Páginas

sexta-feira, 13 de julho de 2018

AGOSTO



         Certa vez conversando com o diretor do Grupo TAPA, Eduardo Tolentino, ele me disse que gostaria muito de montar Agosto: Osage County do dramaturgo norte americano Tracy Letts, mas a peça exigia a construção de cenário grandioso que representava em corte uma antiga casa do sul dos Estados Unidos de três andares o que inviabilizava a produção por duas razões: o alto custo e o uso exclusivo do palco do teatro durante toda a temporada da peça, algo quase impossível nos dias de hoje, onde a maioria dos teatros mais parece shopping centers com mais de três peças simultaneamente em cartaz. Essa conversa ficou em minha memória junto com o desejo de assistir à peça em nossos palcos, pois eu havia assistido ao filme homônimo nela baseado, que no Brasil foi rebatizado como Álbum de Família, mesmo título da famosa peça de Nelson Rodrigues.
         Em 2017 eu soube que André Paes Leme montava a peça no Rio de Janeiro tendo Guida Vianna à frente do elenco no papel de Violet, personagem de Meryl Streep no filme citado acima. Impedido de ir até o Rio persistiu a vontade de assistir ao espetáculo.
         Eis que neste 12 de julho de 2018 a montagem chegou a São Paulo no icônico Teatro Anchieta, palco, desde 1967, de espetáculos tão importantes para o teatro brasileiro e todas as emoções que eu acreditava que ia sentir, se concretizaram no espetáculo apresentado.
         A montagem de André Paes Leme é superlativa em toda a sua simplicidade, a partir do cenário. Segundo ele, as necessidades oriundas de restrições de produção, o obrigaram a reduzir o cenário a um palco nu, com alguns adereços e concentrar as mudanças de locais da ação na iluminação (belíssimo trabalho de Renato Machado). Essa concepção fez com que o encenador criativamente intercalasse ações e até falas, dando um frescor e uma beleza ao trabalho, jamais imaginada, creio eu, nem pelo autor da peça, que sempre teve a mesma encenada com cenários realistas. O cenário original é descrito no início da peça pela empregada Johnna e está implícito em sua fala o pedido famoso de Shakespeare na abertura de Henrique IV, para que com o auxílio da imaginação o público “veja” os diversos aposentos onde se passam as ações.
         Nada contra as narrativas fragmentadas surgidas após o advento do teatro pós-moderno, mas como é bom ouvir uma boa história, desde que bem contada, dentro dos cânones da dramaturgia tradicional, com começo, meio e fim e com diálogos fluentes e bem estruturados. E Tracy Letts faz isso muito bem, como já tínhamos visto em Killer Joe (filme e peça aqui montada por Mário Bortolotto). Louve-se a ótima tradução do texto realizada por Guilherme Siman, também presente no elenco.

Letícia Isnard e Guida Vianna

         O elenco de onze atores é ótimo e homogêneo e a peça oferece momentos de destaque para cada personagem, mas não há como salientar os papéis de Barbara e Violet, as verdadeiras protagonistas, aqui vividas com muito brilho, respectivamente, por Letícia Isnard (atriz pouco presente nos palcos paulistanos) e a talentosíssima Guida Vianna, que acompanho desde 1981 quando assisti ao inesquecível Poleiro dos Anjos, com o seu grupo Pessoal do Cabaré, dirigido por Buza Ferraz.
         Um aparte: Levei o programa de Poleiro dos Anjos para mostrar à Guida Vianna e as fotos abaixo podem testemunhar a emoção e a alegria que tomou conta de nós dois.




Esta é a foto de 1981 que estamos vendo. Guida Vianna está na frente, ao centro.

         Voltando a Agosto: É um espetáculo forte com dramaturgia consistente, tradução cênica criativa e bela, interpretado por elenco talentoso e que desde já pode ser considerado um dos melhores já apresentados em nossos palcos neste ano.
         No programa, a idealizadora do projeto, Maria Siman, inicia o seu texto com a frase “Gosto de histórias” e nada mais coerente com esse pensamento o fato dela escolher para produzir o drama dessa família disfuncional do árido sul dos Estados Unidos tão bem retratada no texto de Tracy Letts.
         As fortes emoções contidas nos 130 minutos de duração do espetáculo e a excelência do mesmo, assim como o precioso trabalho de Guida Vianna e do elenco, fazem com que esse tempo passe em um piscar de olhos e só nos traga de volta à realidade na ovação final. Além disso, com certeza, você vai ver alguém de seu conhecimento retratado em uma das 12 personagens da peça.

         AGOSTO está em cartaz no Teatro Anchieta de quinta a sábado às 21h e domingo às 18h até 05/08/2018. ABSOLUTAMENTE IMPERDÍVEL!

         13/08/2018





Nenhum comentário:

Postar um comentário