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sexta-feira, 21 de julho de 2023

ESCOMBROS

 

Foto de Ronaldo Gutierrez

Atividades diversas (avaliações PROAC, Festival de Teatro de Cubatão, Premiação APCA) e uma pequena cirurgia me afastaram por uns 20 dias dos palcos paulistanos criando algumas lacunas no meu currículo de espectador apaixonado em função de temporadas relâmpagos ocorridas nesse período.

Por pouco não perco este que, com certeza, é um dos melhores espetáculos do ano, e que teve temporada de apenas três semanas no Espaço Cênico do SESC Pompeia. Fui um dos privilegiados entre os pouco mais de 500 espectadores que conseguiram os disputadíssimos 48 lugares do local. Assisti em sua penúltima apresentação.

Escombros se passa nos cômodos pobres, sujos e provavelmente mal cheirosos (excelente arquitetura cênica de Eric Lenate) onde convivem muito mal dois irmãos perturbados emocionalmente, frutos de família disfuncional e vítimas de assédio e violência moral e física. Para justificar os seus traumas inventam ou imaginam histórias sobre a morte do pai e da mãe. São eles Michael e Michelle, interpretados visceralmente por Iuri Saraiva e Isabella Lemos sob a direção precisa de Clara Carvalho.

O texto do dramaturgo britânico Dennis Kelly (1970-) é uma faca enfiada nas emoções do espectador. Os solos narrados pelas duas personagens são violentos, escatológicos e paradoxalmente muito poéticos e às vezes até engraçados, assim como as cenas em que interagem sempre de forma agressiva e violenta.

Trata-se daquelas encenações onde tudo funciona. O cenário já citado de Lenate é iluminado por Nicolas Curatori; André Grynwask e Pri Argoud são responsáveis pela direção de vídeo com as imagens projetadas na televisão presente no ambiente e a poderosa trilha sonora é composta por Ricardo Severo. Destaque especial para os figurinos de Marichilene Artisevkis e a maquiagem também assinada por ela, que consegue o milagre de deixar a bela Isabella Lemos muito feia e até meio asquerosa.

As interpretações de Isabella e Iuri atingem pico de excelência e o solo inicial de Iuri narrando o suicídio do pai por crucificação já pode ser considerado como um dos momentos antológicos do nosso teatro.

Clara Carvalho mais uma vez demonstra seu completo domínio do fazer teatral dirigindo o espetáculo com mão ao mesmo tempo firme e delicada, aliás sua marca registrada tanto como diretora ou atriz.

Urge que espetáculo do calibre de Escombros tenha novas temporadas!!

21/07/2023

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