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segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

GENTE JOVEM REUNIDA


Os espetáculos de grupos teatrais de jovens egressos de escolas e oficinas de teatro em 2016.

         Assisti a cerca de 250 peças em 2016. Como sempre coisas ótimas recheadas com algumas médias e também, outras das quais nem é bom escrever; mas o maior presente que o teatro paulistano me deu neste ano foi a revelação de bons espetáculos realizados por grupos de jovens egressos de escolas ou oficinas de teatro. Textos escolhidos a dedo conduzidos por diretor profissional foram uma constante nesses trabalhos.
         Posso citar, na ordem em que assisti, nove montagens de alto nível profissional que me faz acreditar que nosso teatro tem futuro podendo contar com o talento dessa moçada que, em geral, ainda não atingiu os trinta anos.

         A surpresa começou no final de 2015 com O TAMBOR E O ANJO, texto de Anamaria Nunes sobre traumas de uma jovem advindos do regime de terror instaurado no Brasil a partir de 1964. Dirigido por André Garolli, o texto foi bravamente defendido por ex-alunos da Escola de Atores Wolf Maya. Na ocasião (01/12/2015) escrevi “Fica a sugestão de fazerem apresentações nas escolas ocupadas pelos estudantes secundários que estão dando exemplo de cidadania que há muito não se via em nossas plagas. A posição autoritária e truculenta do governo do estado não difere das ações realizadas pelos militares naquela época. A história pode se repetir e cabe a nós, cidadãos, tentar revertê-la”. Hoje acrescento: a história ESTÁ se repetindo!

         Para MAIS QUERO ASNO QUE ME CARREGUE QUE CAVALO QUE ME DERRUBE foi criado o grupo Quintal do Aventino com atores formados na Escola Célia Helena de Teatro. Montagem irreverente do delicioso texto do injustamente pouco montado Carlos Alberto Soffredini, com direção de Ednaldo Freire. A peça deve voltar ao cartaz em 2017.

         O já clássico MARAT SADE de Peter Weiss recebeu corajosa e bem sucedida montagem dirigida por Reginaldo Nascimento com o Teatro da Pequena Morte formado por atores vindos do Teatro Escola Macunaíma. 23 atores movimentavam-se no pequeno espaço do Teatro Commune para criar o ambiente impactante do Hospício de Charenton, onse se passa a ação da peça.

         Atores formados em 2014 no INDAC formaram a Companhia Teatro da Dispersão e montaram com direção de Thiago Ledier O ESPECTADOR CONDENADO À MORTE do romeno Matéi Visniec. Poucas vezes pôde-se testemunhar tamanha homogeneidade em elenco formado por jovens provenientes de um curso de teatro. Cada ator/atriz criou o tipo solicitado pelo texto de maneira impecável e fica difícil destacar uma ou outra interpretação.

         RICARDO III NÃO TERÁ LUGAR ou CENAS DA VIDA DE MEIERHOLD é uma das peças mais instigantes de Matéi Visniec usando e abusando do meta-teatro para mostrar os delírios de Meierhold durante os ensaios de Ricardo III de Shakespeare. A jovem companhia Grupo Pandora de Teatro sediada no bairro de Perus enfrentou a difícil tarefa de levar essa peça à cena e o fez com excelentes resultados. É sempre entusiasmante quando vemos jovens de talento arriscando-se em empreitadas desse porte e saindo-se muito bem. O diretor Lucas Vitorino, assim como todo o elenco, está na faixa dos 30 anos.

         Desta vez foram os jovens advindos do Núcleo Experimental de Artes Cênicas do Sesi-SP que provocaram impacto com seus despojamento, talento e coragem ao interpretar os personagens complexos do instigante TIROS EM OSASCO de Cássio Pires com direção de Yara de Novaes.

         Fernanda Maia – A maga – teve a feliz ideia de conciliar Sonhos de Uma Noite de Verão de Shakespeare com canções do Clube da Esquina e criou junto com jovens egressos de oficina realizada no Núcleo Experimental o belo e poético SONHOS NÃO ENVELHECEM. É notável o rendimento dessa rapaziada, alguns deles em sua primeira experiência teatral. Compensam bravamente a justificada inexperiência com a energia e o entusiasmo com que se entregam ao trabalho.

         Os atores selecionados em 2016 para o Núcleo TUSP em São Paulo dirigidos por René Piazentin criaram a versão reduzida, porém mantendo o espírito do original, da já célebre MAHAGONNY de Bertolt Brecht. Crítica feroz ao capitalismo, a peça continua, infelizmente, muito atual. As lindas canções de Kurt Weill são apenas sugeridas, mas isso não tira o brilho da ótima montagem onde os atores criam com muita garra os complexos personagens brechtianos.

         Uma jovem autora/diretora (Carol Rainatto) e um jovem diretor (Lucas Romano) unidos a um jovem elenco para criar MEIA-NOITE, FELIZ NATAL; texto e montagem na melhor tradição naturalista com história bem contada sobre reunião familiar que termina desastrosamente. Em tempos de pós-dramático e narrações fragmentadas é interessante notar essa preocupação jovem por formas teatrais convencionais que, quando bem realizadas – como é o caso- são muito bem vindas.

         Outros jovens marcaram presença na temporada teatral de 2016:

         Vinicius Calderoni apresentou o excelente Os Arqueólogos (Prêmio APCA de melhor texto) e Cláudia Barral surpreendeu com Hotel Jasmim ambos provenientes da bem sucedida II Mostra de dramaturgia em pequenos formatos cênicos do CCSP idealizada por Kil Abreu, que se espera tenha continuidade, apesar das mudanças previstas na área cultural da prefeitura.

         Na área interpretativa os jovens também brilharam: Mateus Monteiro (Amarelo Distante/Playground), Leonardo Fernandes (Cachorro Enterrado Vivo – Prêmio APCA de melhor ator), Nicole Cordery (Alice – Retrato de Mulher Que Cozinha ao Fundo).

         Muitos veteranos (alguns ainda bastante jovens) marcaram presença no ano teatral, mas isso é outra história, que fica para outra vez.

         Acredito, pelo menos no teatro, em um final menos pessimista para a canção de Belchior:

         “Já faz tempo
         Eu vi você na rua
         Cabelo ao vento
         Gente jovem reunida
         Na parede da memória
         Essa lembrança
         É o quadro que dói mais...”


VIVA O TEATRO!

12/12/2016

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