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domingo, 26 de julho de 2020

OS PERSAS no TEATRO DE EPIDAURO



TEATRO NACIONAL DA GRÉCIA

        Ésquilo (525-AC-456-AC) era o mais velho dos três grandes trágicos gregos, seguido de Sófocles (497-AC-406-AC) e Eurípedes (480-AC-406-AC) e sua peça Os Persas é considerada a mais antiga tragédia completa do teatro ocidental, por isso revestiu-se da maior importância a apresentação a que o planeta teve a oportunidade de assistir diretamente do teatro de Epidauro na Grécia no último sábado (25/07/2020).
        Uma hora antes da apresentação as câmeras já mostravam o público chegando naquele espaço mítico que foi sendo preenchido aos poucos até ficar completamente lotado ao se aproximar a hora do início do espetáculo. Uma lua crescente compareceu no firmamento para abrilhantar essa noite tão especial.
 
 
        Ésquilo escreveu uma tragédia (472-AC) que lhe era contemporânea ocorrida apenas oito anos antes (480-AC): a derrota dos persas pelos gregos na batalha naval de Salamina. Vista sob o ponto de vista dos perdedores, a peça põe em cena a rainha Atossa, o fantasma do seu marido Dario, um mensageiro e o filho derrotado, rei Xerxes, tudo sob a vista do coro de fiéis.
 
 
        A encenação de Dimitri Lignadis não enfeita nada e é extremamente limpa com cenas de conjunto extremamente harmoniosas. O coro tem seu ponto de referência em cadeiras situadas ao fundo do espaço cênico, mas também atua neste, realizando belíssimo trabalho coreográfico. Sem sair de cena o coro acompanha e dialoga com as falas de Atossa (trabalho visceral da atriz cujo nome desconheço), do mensageiro (responsável pela cena mais impactante do espetáculo quando ele descreve para a rainha a derrota sofrida pelos persas), do fantasma de Dario e com o cantar lamentoso de Xerxes que encerra a trama.
        Todos os homens vestem roupas brancas com inscrições e manchas vermelhas de sangue e a rainha usa um portentoso vestido negro, dando muita dignidade ao figurino como um todo.
        Interpretações perfeitas de todo o elenco, com destaque para o ator que representa o mensageiro.
        O único senão foi a dificuldade de ler as legendas em inglês quando sobrepostas a um fundo branco.
        Excelente programa. Um verdadeiro presente de grego.
 
        26/07/2020

terça-feira, 14 de julho de 2020

BALANÇO TEATRAL 1º SEMESTRE 2020



O que ocorreu nos palcos, nos celulares e nos notebooks.

        O ano teatral de 2020 iniciou muito bem com o Grupo TAPA apresentando Strindberg (Brincando Com Fogo) no palco do Teatro Aliança Francesa e daí em diante tivemos alguns espetáculos memoráveis nos palcos paulistanos, como Fóssil (de grande impacto visual e belo trabalho de Natalia Gonsales), De Todas as Maneiras que Há de Amar (também do Grupo TAPA com Clara Carvalho e Brian Penido Ross), Elisabeth Costello (interpretação antológica de Lavinia Pannunzio), Dos Prazeres (outra maravilha com Maristela Chelala), Na Polonia, Isso É Onde (deliciosa incursão no mundo de Tadeuz Kantor pelo Grupo OPOVOEMPÉ), Por Que Não Vivemos (denso espetáculo da Companhia Brasileira de Teatro), a delícia e a denúncia de Bertoleza pelo Grupo Gargarejo Cia. Teatral, Doc. Malcriadas, (interessante incursão do Núcleo de Artes Cênicas coordenado por Lee Taylor ao universo das empregadas domésticas) e Uma Lei Chamada Mulher (forte espetáculo escrito por Consuelo de Castro sobre a violência contra a mulher com bela direção de Lenise Pinheiro e interpretação corajosa de Isabella Lemos). E assim chegamos ao fim de fevereiro contabilizando, em apenas dois meses, dez espetáculos dignos de nota e merecedores de serem indicados entre os melhores do ano. Promissor, não é mesmo?
 

        O mês de março abriu com a MITsp que trouxe espetáculos também memoráveis como By Heart (Portugal), Jerk (França), Farm Fatale (Alemanha/França) e, principalmente, aquele que foi o impacto da Mostra, Casa Mãe (França).
 
        Os guias de teatro prometiam ótimas estreias para os próximos dias e Celso Curi escrevia um entusiasmado editorial no Guia OFF de março: “Acionando as turbinas. Fim da temporada de festas, agora é pra valer. A cidade se agita e apresenta uma temporada repleta de opções”.
        Entre os títulos prometidos ou recém estreados estavam, entre outros, O Arquiteto e o Imperador da Assíria, Escombros, o primeiro espetáculo do projeto do SESC, Estação Teatro Russo: Tchekhov, O Náufrago, Neblina (peça de Sergio Roveri, que reabriria o teatro do Centro Cultural Banco do Brasil em abril e traria de volta a São Paulo o ator mineiro Leonardo Fernandes) e até musicais sobre Silvio Santos e Donna Summer.
 
 
        Mal sabíamos que o março teatral ia acabar no dia 14!

        Uma das primeiras notícias que chegaram a mim sobre a possibilidade de assistir teatro no notebook foi que a peça Sopro do português Tiago Rodrigues (o mesmo do bem sucedido By Heart) estava disponível no youtube. Assisti e gostei mesmo com as limitações da telinha e do acontecimento não ser presencial. E aí começaram as lives, umas mais bem sucedidas que outras, pelo fato que todos estavam experimentando as novas ferramentas. Entre os espetáculos bem sucedidos cabe notar Pandas ou Era Uma Vez em Frankfurt, projeto inovador de Bruno Kott, utilizando a tecnologia do Zoom e A Arte de Encarar o Medo do Grupo Os Satyros, ambas fazendo um proveitoso e aconchegante debate com o público, ao final do espetáculo.

 
          O SESC ao vivo também é projeto muito bem sucedido, no que se refere a teatro, apresentando excelentes monólogos de curta duração (máximo de 45 minutos) com atores do calibre de Clara Carvalho, Cassio Scapin (inigualável na personificação de Myrian Muniz em Eu Não Dava Praquilo), Debora Falabella, Teuda Bara e Pascoal da Conceição. 
         Lives com leituras dramáticas em geral têm-se mostrado cansativas e monótonas.
        É impossível dar conta de todas as ofertas de lives teatrais (se pode chamar assim?), sem contar aquelas de musicais que são em bem maior número, assim como palestras e cursos. As ofertas são tantas que o Guia OFF adaptou-se aos novos tempos lançando edições mensais on line com a divulgação das lives em cartaz.
        O espectador tem também que tomar certos cuidados para usufruir da melhor maneira a live que se propõe a assistir, não dispersando sua atenção para não perder momentos importantes da apresentação. Quando a apresentação é pelo Zoom a atenção é maior ainda, desligando o áudio e o vídeo enquanto dura o espetáculo, evitando desviar a atenção de outro espectador quando vai atender o entregador de pizza enquanto o ator está se apresentando.
        Como avaliar todas essas novidades? Como comparar um teatro ao vivo com essa nova modalidade que podemos chamar de live, on line, teatro filmado, teatro digital, ou seja, sempre com um adjetivo após a palavra teatro, porque TEATRO, TEATRO é aquele que acontece ao vivo, apenas uma vez tanto para o ator como para o espectador.
        Eu não tenho dúvidas que essa nova modalidade vai permanecer mesmo depois que os teatros reabram e isso é extremamente bom, mas JAMAIS irá substituir a presença, fator fundamental para que aconteça o fenômeno mágico que se chama TEATRO.
        Por último, mas não menos importante: Por que usar a palavra live em inglês? Mais um anglicismo para o nosso dia a dia? Por que não “ao vivo”?

O TEATRO NOS UNE,
O TEATRO NOS FORTE!
VIVA O TEATRO! 

        14/07/2020

 

 

sábado, 4 de julho de 2020

A ARTE DE ENCARAR O MEDO




QUEM TEM MEDO DO SYMPLA E DO ZOOM?
 
        Quando comecei a frequentar teatro nos idos dos anos1960 era comum encontrar na bilheteria das salas de espetáculo uma tábua que reproduzia a plateia com buraquinhos redondos que representavam os lugares; nesses buraquinhos eram introduzidos os ingressos enrolados. O espectador escolhia os lugares, a bilheteira retirava os ingressos escolhidos, desenrolava e entregava ao cliente mediante o pagamento em dinheiro. Como as coisas evoluíram! Quase 60 anos depois isso foi substituído pelo Sympla. Ai, que medo!
        Toda vez que tenho conhecimento de algum espetáculo que será transmitido via internet o primeiro medo é: como vou adquirir o ingresso, seguido do segundo que é maior ainda: vou conseguir acessar o espetáculo?
        Tive a sorte de ser acompanhado nessa trajetória tecnológica por “bilheteiros” exemplares. A primeira experiência foi há um mês com o Bruno Kott e a Nicole Cordery e a segunda nesta semana com o Rodolfo García Vázquez. Dias antes, com a maior paciência e carinho do mundo, Rodolfo me introduziu no mundo dos Symplas e dos Zooms, explicando passo a passo como eu ia adquirir o ingresso, como entraria na sala do zoom onde ia ser apresentada a peça e que botõezinhos eu deveria apertar para assisti-la corretamente.
        Sexta feira, dia 03 de julho, 20h45! Chegou a grande hora. Com medo me coloco na frente do notebook para enfrentar a fera. Entro no Sympla e depois no Zoom. Primeira etapa vencida com sucesso. Paciente e carinhosamente Mariana França e Henrique Mello repetem as instruções. E aí começa o novo trabalho dos Satyros: A ARTE DE ENCARAR O MEDO.
 

        Espetáculo corajoso e pesado, como são pesados os tempos que estamos vivendo. A pandemia do corona vírus e os desmandos do insano governo a que estamos submetidos envolvem todo o espetáculo. Os dezoito atores (incluindo os atores mirins) fazem seus depoimentos sobre um isolamento que dura mais de 15 anos, mais precisamente 5.555 dias, falando sobre seus medos, suas revoltas e por que não, sobre suas remotas esperanças. As cenas se sucedem muito bem sincronizadas utilizando recursos tecnológicos que o grupo domina perfeitamente. As experiências anteriores dos Satyros, incluindo as cinematográficas, contribuíram bastante para resultado tão harmônico.
        Todo o elenco está perfeito e imbuído do mesmo propósito com interpretações memoráveis onde não posso deixar de destacar aquelas de Julia Bobrow, de Marcia Dailyn, de Ivam Cabral, de Fabio Penna e de César Siqueira, aparentemente um estranho no ninho que se aclimatou perfeitamente ao espírito dos Satyros.
        Destaque também para a belíssima e envolvente trilha sonora criada por Marcelo Nassi.
        Ao final do espetáculo se pode participar de um bate papo simpático e informal, onde cada espectador tem a oportunidade de colocar seus pontos de vista e de fazer perguntas, que são prontamente respondidas pelo elenco sob a liderança do Ivam Cabral.
        Tudo acontece de maneira tão espontânea e informal que terminamos a noite com a sensação de que estivemos realmente juntos e...ao vivo!

        Obrigado Rodolfo. Obrigado Ivam. Obrigado Satyros por tão belo acolhimento e por espetáculo tão oportuno e bem realizado.

VIVA O TEATRO DIGITAL! 

         04/07/2020