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sábado, 6 de outubro de 2018

AS IRMÃS SIAMESAS



        Em nome da contemporaneidade tenho visto muitos Shakespeares histéricos, Tchekhovs mais que gritados; urrados. Será que é necessário berrar um texto clássico para provar que ele é atual e reflete essa realidade de ódio que o Brasil está vivendo? Vejo um grande equívoco nessa postura e foi com o desagradável eco dessas últimas experiências que me dirigi ao Teatro Aliança Francesa para assistir a As Irmãs Siamesas cujas atrizes eu não conhecia e minhas únicas referências eram o autor José Rubens Siqueira (Prêmio APCA de melhor autor em 1987 com esta peça) e o diretor Sébastien Brottet- Michel (ator nos dois espetáculos do Théâtre du Soleil que foram apresentados em São Paulo em 2007 e 2011).
        Que diferença! Ao se apagarem as luzes da plateia a silhueta de duas mulheres sobre um fundo de cor bege clara já antecipa a beleza e a delicadeza do que está por vir.
        Duas irmãs conversam após a morte da mãe numa cidade do interior. Uma se emancipou e foi morar em São Paulo, a outra permaneceu na cidade do interior, casou, teve um filho, ficou viúva e cuidou da mãe até a sua morte. Em um jogo de atração e rejeição as duas conversam sobre o que a vida fez com elas remexendo memórias e as roupas de um baú. Dentro desse baú há outro menor que contém objetos e cartas que foram da falecida. A própria casa representada no cenário por um grande baú é a principal caixa de memórias dessas duas mulheres que, cada uma à sua maneira, são muito solitárias e frágeis.
        A encenação de Brottet-Michel prima pela delicadeza. Tudo é harmonioso desde os figurinos de Kene Heuser cujas cores combinam com as nuances que o cenário de Marisa Rebolo vai adquirindo por meio da belíssima iluminação de Rodrigo Alves. Creio que alguém que não entendesse uma palavra do espetáculo se encantaria com a movimentação das atrizes nesse espaço e com a envolvente trilha sonora de Wayne Hussey.


        E por falar em atrizes, mais uma grata surpresa. Além de terem o aspecto físico apropriado para seus papeis (Nara Marques é bastante alta e exuberante e Cinthya Hussey é bem mais baixa e tem aparência frágil), elas têm excelente desempenho jogando muito bem com as mudanças de estado de espírito requeridas pelas personagens. Não há a mais forte ou a mais fraca e em cada momento é uma delas que “está ganhando o jogo”.  
        As Irmãs Siamesas é de uma beleza ímpar e conta bonita história de amor fraternal que um cordão umbilical insiste em manter. Excelente antídoto para o veneno que a realidade está nos injetando. IMPERDÍVEL!

        AS IRMÃS SIAMESAS está em cartaz no Teatro Aliança Francesa às sextas e aos sábados às 20h30 e aos domingos às 19h.

        06/10/2018

Um comentário:

  1. eu tb adorei esse espetáculo. excelente resenha! é muito interessante mesmo o texto quando a aparentemente mais frágil mostra uma força assustadora e vice-versa. é lindo esse jogo. minha postagem está aqui http://mataharie007.blogspot.com/2018/10/as-irmas-siamesas.html

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