Páginas

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

MIRADA 4 – ÚLTIMOS DIAS

     Assisti a mais oito espetáculos nesta última semana do festival:
     Amarillo do México   Espetáculo que usa vários recursos áudio- visuais para narrar as desventuras e as violências sofridas por aqueles mexicanos que tentam imigrar ilegalmente para os Estados Unidos. O Amarillo do título é um povoado no Texas na fronteira entre os dois países. Visualmente requintado, mas desprovido de um roteiro consistente.
Amarillo - Foto de Wesley Souza

     Pais e Filhos da Mundana Companhia de Teatro (Brasil) – Foi apresentado um ensaio do espetáculo que ainda não está pronto no palco do Teatro Coliseu. Com simpáticas intervenções do diretor russo Adolf Shapiro o grupo apresentou cenas da peça. O elenco ainda não está à vontade, mas as interpretações de Lúcia Romano, Donizeti Mazonas e Luah Guimarães já se fazem notar. Ao final, Luah Guimarães  fez uma explanação sobre o processo de criação do espetáculo. Aguardemos a estreia em São Paulo no final do mês de setembro.
     O Autor Intelectual da Colômbia – Da mesma companhia que apresentou Os Autores Materiais este ótimo espetáculo faz do espectador um voyeur através de uma janela onde ele observa as discussões de uma família em torno do destino que vão dar à Dona Bertha, mãe dos dois personagens masculinos. Na linha de Parente É Serpente e Deus da Carnificina a peça apresenta o que está por baixo das relações sociais bem comportadas quando surgem conflitos nas mesmas. Impactante e tratando de assuntos que afetam qualquer um o espetáculo foi ovacionado ao final.
O Autor Intelectual - Foto de Juan Pablo Urrego

     Os Assassinos do México – A peça tem uma narrativa caótica e histérica. Num cenário desolador com uma árvore “beckettiana”, seres marginalizados se degladiam e se destroem: drogas, sonho com imigrar para os Estados Unidos (temática muito presente na dramaturgia mexicana) e muita violência são os principais temas tratados. Há a inclusão de números musicais que nada acrescentam à narrativa. Longo e cansativo.
     + 75 da Espanha. Simpático espetáculo de rua mostrando as dificuldades de cinco velhos (uma das mulheres é paraplégica e anda numa cadeira de rodas) de interagir com a cidade grande. Com o uso de pernas de pau os atores criam o efeito da fragilidade no andar dos velhos. Sem seguir uma narrativa pré-elaborada o espetáculo vai acontecendo ao sabor das interações com o público. Nesta apresentação um espectador, uma cadela e até o vice-prefeito da cidade de Santos tiveram participações especiais.
+75 - Foto de Ivan Ensenyat

     Hamlet dos Andes da Bolívia – Mais uma desconstrução bem sucedida do clássico de Shakespeare. Apenas três atores dão conta de todas da personagem da peça. A encenação mistura a trama shakespeariana com a realidade da Bolívia e do grupo (a morte do pai relaciona-se com a saída de Cesar Brie que dirigiu o grupo por mais de 20 anos). Há trechos falados em quechua. Intenso e corajoso. A atriz Alice Guimarães é brasileira e faz parte do grupo desde a sua fundação há 21 anos.
     Cinzas do Paraguai – Espetáculo ritual com clara inspiração em Grotowski e nos espetáculos do grupo catalão Fura Del Baus. Visualmente excitante o espetáculo mostra as desgraças de uma guerra segundo a vivência de uma mulher (vivida pelas três atrizes). Excelente música ao vivo e muitas cenas coreografadas (coreografia violenta com movimentos bruscos). Destaque para uma das atrizes que tem uma cena fortíssima narrando a morte do pai. Um ato de coragem num momento em que o Paraguai vive uma delicada situação política.
Cinzas - Foto de Alexandra dos Santos

     O Nacional da Espanha – Há exatos 36 anos no Festival de Teatro produzido por Ruth Escobar em São Paulo, assisti a um dos espetáculos mais significativos de minha vida (Alias Serralonga) com este grupo catalão (Els Jograls) dirigido pelo mesmo diretor (Albert Boadella); foi então com muita curiosidade e expectativa que me dirigi ao Teatro Coliseu para assistir a esta produção original de 1993 e agora remontada para comemorar os 50 anos do grupo. Com muita alegria constato que o grupo mantém a virulência, o espírito crítico e certa anarquia presentes no espetáculo de 1976. Desta vez trata-se de criticar os descasos das políticas culturais da Espanha (alguma semelhança?), por meio da abnegação e do desvario do antigo diretor Don Jose que tenta manter um teatro de óperas em ruínas ensaiando a ópera Rigoletto com um grupo de marginalizados. Lá fora o progresso tenta invadir o teatro com suas máquinas para destruí-lo e construir provavelmente um shopping center. O espetáculo é levado num tom irônico e causa surpresa as excelentes qualidades vocal e instrumental dos atores. As situações dos ensaios da ópera, das trapalhadas dos integrantes e das invasões repetem-se várias vezes e o espetáculo tem vários falsos finais o que o torna longo e cansativo. Isso não desmerece a qualidade e a originalidade do mesmo.
O Nacional - Foto de Neil Becerra

     Deixei de assistir aos dois espetáculos do Chile que serão apresentados em São Paulo na próxima semana e àqueles do Peru e da Colômbia (última parte da trilogia) por falta de espaço na agenda. Considero muito positivo o saldo da Mirada que mostrou uma boa amostra do teatro ibero-americano atual. Ratifico aqui quais os espetáculos que mais me impressionaram: Incêndios do grupo Tapioca Inn do México; Ato Cultural do grupo Actoral 80 da Venezuela ; O Autor Intelectual e Os Autores Materiais do grupo La Maldita Vanidad da Colômbia; Podem Deixar o Que Quiserem do grupo Intimo Teatro Itinerante da Argentina; Hamlet dos Andes do grupo Teatro de los Andes da Bolívia e o instigante e surpreendente Cinzas do grupo Hara Teatro do Paraguai. Foram apresentados vários espetáculos nacionais de alto nível, sendo que não assisti à maioria por já tê-los assistido ou porque há uma maior possibilidade que eles sejam apresentados em São Paulo.
     Valeu Sesc! Valeu Santos! Valeu Mirada!

Nenhum comentário:

Postar um comentário