Respira-se teatro em Curitiba: pela manhã as coletivas de
imprensa, no almoço comenta-se sobre espetáculos vistos, a tarde vai-se atrás
de espetáculos no Fringe, jantar falando de teatro antes ou depois de assistir
a um espetáculo da Mostra Oficial e para fechar a noite uma cervejinha onde o
assunto é... TEATRO! Para um espectador
apaixonado não há melhor maneira de ocupar o tempo. Minha jornada no Festival
de Curitiba termina hoje (28 de março). Foram quatro dias de intensa atividade
e de muita alegria pela maneira amigável e profissional como o Festival nos
recebe.
Em três dias, foram 14 coletivas bastante interessantes e
esclarecedoras sobre os espetáculos realizados pelos entrevistados.
O grupo carioca Teatro
Inominável representado pelos jovens dramaturgos Diogo Liberano e Keli Freitas
comentou a gênese do espetáculo Concreto
Armado que tem como pano de fundo o Rio de Janeiro às vésperas da Copa do
Mundo. Segundo eles o grupo evoluiu da ideia de incluir no roteiro a destruição
do Maracanã para algo mais intimista e pessoal.
O dramaturgo Romeno Matéi Visniec está presente em dois
espetáculos da Mostra Oficial: Espelho
Para Cegos vindo da Bahia, que segundo o diretor Marcio Meirelles é a
reunião de 18 pequenas peças contidas no livro Teatro Decomposto e 2 X Matei
espetáculo carioca com Guida Vianna e Gilberto Gawronski. Em ambos os casos os
entrevistados creditam essa febre de montagens de textos de Visniec (esta
semana estreia em São Paulo A História do
Comunismo Contada aos Doentes Mentais)
ao lançamento de 18 livros de textos teatrais do dramaturgo pela Editora É e,
obviamente, à qualidade e à contemporaneidade dos mesmos. Segundo Gawronski as
peças de Visniec lembram o universo de Samuel Beckett com forte influência de seu
compatriota Eugene Ionesco, ambos representantes do que se chamou Teatro do
Absurdo.
Guida Vianna e Gilberto Gawronski
O ator chileno Claudio Lopes da companhia chilena La Gran Reyneta comentou sobre as dificuldades técnicas do espetáculo de abertura do Festival El Hombre Venido de Ninguna Parte e também de sua adaptação para espaço fechado, uma vez que foi concebido para a rua.
Claudio Lopes
Várias mostras especiais estão contidas no Fringe: Sergio
Ferrara, Aldo Valentim e Imara Reis comentaram a Mostra Ademar Guerra e falaram sobre o Projeto de mesmo nome promovido
pelo Governo do Estado de São Paulo que difunde o teatro no interior de São Paulo
com cursos de formação em diversas áreas; em relação à Mostra de Teatro Capixaba os seus representantes comentaram sobre
os espetáculos (todos eles produzidos por grupos de pesquisa continuada) e
também sobre as dificuldades de se fazer teatro naquele estado; finalmente
sobre a Mostra Baiana a entusiasmada
Maria Marighella comentou que o principal objetivo da mesma é tornar visível o
bom teatro que se faz na Bahia.
Sergio Ferrara, Aldo Valentim, Imara Reis
Dois Shakespeares adaptados para poucas personagens fizeram
parte de duas entrevistas: os chilenos da Compañia
Viajeinmóvil reduziram Otelo ao quarteto principal da trama (Otelo,
Desdemona, Iago e Emília) parte deles interpretados pelos atores (Iago e
Emília) e a outra por bonecos manipulados pelos mesmos atores (Otelo e
Desdemona); segundo o ator Jaime Lorca a companhia ensaia no momento Ricardo III para crianças, enfatizando
um eventual bullying sofrido por
Ricardo na infância que justificaria em parte a crueldade do mesmo. O grupo
carioca representado pelo ator Gustavo Gasparani e o diretor Sergio Módena foi
mais radical e apresenta Ricardo III
com um único ator fazendo 22 personagens.
Teresita Iacobelli, Jaime Lorca (Otelo)
Gustavo Gasparani, Sergio Modena (Ricardo III)
Boa parte do elenco da premiada Cais ou Da Indiferença das Embarcações compareceu à entrevista
sobre o espetáculo. O veterano ator Walter Portela que faz o barco narrador fez
um breve discurso sobre a importância de trabalhos humanistas como o de Kiko
Marques (autor, diretor e ator da peça) e sobre a importância do teatro; disse
ele que “um povo que não cultiva o teatro, já morreu ou está moribundo”. Os
presentes emocionados aplaudiram a sua fala. A seguir Kiko Marques falou sobre
o processo de escrita da peça que conta 60 anos da vida da Ilha Grande no Rio
de Janeiro.
Parte do elenco de Cais
Walter Portela, Kiko Marques
A solar curitibana Ana Rosa Tezza fez uma apresentação entusiasmada
e entusiasmante sobre seu trabalho com o coletivo Ave Lola do qual serão apresentadas duas peças no Fringe (Os Malefícios da Mariposa e Tchekhov). Ana trabalhou na companhia
chilena Sombrero Verde sob a direção
de Andres Pérez Araya que passou 15 anos no Théâtre
du Soleil e no ano passado o Ave Lola trouxe quatro componentes do
grupo de Ariane Mnouchkine para uma residência de quatro meses junto a ele. O espetáculo Tchekhov é, em parte, resultado dessa troca de experiências e tem
trilha sonora composta por Jean-Jacques Lemêtre, compositor oficial das trilhas
sonoras dos espetáculos do Soleil.
Ana Rosa Tezza
O texto italiano Tumba
de Cães foi apresentado por sua autora Letizia Russo, pelo diretor
curitibano Marino Jr. e pelo elenco da peça que faz sua estreia no Festival.A
peça tem a participação da ator Ranieri Gonzales da Companhia Brasileira de Teatro
e fala de relações familiares que tem como pano de fundo uma guerra motivada
por falta de água.
Marino Jr., Letizia Russo
As mineiras Débora Falabella e Yara de Novaes apresentarão
no Festival a peça Contrações do autor
inglês Mike Bartlett. Comentaram sobre a qualidade do texto e a encenação de
Grace Passô que coloca os técnicos de som e luz no palco e inclui até “solos”
de bateria por Débora Falabella.
Débora Falabella, Yara de Novaes
Sergio Módena voltou à cadeira dos entrevistados para falar
da peça italiana dirigida por ele A Arte
da Comédia de Eduardo de Filippo
proveniente do Rio de Janeiro e de uma bem sucedida temporada em São Paulo. A
peça trata das dificuldades em se fazer o bom teatro devido a questões
burocráticas e econômicas e revela-se um verdadeiro hino de amor ao teatro.
Todas as fotos desta matéria foram tiradas por mim.
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