Os
espetáculos de grupos teatrais de jovens egressos de escolas e oficinas de
teatro em 2016.
Assisti
a cerca de 250 peças em 2016. Como sempre coisas ótimas recheadas com algumas
médias e também, outras das quais nem é bom escrever; mas o maior presente que
o teatro paulistano me deu neste ano foi a revelação de bons espetáculos
realizados por grupos de jovens egressos de escolas ou oficinas de teatro.
Textos escolhidos a dedo conduzidos por diretor profissional foram uma
constante nesses trabalhos.
Posso
citar, na ordem em que assisti, nove montagens de alto nível profissional que
me faz acreditar que nosso teatro tem futuro podendo contar com o talento dessa
moçada que, em geral, ainda não atingiu os trinta anos.
A
surpresa começou no final de 2015 com O
TAMBOR E O ANJO, texto de
Anamaria Nunes sobre traumas de uma jovem advindos do regime de terror
instaurado no Brasil a partir de 1964. Dirigido por André Garolli, o texto foi
bravamente defendido por ex-alunos da Escola
de Atores Wolf Maya. Na ocasião (01/12/2015) escrevi “Fica a sugestão de fazerem apresentações nas escolas ocupadas pelos
estudantes secundários que estão dando exemplo de cidadania que há muito não se
via em nossas plagas. A posição autoritária e truculenta do governo do estado
não difere das ações realizadas pelos militares naquela época. A história pode
se repetir e cabe a nós, cidadãos, tentar revertê-la”. Hoje acrescento: a
história ESTÁ se repetindo!
Para
MAIS QUERO ASNO QUE ME CARREGUE QUE
CAVALO QUE ME DERRUBE foi criado o grupo Quintal do Aventino com atores formados na Escola Célia Helena de Teatro. Montagem irreverente do delicioso
texto do injustamente pouco montado Carlos Alberto Soffredini, com direção de
Ednaldo Freire. A peça deve voltar ao cartaz em 2017.
O
já clássico MARAT SADE de Peter Weiss
recebeu corajosa e bem sucedida montagem dirigida por Reginaldo Nascimento com
o Teatro da Pequena Morte formado por
atores vindos do Teatro Escola Macunaíma. 23 atores movimentavam-se no
pequeno espaço do Teatro Commune para criar o ambiente impactante do Hospício de Charenton, onse se passa a ação da peça.
Atores
formados em 2014 no INDAC formaram a Companhia Teatro da Dispersão e montaram com direção de Thiago Ledier O ESPECTADOR
CONDENADO À MORTE do romeno Matéi Visniec. Poucas vezes pôde-se testemunhar
tamanha homogeneidade em elenco formado por jovens provenientes de um curso de
teatro. Cada ator/atriz criou o tipo solicitado pelo texto de maneira impecável
e fica difícil destacar uma ou outra interpretação.
RICARDO III NÃO TERÁ LUGAR ou CENAS DA VIDA
DE MEIERHOLD é uma das peças mais instigantes de Matéi Visniec
usando e abusando do meta-teatro para mostrar os delírios de Meierhold durante
os ensaios de Ricardo III de
Shakespeare. A jovem companhia Grupo
Pandora de Teatro sediada no bairro de Perus enfrentou a difícil tarefa de
levar essa peça à cena e o fez com excelentes resultados. É sempre
entusiasmante quando vemos jovens de talento arriscando-se em empreitadas desse
porte e saindo-se muito bem. O diretor Lucas Vitorino, assim como todo o
elenco, está na faixa dos 30 anos.
Desta vez foram os
jovens advindos do Núcleo Experimental de
Artes Cênicas do Sesi-SP que
provocaram impacto com seus despojamento, talento e coragem ao interpretar os personagens
complexos do instigante TIROS EM OSASCO
de Cássio Pires com direção de Yara de Novaes.
Fernanda
Maia – A maga – teve a feliz ideia de conciliar Sonhos de Uma Noite de Verão
de Shakespeare com canções do Clube da
Esquina e criou junto com jovens
egressos de oficina realizada no Núcleo
Experimental o belo e poético SONHOS
NÃO ENVELHECEM. É notável o rendimento dessa
rapaziada, alguns deles em sua primeira experiência teatral. Compensam
bravamente a justificada inexperiência com a energia e o entusiasmo com que se
entregam ao trabalho.
Os atores selecionados em 2016 para o Núcleo TUSP em São Paulo dirigidos por René Piazentin criaram a
versão reduzida, porém mantendo o espírito do original, da já célebre MAHAGONNY de Bertolt Brecht. Crítica
feroz ao capitalismo, a peça continua, infelizmente, muito atual. As lindas
canções de Kurt Weill são apenas sugeridas, mas isso não tira o brilho da ótima
montagem onde os atores criam com muita garra os complexos personagens
brechtianos.
Uma jovem autora/diretora (Carol Rainatto) e um jovem
diretor (Lucas Romano)
unidos a um jovem elenco para criar MEIA-NOITE,
FELIZ NATAL; texto e montagem na
melhor tradição naturalista com história bem contada sobre reunião familiar que
termina desastrosamente. Em tempos de pós-dramático e narrações fragmentadas é
interessante notar essa preocupação jovem por formas teatrais convencionais
que, quando bem realizadas – como é o caso- são muito bem vindas.
Outros
jovens marcaram presença na temporada teatral de 2016:
Vinicius
Calderoni apresentou o excelente Os
Arqueólogos (Prêmio APCA de melhor texto) e Cláudia Barral surpreendeu com Hotel Jasmim ambos provenientes da bem
sucedida II Mostra de dramaturgia em pequenos formatos cênicos do CCSP idealizada por Kil Abreu, que
se espera tenha continuidade, apesar das mudanças previstas na área cultural da
prefeitura.
Na
área interpretativa os jovens também brilharam: Mateus Monteiro (Amarelo
Distante/Playground), Leonardo Fernandes (Cachorro Enterrado Vivo – Prêmio APCA
de melhor ator), Nicole Cordery (Alice – Retrato de Mulher Que Cozinha ao
Fundo).
Muitos
veteranos (alguns ainda bastante jovens) marcaram presença no ano teatral, mas
isso é outra história, que fica para outra vez.
Acredito,
pelo menos no teatro, em um final menos pessimista para a canção de Belchior:
“Já faz tempo
Eu vi você na rua
Cabelo ao vento
Gente
jovem reunida
Na parede da memória
Essa lembrança
É o quadro que dói mais...”
VIVA O TEATRO!
12/12/2016
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