No ano de 1985 eu não fui ao Rio de Janeiro! No entanto
tenho, não só o programa da peça Assim É
Se Lhe Parece como o canhoto do ingresso no Teatro dos 4, datado de 09 de
novembro de 1985; mais ainda: folheando o programa chego a rememorar cenas da
peça com a inesquecível Yara Amaral como a Senhora Amália Agazzi e com Nathalia
Timberg ( Senhora Frola), sem falar no José Wilker (Senhor Ponza) e no Sergio
Brito (Laudisi). E eu não fui ao Rio de Janeiro em 1985! Com certeza também não
assisti à lendária montagem do TBC dirigida por Adolfo Celi em 1953, pois eu
tinha apenas nove anos, mas não me é difícil visualizar Cleyde Yaconis como a
Senhora Frola. Tenho mais recordações dessas montagens do que daquela a que
realmente assisti em 1972 em São Paulo dirigida por Flavio Rangel tendo Paulo
Autran, Madalena Nicol e Helio Ary nos papéis principais. Aqui também a Senhora
Agazzi teve o privilégio de ser interpretada pela não menos inesquecível Myrian
Muniz. Quais os mecanismos da memória ? Algo muito sonhado ou idealizado acaba
tornando-se realidade? Mas o que é realidade? O que é verdade? Por mais
incrível que possa parecer é assim e não me peça explicações lógicas porque
se assim me parece, assim é!
1953 - TBC - Paulo Autran e Cleyde Yaconis
1972 - Madalena Nicol e Paulo Autran
1985 - Rio de Janeiro (com o canhoto do ingresso no canto inferior esquerdo)
Todo esse pensamento me veio à luz depois de assistir
ontem à noite, à nova montagem desse intrigante texto escrito há quase um
século (1917) por Luigi Pirandello e que como bom clássico continua muito
atual. A abordagem de Marco Antônio Pâmio é bastante interessante e dá destaque
especial para a personagem de Laudisi que é defendida bravamente por Rubens
Caribé. Laudisi é o porta voz do autor e é através dele que temos a ponderação
do que se fala nos dois núcleos da peça: de um lado os vizinhos bisbilhoteiros
querendo saber mais da vida dos outros do que de suas próprias e do outro o
mistério dos novos vizinhos: a Senhora Frola , o seu genro Senhor Ponza e sua
esposa.
The Gossips
Pâmio articulou uma dinâmica movimentação dos 12 atores
em cena, abrindo o espetáculo com uma bonita representação da fofoca que remete
ao famoso quadro The Gossips de
Norman Rockwell. Auxiliado por uma inspirada iluminação de Caetano Vilela (que
pontua as ações com cores diversas), pelo despojado cenário de Fabio Namatame
(cujas cortinas vão sendo desvendadas na mesma medida que o mistério sobre os
novos vizinhos) e por uma adequada trilha sonora escolhida pelo próprio
encenador, Pâmio realiza um espetáculo dinâmico, engraçado na medida certa e
fazendo refletir sobre os perigos das verdades absolutas.
Talvez pela tradição do “papel de galã”, aquele do Senhor
Ponza sempre foi o escolhido pelos atores mais famosos do momento (Paulo Autran
por duas vezes e José Wilker), no entanto a personagem que oferece as melhores
oportunidades para um ator é Laudisi e como já citei Rubens Caribé aproveitou e
cria um dos melhores trabalhos de sua carreira. Bete Dorgan depois de fazer uma
série de personagens histriônicas nos brinda com uma humana Senhora Frola e a
sua entrada em cena na primeira visita aos Agazzi é algo para se guardar na
memória. O restante do elenco cumpre o seu papel sendo justo destacar a energia
de Joca Andreazza como o Senhor Agazzi. Na estreia o ator Nicolas Trevijano
pareceu ter problemas com a voz nas cenas em que necessita da mesma num tom
mais elevado.
Depois de duas horas de espetáculo os vizinhos e nós
público estamos ansiosos para saber quem é louco, o Senhor Ponza ou a Senhora
Frola. Uma mulher encoberta com um véu preto é chamada para nos revelar a verdade.
Mas onde está verdade?
Além de excelente ator, Pâmio nos apresenta aqui um
refinado trabalho de direção numa montagem que merece ser vista.
Assim É (Se Lhe
Parece) está em cartaz no teatro do Sesc Vila Mariana de 11/04/2014 a 18/05/2014.
Sexta s e sábados às 21h e domingos às 18h.
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