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sábado, 10 de fevereiro de 2018

FUNÂMBUL@S


        Concepções cênicas arrojadas, criativas e arrebatadoras têm sido constantes nas encenações de Eric Lenate e Funâmbul@s não foge à regra. Em palco quase nu, o diretor brinca com as luzes, com os sons e os movimentos do elenco para criar espetáculo feérico que enche os olhos do espectador desde a primeira em cena onde a personagem Júlia anda na corda bamba.
        Problemas técnicos no som inviabilizaram a apresentação na estreia. Tendo recebido o texto na ocasião, tive a oportunidade de lê-lo antes de assistir à montagem na semana seguinte. Priscila Gontijo usa mote muito simples e corriqueiro - três irmãs às voltas do que fazer com o pai senil – para desenvolver narrativa fragmentada onde se entrelaçam três situações: peça/realidade/sonho. Apesar de entremear talentosamente teatro do absurdo, metalinguagem e teatro realista a dramaturga às vezes recai em certa prolixidade que prolonga desnecessariamente a trama. Na leitura do texto nem sempre ficou claro para este leitor em qual das três situações se estava e fiquei curioso em ver como o diretor resolveria esse aspecto.
        A prolixidade que vejo no texto se acentua na montagem: o longo monólogo de Júlia na corda bamba que aparece duas vezes no texto, na encenação é repetido três vezes e a cena onde Seu Augusto em seu desvario interpreta uma cena de Júlio Cesar transformou-se em um longo pot-pourri de falas de personagens das peças de Shakespeare que se por um lado mostram o imenso talento de ator de Lenate, por outro prolongam ainda mais a peça.
        Quanto às três situações (peça, realidade, sonho) o encenador tenta fazer a diferenciação por meio do belo jogo de luz criado por Aline Santini, mas nem sempre isso fica claro para o espectador. Juntem-se à iluminação, os figurinos clownescos de Rosângela Ribeiro, a precisa trilha sonora de L.P. Daniel. os adereços de Lenate e o visagismo (não creditado) para criar junto com a movimentação do elenco um todo que funciona de maneira harmoniosa e perfeitamente sincronizada.


        Quanto ao elenco, a primeira surpresa vem com a personagem criada por Michelle Boesche. Michelle revela profundo preparo físico para andar na corda bamba, fazer piruetas em cena e preparo interpretativo ao fazer tudo isso dando humanidade à sua Júlia.
        Vanise Carneiro cria a extrovertida Clara jogando muito bem com as variações vocais exigidas pela personagem.
        A mais humana das três, Ana, ao que me parece, é o alter ego da dramaturga, não só por também ser escritora, mas pelas posições que defende. Rafaela Cassol defende Ana com muito carinho e talento.
        Eric Lenate vive Seu Augusto com expressão corporal que jamais esquece a velhice e a senilidade do personagem. Revela muita ternura e compreensão do mundo no belo diálogo com a filha Ana quase ao final, assim como sua versatilidade como ator no já citado intermezzo shakespeariano.
        Pela proposição do encenador o elenco emite sua voz em falsete durante quase toda a apresentação, fato que em certos momentos dificulta a compreensão do texto.

          Fotos de Leekyung Kim

        FUNÂMBUL@S está em cartaz no Centro Cultural São Paulo até 11/03/2018 ás sextas e sábados (21h) e domingos (20h)

10/02/2018

        

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