Fachada do Teatro do Núcleo Experimental
Em primeiro lugar quero falar sobre acolhimento. Em 2012
quando eu era integrante da Comissão de Prêmio da Cooperativa Paulista de
Teatro propus que se estabelecesse uma nova categoria de prêmio para
“acolhimento do público”. Minha proposta não teve repercussão entre meus
colegas talvez por falta de argumentos da minha parte (na época dei como
exemplo de bom acolhimento os casos do Théâtre
du Soleil e dos Fofos Encenam).
Volto a pensar nesse assunto após a visita ao Teatro do Núcleo Experimental na
noite de ontem (07/02/2014). O local aconchegante, as jovens Patricia, Claudia
e Priscilla (me desculpem se esqueci o
nome de alguém) todas simpaticíssimas nos recebendo com sorrisos e abraços espontâneos e o bar que serve aquela deliciosa
cerveja artesanal que, infelizmente, estava em falta nessa noite! Essa recepção
predispõe o espectador a “saborear” o espetáculo que será apresentado (isso não
significa que ele irá obrigatoriamente gostar só porque foi bem recebido).
Acolhimento nota dez, agora vamos ao espetáculo: Ou Você Poderia Me Beijar, texto do
dramaturgo inglês Neil Bartlett em conjunto com a Handspring Puppet Company. Concebida para atores e bonecos, na
encenação brasileira de Zé Henrique de Paula o diretor optou por fazer o
espetáculo só com atores. As personagens A e B são vividas por seis atores
diferentes em três momentos de suas vidas (juventude, maturidade e velhice) e
várias personagens femininas assim como a narradora da história são vividas por
uma única atriz. A tradução do texto é de Thiago Ledier.
Zé Henrique de Paula, o diretor
Montagem ousada na forma para uma história de conteúdo profundo,
mas bastante simples: um casal de gays na faixa dos 80 anos tem sua rotina
alterada quando um deles tem uma doença terminal. Questões como herança, intolerância
com o homossexualismo e principalmente o grande amor que une o casal são alguns
dos temas tratados. O interessante é que três tempos diferentes aparecem simultaneamente
em cena fazendo aqueles de certa idade testemunhas deles mesmos em outro
momento da vida. Esse jogo com o tempo é
instigante e Zé Henrique de Paula o resolve de maneira brilhante, para tanto se
serve de uma cenografia simples e eficiente de sua autoria e de um ótimo elenco:
Clara Carvalho fica com a parte mais ingrata interpretando várias personagens e
também a narradora (em certo momento ela chega a expor didaticamente os
mecanismos da memória e o faz com maestria). Os jovens A e B são interpretados
por Thiago Carreira e Felipe Ramos; os velhos por Cláudio Curi e Roney Facchini
e os de meia idade por Marco Antônio Pâmio e Rodrigo Caetano; todos eles estão
muito bem, mas é necessário destacar a presença de Pâmio que, mesmo sem muitas
falas, ilumina a cena com gestos e olhares, desviando o olhar do espectador
para si.
Os jovens A e B
A, B e a Mulher
Os velhos A e B
What Are You Doing the
Rest of Your Life, a bela canção de Michel Legrand, tem letra de Marilyn e
Alan Bergman que se encaixa perfeitamente na história contada e permeia toda a
encenação (conforme informado pelo grupo, a canção já vem indicada no texto
original). Os belos momentos cantados (sem ninguém desafinar- coisa rara na
maioria dos espetáculos-) devem-se à preparação vocal realizada com a habitual
competência de Fernanda Maia. Na parte cantada o destaque fica com Claudio
Curi.
Por último, mas tão importante quanto, o programa da peça (designer
gráfico: Herbert Bianchi) é excelente. Contém ficha técnica detalhada e todos
os dados necessários para a preparação do que vai se assistir inclusive um mapa
com datas importantes das vidas de nossos protagonistas A e B.
Espetáculo delicado e emocionante para o qual você deve
dedicar algumas horas do resto de sua vida.
Em cartaz no Teatro do Núcleo Experimental até 27 de abril
às sextas e sábados às 21h e aos domingos às 19h.
Muito bem resolvida a questão de "passear pelo tempo", Pâmio se supera a cada espetáculo e a cerveja... vamos reservar antes da próxima vez.
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