Desde seu título esta peça nos distancia de qualquer raciocínio
lógico. Abnegação? As cinco personagens não têm absolutamente nada de abnegadas
e nem o gesto suicida de uma delas pode ser assim chamado.
O texto instigante de Alexandre Dal Farra beira o absurdo ao
não esclarecer (propositalmente) o que está acontecendo com aquelas pessoas pertencentes a um
determinado grupo (partido político? empresa? alguma confraria?) que se digladiam
em torno de fatos que o público desconhece até o final do espetáculo. O já
citado suicídio do líder no final da primeira parte vai mover toda a ação da
segunda, onde os “sobreviventes” que se aproveitaram da situação remoem os seus
remorsos.
O uso de dois praticáveis (que remete à solução cenográfica
usada em Les Éphémères do grupo
francês Théâtre du Soleil) é bastante
interessante, com a ressalva que a troca de cenário no praticável à direita da
plateia desvia a atenção do público do
que está acontecendo em cena.
O grande trunfo do espetáculo é o elenco e nota-se que os
diretores (Dal Farra e Clayton Mariano) concentraram suas atenções nas interpretações
cheias de silêncios e gestos enigmáticos. Transitando por frases soltas e ações
inconsistentes (pelo menos para o público) eles atuam com energia e verdade passando
uma verossimilhança daquilo que é, senão inverossímil, pelo menos,
racionalmente incompreensível. Todos estão ótimos, mas é necessário destacar o
vigoroso trabalho de Vitor Vieira, que já havia nos brindado em 2012 com uma
grande interpretação em Mateus 10.
Vitor Vieira, André Capuano, Carlos Morelli, Alexandra Tavares, Vinícius Meloni
Este corajoso trabalho da companhia Tablado de Arruar com
toda sua estranheza, surpreende e faz refletir sobre a situação do Brasil atual.
“Surpreender” é sinônimo de bom teatro e “refletir” é sinônimo de um salutar
engajamento, prova que o Tablado de Arruar não está brincando em serviço.
O espetáculo tem 2h10 de duração e talvez merecesse alguns
cortes na primeira parte como também no número de charutos fumados por André
Capuano!
Abnegação está em
cartaz no Centro Cultural São Paulo até 30/03, às sextas e aos sábados às 20h30
e aos domingos às 19h30.
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