Fóssil de Marina Corazza, Arrimo de Rudinei Borges dos Santos, Dos Prazeres de Ivan Marsiglia, Bertoleza de Anderson Claudir e Le Tícia Conde, DOC.Malcriadas de Lee Taylor e Uma Lei Chamada Mulher de Consuelo de Castro, todas com dramaturgias elaboradas e consistentes.

Apenas Ivam Cabral e Rodolfo Gárcia Vázquez aparecem com quatro espetáculos em cartaz (todos reestreias), três em parceria e cada um deles com mais um. Nove autores comparecem com dois títulos e a grande maioria (124) com apenas uma peça. Até Nelson Rodrigues (2) e Plínio Marcos (1) não tiveram vez!

Foram 32 monólogos, 23 duos e 92 peças com três ou mais elementos em cena. 

Veio um período de silêncio e estupefação seguido das reações com os espetáculos virtuais que inundaram nossas vidas. Muitas peças realizadas nos teatros em anos anteriores foram adaptadas para a nova linguagem e, do que pude acompanhar, surgiram poucos novos textos; entre eles destaco alguns a que pude assistir: A Arte de Encarar o Medo de Ivam Cabral e Rodolfo García Vázquez, Heróis de Paulo Azevedo e A Semente da Romã de Luís Alberto de Abreu.

É muito pouco para um ano que começou tão bem.

Nem mesmo a Mostra de Dramaturgia em Pequenos Formatos do CCSP, importante evento revelador de novos textos pode apresentar os três textos contemplados com o edital do ano. 

2021 está batendo na porta, mas as perspectivas para um restabelecimento normal das atividades teatrais não são muito animadoras, porém:

-  Vamos acreditar na utopia possível de Ariane Mnouchkine,

- Vamos esperar pelos novos textos de Newton Moreno, Samir Yazbek, Silvia Gomez, Kiko Marques, Marina Corazza e tantos outros, que eu sei que estão só no aguardo da volta das atividades presenciais para botarem a boca no mundo,

-  E, principalmente, VAMOS DANÇAR como sugeria Pina Bausch: 

DANCE, DANCE... SENÃO ESTAMOS PERDIDOS!

 

30/12/2020





 


segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

ZESCAR TEATRO 2020

 

 

O melhor do teatro em São Paulo em 2020 na visão de José Cetra Filho.

Tenho perfeita consciência que 2020 não é um ano para comemorações, por outro lado acharia muito injusto não celebrar a importância dos espetáculos realizados no primeiro trimestre do ano e também as iniciativas daqueles que bravamente enfrentaram outras linguagens para nos oferecer o que se convencionou chamar de teatro virtual ou web teatro.

Perdemos vários artistas, muitos deles vítimas da covid 19: Flavio Migliaccio, Gésio Amadeu, Cecil Thiré, Jonas Mello, Nicette Bruno, Emílio Di Biasi, Maria Alice Vergueiro, Leonardo Vilar, Miss Biá, Rosaly Papadopol, Tunai, Aldir Blanc, Vanusa, José Mojica Marins, Moraes Moreira, Adelaide Chiozzo, Sérgio Ricardo, Zuza Homem de Mello, para citar apenas alguns. É muita perda para a nossa cultura!

   E o nosso país segue rumo ao precipício que além da pandemia tem esse (des)governo que como escreveu José Simão: "nem o Egito teve duas pragas ao mesmo tempo!"

Mas como diz a canção “faz escuro, mas eu canto” e o show tem que continuar e vamos ao que, no meu ponto de vista, aconteceu de melhor nas artes cênicas neste tenebroso 2020.

O ZESCAR é minha lista pessoal. Ele leva em conta os 46 espetáculos ao vivo e os 95 espetáculos virtuais a que assisti no ano e nada tem a ver com a minha participação em comissões de premiação onde os premiados são eleitos por votação e nem sempre correspondem àqueles que a meu ver são os melhores.

Confesso que tive certa dificuldade para acompanhar os espetáculos virtuais por vários motivos: dificuldade de acesso / quedas na Internet durante o espetáculo / perda de concentração nos “pontos mortos” da apresentação / fadiga diante da tela do notebook / excesso de ofertas.

Meus preferidos são contemplados “virtualmente” com o troféu ZESCAR.  

Essa história do ZESCAR começou com uma brincadeira. Há muitos anos que faço minha lista particular do que considero os melhores do teatro e do cinema. Minha cunhada um dia brincou perguntando quando eu ia distribuir o ZESCAR (amálgama de Zé com o Oscar do cinema norte americano). A partir daí esse se tornou o nome da minha lista e nos últimos anos eu a torno pública por meio deste blog.       

        Minha lista está dividida em categorias e não há um número certo para cada categoria (se listo só dois é porque foram só eles, assim como posso listar sete ou mais). Por categoria, a lista está em ordem alfabética.

Neste ano faço uma separação entre TEATRO (que só pode ser ao vivo!) e TEATRO VIRTUAL (neste caso ainda separo aqueles espetáculos criados diretamente para a linguagem virtual e outros que foram verdadeiras recriações virtuais de espetáculos originalmente criados para o teatro) 

        Seis títulos que comparecem na lista geral merecem um destaque à parte e o ZESCAR DE OURO!

CASA MÃE, espetáculo vindo da França com Phia Ménard, apresentado na MITsp. O terço final é uma das coisas mais impactantes (pelo conteúdo) e arrebatadoras (pela forma) a que eu assisti em toda minha longa vida de espectador tanto de teatro como de cinema.

        CENA INQUIETA, série com curadoria de Silvana Garcia e direção de Toni Venturi importantíssima por focar 55 grupos alternativos brasileiros nos eixos teatro negro, teatro de gênero e teatro sócio-político.

        JACKSONS DO PANDEIRO, delicioso espetáculo com o Grupo Barca dos Corações Partidos dirigido por Duda Maia criado para o palco, mas belissimamente adaptado para a linguagem virtual.


        PANDAS ou ERA UMA VEZ EM FRANKFURT (Bruno Kott)e A ARTE DE ENCARAR O MEDO (Rodolfo García Vázquez) pelo pioneirismo na realização de espetáculos virtuais originais.




        PROTOCOLO VOLPONE da Bendita Trupe com direção de Johana Albuquerque pelo pioneirismo em realizar espetáculo com presença de público seguindo todos os protocolos do isolamento social provocado pela pandemia da covid 19.


E o ZESCAR vai para:

ESPETÁCULOS:

TEATRO:

- Bertoleza

- Fóssil

- Na Polônia, Isso É Onde?

- Protocolo Volpone

TEATRO VIRTUAL:

CRIAÇÕES ORIGINAIS:

- A Arte de Encarar o Medo

- Heróis

- Jacksons do Pandeiro

- Pandas ou Era Uma Vez em Frankfurt

ADAPTAÇÔES PARA O FORMATO VIRTUAL QUE RESULTARAM EM UM NOVO ESPETÁCULO:

- A Desumanização

- A Frasqueira de Jacy

- Auto da Compadecida

- Cordel do Amor Sem Fim 

DIREÇÃO:

TEATRO:

- Anderson Claudir  (Bertoleza)

- Johana Albuquerque (Protocolo Volpone)

- Sandra Corveloni (Fóssil)

TEATRO VIRTUAL:

- Bruno Kott (Pandas)

- Daniel Alvim (Cordel do Amor Sem Fim) (*)

- Duda Maia (Jacksons do Pandeiro)

- Eduardo Tolentino de Araújo (A Penteadeira)

- José Roberto Jardim (A Desumanização) (*)

- Paulo Azevedo (Heróis)

- Rodolpho García Vázquez (A Arte de Encarar o Medo)

         (*) Recriações virtuais de espetáculos realizados em anos anteriores

ATRIZ:

TEATRO:

- Isabella Lemos (Uma Lei Chamada Mulher)

- Lavinia Pannunzio (Elisabeth Costello)

- Maristela Chelala (Das Dores)

- Natalia Gonsales (Fóssil)

TEATRO VIRTUAL:

- Denise Weinberg (Uma Aventura Parisiense)

- Luciana Paes (Olar Universo!)

- Martha Meola (Uma Mulher Só)

- Walderez de Barros (Tantas Palavras)

ATOR:

TEATRO:

- Maurício de Barros (Protocolo Volpone)

TEATRO VIRTUAL:

- Paulo Azevedo (Heróis)

DRAMATURGIA:

TEATRO:

- Anderson Claudir e Le Tícia Conde (Bertoleza)

- Marina Corazza (Fóssil)

TEATRO VIRTUAL:

- Luís Alberto Abreu (A Semente da Romã)

- Paulo Azevedo (Heróis)

ESPETÁCULOS INTERNACIONAIS:

TEATRO:

- By Heart (Portugal) (MITsp)

- Casa Mãe (França) (MITsp)

- Farm Fatale (Alemanha-França) (MITsp)

- Jerk (França) (MITsp)

TEATRO VIRTUAL:

- Sopro (Portugal)

- Os Persas (Grécia)

ESPECIAIS:

- Cena Inquieta: Série em 26 episódios dirigida por Toni Venturi sobre teatros de grupo brasileiros. Exibida no SESC TV.

- Entrevista com Ariane Mnouchkine por Eduardo Barata da APTR.

- História Recente: 22 mini documentários dirigidos por André Canto e Gabriel Miziara sobre espaços teatrais paulistanos. Exibidos no Youtube.

- Protagonistas Invisíveis: Série em 14 episódios idealizada por André Grecco e dirigida por Adriana S. Lopes sobre técnicos de teatro. Exibida no canal Arte 1.

SHOW, CONCERTO, ÓPERA, DANÇA

- Nada a comentar.


RESUMO: 

AO VIVO:           VIRTUAL:           TOTAL:

TEATRO: 43         TEATRO: 91         TEATRO: 134

SHOW: 3             SHOW: 2             SHOW: 5

CONCERTO: -      CONCERTO: -       CONCERTO: -

ÓPERA: -             ÓPERA: -             ÓPERA: -

DANÇA: -            DANÇA: 2            DANÇA: 2

TOTAL: 46          TOTAL: 95          TOTAL: 141

     E para finalizar, uma homenagem à querida NICETTE BRUNO que nos deixou há poucos dias.

Foto de Vânia Toledo (1992)

O TEATRO NOS UNE

O TEATRO NOS TORNA FORTE

VIVA O TEATRO! 

28/12/2020

 

 


sábado, 19 de dezembro de 2020

BORGHI EM REVISTA – ORIGENS

 

É sempre um prazer renovado ver e ouvir Renato Borghi contar suas histórias! Ele já o fez no espetáculo (2004) e no livro (2008) de mesmo nome. A apresentação virtual Meu Ser Ator transmitida no último julho pelo SESC era uma adaptação da peça de 2004.

Na noite de ontem, diretamente do palco do teatro do SESC Ipiranga, na companhia de Elcio Nogueira Seixas que operava o projetor e ia fazendo alguns direcionamentos, Borghi voltou a nos contar fatos de sua vida e nos cativou desde o primeiro momento quando canta uma canção da trilha de Branca de Neve e os Sete Anões que ele ouviu na sua infância cantada por uma voz que o encantou e que ele soube por sua mãe que era Dalva de Oliveira. Nunca mais aquele garoto foi o mesmo! E ele queria ser cantor!

Este belo espetáculo difere dos outros porque é realizado quase como uma palestra. Durante os 100 minutos da apresentação Borghi permanece sentado em uma cadeira comentando as imagens projetadas por Elcio e consegue nos segurar diante do notebook o tempo todo e ao final ainda ficamos com aquela sensação de querer mais.

Borghi inicia sua narrativa na Praça Tiradentes e na Cinelândia carioca na década de 1940 quando, ainda menino, acompanhava os avós nos teatros de revista e nos espetáculos de Dulcina, Eva Todor, Jayme Costa, Procópio Ferreira, Madame Henriette Morineau (e pensar que ele, anos mais tarde, iria atuar com ela) e Bibi Ferreira.

 Passa por sua mudança para São Paulo, a entrada na Faculdade de Direito, o teste com Sérgio Cardoso em 1958 para substituir um ator que deixava o elenco de Chá e Simpatia e sua estreia no Teatro Copacabana dando início à carreira de ator e acabando com aquela de cantor, a volta para São Paulo, o término da faculdade e o início da amizade com o Zé Celso Martinez Corrêa que deu origem ao Grupo Oficina. Nesta apresentação ele chega até a montagem de Gracias Señor (1972). Percorre assim, de maneira lúdica e divertida, 35 anos de sua vida dando uma verdadeira aula sobre o teatro ocorrido no Brasil nesse período e sobre a arte de contar uma história. Ele não conta nada de novo, mas o faz com tal irreverência, charme e simpatia que parece que estamos ouvindo aquelas histórias pela primeira vez, haja vista o delicioso momento em que imita Isaurinha Garcia cantando Velho Enferrujado e aqueles em que imita as vozes de Cacilda Becker, Sérgio Cardoso, Ziembinski, Eugênio Kusnet e, e claro, de Madame!

Os 48 anos restantes (de 1972 a 2020) podem fazer parte de Borghi em Revista – Destinos que os artistas pretendem apresentar caso haja interesse do SESC. Do meu lado já estou na fila para assistir a essa continuação! Enquanto isso estou aqui ouvindo alguém que também é minha paixão: Dalva de Oliveira!

BORGHI EM REVISTA – ORIGENS pode ser visto acessando youtube.com/sescsp. IMPERDÍVEL. 

19/12/2020

segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

DOCUMENTÁRIOS SOBRE TEATRO 2020


        Cinema? Televisão? Teatro? Tudo isso e muito mais e não resta a menor dúvida que o maior beneficiário dos documentários sobre os quais vou discorrer é o nosso glorioso e amado teatro.

        O maior evento ocorrido nesse formato foi a série CENA INQUIETA da qual se tratará a seguir, mas não podemos esquecer de outros dois, de menor proporção, mas não menos importantes:

PROTAGONISTAS INVISÍVEIS

 Criado por André Grecco e dirigido por Adriana S. Lopes onde foram focalizados 14 profissionais de teatro como cenotécnicos, maquinistas, contrarregras, operadores de som e luz, camareiras e diretores de palco, elementos que na maioria das vezes são ignorados pelo público, mas sem os quais, autores, diretores e elenco, com certeza, deixariam de brilhar. Os episódios com cerca de 25 minutos estão sendo apresentados no canal Arte 1 aos domingos às 21h. 

HISTÓRIA RECENTE

 

 Trata-se de mini documentários com cerca de cinco minutos idealizados pela Secretaria Municipal de Cultura e dirigidos por André Canto e Gabriel Miziara focalizando 22 importantes espaços teatrais da cidade de São Paulo. Os episódios foram veiculados a partir da Virada Cultural e podem ser visitados via Facebook. 

CENA INQUIETA

 Série de 26 episódios com cerca de 55 minutos veiculados pelo canal SESCTV às quintas feiras às 23h. Dirigida pelo cineasta Toni Venturi com curadoria de Silvana Garcia a série foca o teatro de grupo/alternativo realizado no Brasil e gira em torno de três eixos: teatro negro, teatro sócio-político e teatro de gênero, mas como declara o diretor “os trabalhos dos grupos se imbricam: qual o teatro negro ou de gênero que não é político?”

No meu modo de ver CENA INQUIETA foi o mais importante acontecimento teatral deste turbulento ano de 2020 e aquele que mais contribuiu para o fazer teatral e a divulgação do teatro de grupo, setor em geral ignorado pela mídia.

Foram apresentados relatos e cenas de espetáculos de 55 grupos dos estados de São Paulo (32), Rio de Janeiro (8), Belo Horizonte (5), Salvador (5) e Recife (5). Em relação aos eixos a distribuição foi a seguinte: Teatro sócio-político (21), Teatro de gênero (19) e Teatro Negro (15).

Não há como negar que muitos grupos importantes não foram contemplados e que houve concentração em apenas cinco capitais deste imenso Brasil, mas como diz um antigo provérbio “uma grande caminhada se inicia com o primeiro passo”. E este primeiro passo é a pedra basilar desse importante projeto que há de ter continuidade. Atenção SESC! Urge planejar uma segunda temporada de CENA INQUIETA!

Além da incontestável importância do conteúdo, belos planos fazem notável equilíbrio entre ele e a forma provando que a linguagem cinematográfica pode contribuir para mostrar a linguagem teatral. Outro ponto forte da edição do programa é a mesclagem harmoniosa de cenas de cada grupo criando um dinamismo que evita a monotonia da linearidade.

CENA INQUIETA é importante documento sobre o teatro contemporâneo de grupo e deve fazer parte do currículo de todas escolas de teatro do país. O exemplo desses jovens que sem muitos recursos e mesmo enfrentando toda sorte de preconceitos e dificuldades realizam teatro experimental militante da melhor qualidade precisa ser mostrado e servir de exemplo para aqueles que pretendem abraçar essa profissão tão ingrata, mas tão apaixonante.

CENA INQUIETA revela o olhar de um cineasta e de uma equipe que entendem e amam o teatro, mostrando também a importância do SESC na realização de projetos que incentivam a cultura brasileira.

 

Volto a repetir: A SÉRIE “CENA INQUIETA” FOI O MAIS IMPORTANTE EVENTO TEATRAL DO ANO 2020 E PRECISA SER RECONHECIDA POR ISSO!

 

14/12/2020

 

sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

PAIDEIA, CLARICE e LOS LOBOS BOBOS – TARDE DE GRANDES EMOÇÔES

 

Introdução necessária

Em março de 2019 na festa de entrega do Prêmio Shell 2018 conheci Aglaia Pusch  e Amauri Falseti da Paideia Associação Cultural, vencedores na categoria“Inovação” “pela relevância de seu trabalho na formação de plateia com intercâmbios nacionais e internacionais”, segundo os jurados do prêmio.

Batemos um papo muito agradável e eu, mesmo sabedor das atividades e fama da Paideia, por incrível que pareça e apesar de todas as minhas andanças pelos espaços teatrais da cidade, nunca tinha estado lá. Amauri muito simpático e receptivo insistiu para eu ir visita-los, mas um ano e meio se passou e eu não fui à Paideia.

Dezembro de 2020. As queridas e os queridos de Los Lobos Bobos iam apresentar Pescadora de Ilusão na Paideia e me convidaram para ir vê-los. A apresentação fez parte do XIV Festival Internacional Para a infância e Juventude – Uma Janela Para a Utopia-, organizado pela Paideia em plena pandemia, mas atendendo a todos os protocolos de segurança contra a covid 19, com espetáculos on line e também com a presença de público.

Completando os fatos, a peça seria apresentada no dia 10 de dezembro, data que se comemorava os cem anos do nascimento de Clarice Lispector.

Essa tríade irresistível me fez tomar coragem para sair de casa devidamente mascarado, pegar um 99 e me dirigir à Paideia, que além de tudo, fica relativamente perto da minha casa. 

Aqui começam as emoções 

A fachada da Paideia é linda e convidativa.

Fui recebido com muito carinho por Amauri da Paideia e GepeteanH de Los Lobos Bobos.

Amauri percorreu comigo as dependências do espaço. Tudo muito bem organizado com salas de teatro bem equipadas, um imenso galpão, quintal/jardim com parreiras de uva e árvores frutíferas, biblioteca, sala de cenografia, uma cozinha comunitária em construção, uma casa para alojar companhias estrangeiras ou de outros estados que venham a se apresentar no espaço e tantas outras coisas que a memória deste perplexo visitante não conseguiu guardar. Esse espaço, pertencente à Prefeitura, é ocupado pela Associação há 14 anos, apresentando espetáculos para crianças e jovens da região, objetivando a difusão de cultura e a formação de público. Premiada nacional e internacionalmente, muito se poderia escrever sobre a Paideia, mas isso é uma outra história que fica para uma outra vez!

17 horas! Hora de início do espetáculo que seria apresentado ao vivo para nós, privilegiados espectadores, e também virtualmente.

Foi muito bom rever Pescadora de Ilusão depois de três anos e meio (assisti em julho de 2017 junto com minha netinha Laura, xará da galinha de Clarice). A montagem continua redondinha e muito fiel à obra de Clarice Lispector. A exuberante e engraçada Carol Badra compartilha a cena com a ótima Badu Morais que substituiu Kátia Daher/Mel Lisboa. Carol falou ao final do espetáculo da emoção de fazer o espetáculo com presença de público e disso acontecer no dia do centenário de Clarice Lispector.

Um bate papo sobre Clarice coroou esse dia, dia esse daqueles para se pôr no bolso da memória e sacar quando bate aquela tristezinha que nos acomete de vez em quando.

Que dia, minha gente!

Meus agradecimentos  para a Paideia, para Los Lobos Bobos e, é claro, para Clarice Lispector.

 

11/12/2020

 

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

26 ANOS SEM TOM JOBIM

 

Uma homenagem ao nosso Maestro Soberano 

Eu por mim, curto este lindo planetinha. Enquanto me deixarem ficar por aqui, vou ficando. Se um dia tiver de ir, deve haver um bom lugar. Afinal, se Deus permite que se destruam milhões de árvores na Amazônia, assim, sem mais nem menos, é porque as faz renascer noutro lugar, onde também deve haver macacos, flores e passarinhos. É para lá que eu vou 

Nesta terça feira, dia 08 de dezembro de 2020, faz 26 anos que Tom Jobim partiu. A frase acima eu recolhi em uma exposição em 2001 realizada em sua homenagem no Rio de Janeiro.


Nos anos 1990 Tom já denunciava o desmatamento da Amazônia.

O que ele diria do que acontece hoje e de como nosso Brasil enfeiou de lá para cá destruindo sabiás e demais passarins, matando botos, caçando onças, dizimando curumins e enlameando as águas de março? 

A canção “Borzeguim” de 1987 já clamava: 

Deixa o mato crescer em paz

Deixa o mato

Deixa...

...................

Deixa o índio vivo no sertão

Deixa o índio vivo nu

Deixa o índio vivo

Deixa o índio

Deixa...

........................

Escuta o mato crescendo em paz

Escuta o mato crescendo

Escuta o mato

Escuta...

.......................

Deixa o índio criar seu curumim

VÁ EMBORA DAQUI COISA RUIM

SOME LOGO, VÁ EMBORA...

................................

Deixa a onça viva na floresta

Deixa o peixe n’água que é uma festa

Deixa o índio vivo

Deixa o índio

Deixa...” 

Puxa Tom, nosso Maestro Soberano, que falta você faz!

Ruy Castro lembrou, em uma de suas crônicas, como Tom fazia bem a este planetinha: 

 Todas as vezes que Tom abriu o piano, o mundo melhorou. Mesmo que por poucos minutos, tornou-se um mundo mais harmônico, melódico e poético. Todas as desgraças individuais ou coletivas pareciam menores porque, naquele momento, havia um homem dedicando-se a produzir beleza. O que resultasse de seu gesto de abrir o piano – uma nota, um acorde, uma canção – vinha tão carregado de excelência, sensibilidade e sabedoria que, expostos à sua criação, todos nós, seus ouvintes, também melhorávamos como seres humanos”

        Obrigado Tom!

E que você esteja em paz naquele lugar com muitos macacos, flores e passarinhos. Com certeza é lá que você está.



 

08/12/2020