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segunda-feira, 25 de agosto de 2014

O GRANDE CIRCO MÍSTICO


 

     Ao que parece certo Circo Knie existiu na Áustria no século 19. Jorge de Lima (1893-1953) inspirou-se nesse fato para escrever o poema O Grande Circo Místico em 1938 criando uma verdadeira arvore genealógica para contar a saga dos integrantes do Circo Knieps, “de que tanto se tem ocupado a imprensa”. Em 1983, baseados no poema, mas subvertendo funções, parentescos e nomes das personagens (como exemplo, a heroína chama-se Agnes e não Beatriz), os talentos de Naum Alves de Souza, Chico Buarque e Edu Lobo criaram o espetáculo para o Ballet Guaira que era um primor como balé, mas que se tornou clássico como álbum musical, contendo as obras primas que todos conhecem e amam. No ano de 2002 o Ballet Guaira remontou o espetáculo com uma nova coreografia sem a repercussão da primeira temporada.
 
Propaganda da temporada em São Paulo em 1983
 
     Com esse passado em mãos, Newton Moreno e Alessandro Toller foram incumbidos da difícil tarefa de criar uma trama para a realização de espetáculo musical que contivesse as imortais canções de Chico e Edu. Misturando elementos do poema original, do roteiro para o balé de Naum e das letras das músicas, criaram uma nova trama que emoldura com perfeição as canções. A impressão que dá é que as canções foram feitas para essa trama e esse é o maior elogio que se pode fazer a Moreno e Toller.
     Contrariando os rotulados “musicais da Broadway” tão em voga em nossos palcos, caríssimos, cheios de penduricalhos e com conteúdo, na maioria das vezes, muito pobre; O Grande Circo Místico é uma montagem de produção relativamente simples, mas com resultado sofisticadíssimo. Incorpora linguagem circense (malabarismo, contorcionismo, acrobacia) a uma coreografia muito bonita e os cenários e figurinos dão o retoque exato para a beleza do espetáculo.
     A direção de João Fonseca é enxuta e valoriza as canções e as interpretações dos atores/cantores todos eles excelentes. Há que se destacar a voz e a delicada atuação de Gabriel Stauffer como Frederico (prova disso é sua interpretação de Beatriz que não decepciona, apesar da inevitável comparação com a mais que perfeita e sublime de Milton Nascimento); a bela voz de Ana Baiard como Margarete, a mulher barbada; o tour de force de Fernando Eiras e as hilariantes intervenções do palhaço Felipe Habib junto ao público. Cabe notar que os todos os solos (musicais e coreográficos) dos demais integrantes do elenco são dignos e bem realizados.
 
 
     Diante da atual banalização dos musicais, O Grande Circo Místico surge como pérola rara a ser usufruida por crianças dos oito aos oitenta anos. Nas três horas de duração parece que somos conduzidos pelas mãos das gêmeas Marie e Helene e junto com elas levitamos de emoção e encantamento.
 
 
     Em cartaz no novo e confortável Theatro Net São Paulo (muito semelhante ao seu homônimo carioca) até 28 de setembro, quintas e sextas às 21h, sábados às 21h30 e domingos às 20h.
 
     Crédito das fotos : Rose Nagib

domingo, 24 de agosto de 2014

CONDOMÍNIO NOVA ERA



 
Divulgação

     Por gentileza de Victor Nóvoa, autor da peça, tive a oportunidade de ler o texto de Condomínio Nova Era dois dias antes de assistir à encenação de Rogério Tarifa em cartaz no Espaço Beta do Sesc Consolação. A prosa de Nóvoa literalmente tira poesia de escombros, seu linguajar é duro, às vezes cruel, mas não perde a ternura nem a compaixão pelas suas criaturas, compaixão esta que se materializa em Maria, a personagem melhor estruturada da trama. Sente-se falta da mesma consistência nas demais personagens que parecem não ter passado e só existir a partir da eminência da invasão: o prédio Nova Era habitado por 40 famílias e situado no centro de São Paulo está prestes a ser invadido pela truculência dos homens de fora e por meio de seis moradores acompanhamos o drama da desapropriação e do não ter para onde ir:  Seu João (o síndico), Dona Cleide (sua companheira), Raul, Jucilene, Marcos Mari e a sofrida Maria. Em tempos de reintegração de posse e da violência com que a polícia realiza esses atos esta peça é mais do que oportuna.
 
     A encenação de Rogério Tarifa rearranja o texto de Nóvoa eliminando algumas partes (toda a sequencia da ocultação do cadáver do enfermeiro que Raul matou e a partida de Dona Cleide), acrescentando outras (os relatos em torno do corpo de Maria, a entrevista do pivete na TV) e sabiamente colocando a personagem de Maria em primeiro plano, abrindo o espetáculo com o monólogo que originalmente está no meio da peça, fazendo-a testemunha de todas as cenas que ocorrem nos quartos dos outros elementos e encerrando a peça com o belíssimo texto final. Com seu comovente desempenho, a atriz Jussara Bracco faz jus à personagem que lhe coube. Os outros atores desempenham seus papéis a contento, porém, ressentem-se de certa falta de humanidade de seus personagens; quem melhor dribla este fato é Eduardo Mossri que interpreta Marcos Mari.
 
Foto de Lenise Pinheiro
 
     Como encenador, Rogério Tarifa caracteriza-se como aquele que explode/expande/explora o espaço cênico. Aqui ele consegue a proeza de transformar o exíguo (mesmo com a retirada da Sala de Leituras) Espaço Beta do Sesc Consolação em cinco ambientes onde ocorrem as ações da peça. Alguns desses ambientes remetem às instalações, tão ao gosto do encenador. Tarifa faz uso de uma bonita trilha sonora executada ao vivo pelo músico Zimbher, de vídeos  e de muitos objetos cênicos como TVs, bolinhas, terra, vinho. A dramática cena final mostra um embate digno de nota entre Jucilene (Helena Cardoso) e o homem de fora (Flavio Barollo) que se revela tão vulnerável quanto os despejados do Nova Era.
 
     Condomínio Nova Era é espetáculo obrigatório para aqueles que buscam no teatro reflexões sobre problemas contemporâneos como os despejos em função da especulação imobiliária, fato do qual, também o teatro tem sido vítima.
     Em cartaz no Sesc Consolação somente até o dia 04 de setembro, de segunda a quinta feira às 20horas.
 

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

MIRADA


 
        MIRADA é o Festival Ibero-Americano de Artes Cênicas de Santos promovido bienalmente pelo Sesc na cidade santista. Esta é a terceira edição do evento e, a julgar pelas anteriores, deve constituir-se em um festival que prima pela organização e pela qualidade dos espetáculos apresentados.

        MIRADA 2014 apresenta 40 títulos (25 internacionais e 15 nacionais), sendo que o país homenageado é o Chile que traz sete espetáculos.Os outros países com os respectivos números de espetáculos são: Espanha (4);  Argentina (3); Colômbia , México e Portugal (2) e Bolívia, Costa Rica, Cuba, Paraguai e Peru ( 1). As apresentações ocorrem em vários locais da cidade (entre outros o Sesc, o Teatro Coliseu, o Teatro Guarany e as ruas), assim como, em algumas das cidades vizinhas. Além disso, o evento dá espaço para atividades formativas, exposições, encontros e debates. Como foi dito na abertura do evento de lançamento do MIRADA, nesses dez dias Santos vai respirar TEATRO.
 
Evento de lançamento do MIRADA no Teatro do Sesc santos no dia 14 de agosto de 2014
 

        O lema do Festival é OLHARES DE TODOS NÓS que segundo o Sesc  “O nosso olhar e do estrangeiro são convertidos a um único objeto: o presente!”. Presente que pode ser representado das mais variadas formas: poética, realista, política ou até surrealista.

        MIRADA acontece de 04 a 13 de setembro na cidade de Santos e os ingressos já estão à venda na rede Sesc. Mais informações em sescsp.org.br/mirada

O mar que separa é o mesmo que une os continentes.
 

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Teatro SOLO


      O acontecimento teatral pode prescindir de um palco, de iluminação, de cenários, de trilha sonora, mas sem a tríade ator, espectador e uma história ele não se concretiza; eis a essência do teatro e é com essa proposta que o encenador argentino Matías Umpierrez desenvolveu o projeto Teatro SOLO. Por meio de convite da Oficina Cultural Oswald de Andrade o projeto aportou em São Paulo no último dia 14 e permanece por aqui até o dia 24 de setembro. Trata-se de cinco cenas apresentadas para um único espectador em diferentes locais da cidade. Tive a oportunidade de testemunhar (a experiência é muito mais forte do que simplesmente assistir) três delas.
 
     RETRATO acontece nas dependências da Pinacoteca onde uma funcionária discorre sobre sua vida e a história de uma visitante do museu. A dramaturgia da cena é frágil e a não adequação da atriz à personagem revela mais um texto decorado do que interpretado.
 
     PROMESSA apresentado numa oficina de costura do Bom Retiro. O impacto provocado pela cena já começa no primeiro contato com a paraguaia Amália que trabalha na confecção dirigida por Erica, descendente de coreanos. Revelar mais seria tirar a surpresa de quem vai assistir a este trabalho pungente e doloroso. As duas atrizes são excelentes e a dramaturgia perfeita exigindo inclusive uma tomada de posição do espectador. A emoção foi tamanha que desci as escadas da oficina com certa dificuldade.
 
Erica na oficina de costura (Divulgação)
 
     ÊXODUS realizado num apartamento de família nos Campos Elíseos foi outra experiência dolorosa. Laura me recebeu com os olhos marejados de lágrimas e me contou as perdas sofridas pela sua família. Mortes e abandonos fizeram com que restassem apenas ela e sua mãe que está com ideias suicidas. Laura me convida para ir até o quarto conversar com sua mãe Sonia que está prostrada na cama. O resto é melhor não ser relatado pelo mesmo motivo exposto na cena anterior. Mais uma vez a emoção tomou conta de mim e saí dessa experiência ao mesmo tempo fragilizado pela dor humana e fortalecido para enfrentar o mundo que me aguardava lá fora. Nota dez para as atrizes  e para a dramaturgia.
 
Laura e Sonia (Divulgação)
 
     Teatro SOLO permite uma experiência única e intransferível tanto para o espectador como para os atores, pois daquela maneira aquela cena nunca mais se repetirá. Aqui a efemeridade do ato teatral revela-se em seu estado puro.
     Além dessas, acontecem mais duas cenas: AMNÉSIA no Teatro Sérgio Cardoso e PACTO em um escritório no Bom Retiro.
     Informações sobre reservas na Oficina Cultural Oswald de Andrade. NÃO PERCA!
 
 

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

TEMPOS DE DELICADEZA NO ESPAÇO SOBREVENTO


Sala de Estar
 
     O aconchegante Espaço Sobrevento fica a algumas quadras do mastodôntico Templo do Cifrão, perdão, do Salomão do bispo Edir Macedo. Poucos quarteirões e muitas diferenças os separam.
     No último sábado tive o privilégio de ir ao espaço Sobrevento por duas vezes. À tarde levei minha netinha Laura de oito meses para o seu début teatral no Teatro para Bebês realizado pelo grupo. A beleza já se inicia na sala de espera olhando todos aqueles bebês rindo, chorando e se comunicando entre eles. As mamães, os papais e, é claro, os vovôs,  todos maravilhados aguardando ansiosos tanto o espetáculo como a reação dos seus pequeninos.
 
Público do Teatro Para Bebês
 
     Bailarina é um solo delicadíssimo de Sandra Vargas onde a atriz utilizando-se de poucos objetos, de sons de uma caixinha de música e de alguns efeitos de luz entretém os bebês por cerca de 30 minutos. Com muita delicadeza Sandra Vargas conta uma história de superação onde se mostra que a queda também é necessária na vida. 
 
Laura curtindo a caixinha de música
 
     Ao final a atriz aproxima as crianças da caixinha de música colocando-as em contato com a pequena bailarina que rodopia ao som da singela música. Não tenho dúvidas que alguma coisa aconteceu naqueles pequenos corações presentes no espetáculo.
 
     À noite voltei ao Sobrevento para assistir a outra delicadeza da companhia: Sala de Estar. Os espectadores são colocados no meio do espaço teatral e com banquinhos deslocam-se para cada sala de estar localizada nos cantos do espaço onde ouvirá o relato do seu habitante. São seis cenas nascidas a partir de “confissões” dos próprios atores. Utilizando-se largamente do Teatro de Objetos (um sofá, um gaveteiro e os guardados nas suas gavetas, cartas, bonecos são tão personagens quanto os atores em cena, além da figura do leão que perpassa todas as cenas nas mais variadas formas) e das cores (cada cena é quase monocromática no cenário e no figurino) a peça conta a histórias de uma senhora que odeia sofás, de uma mulher obcecada pela relação com os pais, de uma jovem e seu gaveteiro, das saudades que um jovem tem de seu pai, das cartas que uma mãe exilada envia às suas filhas e de um homem de preto defronte a um espelho. Todo o ambiente é bastante íntimo e o espectador sente-se parte daquelas histórias sobre a fragilidade humana contadas com muita delicadeza. Seria o leão um símbolo de como o homem é frágil perante a natureza? E o que representam as cores de cada cena? Tenho minhas respostas e cada um tem a sua. Assim é e assim será.
 
     Além de belos e de ser um alimento para a alma, os espetáculos do Sobrevento são gratuitos. Por outro lado, para fazer suas orações, você paga R$45,00 para entrar no Templo do Cifrão, perdão, do Salomão.  
 
    A ESCOLHA É SUA!
 
 

 
     - O Espaço Sobrevento fica na Rua Coronel Albino Bairão, 42 a duas quadras do metrô Bresser –Mooca.
     - O Teatro para Bebês ainda acontece nos sábados 23 (ás 11h e às 15h) e 30 (às 15h).
     - Sala de Estar fica em cartaz até 31 de agosto, sábados e domingos às 18 e às 20h.

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

FESTIVAL INTERNACIONAL DE TEATRO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO


 
        A partir da próxima quinta feira, dia 21 de agosto, a cidade de São José do Rio Preto será palco por dez dias do seu tradicional FIT (Festival Internacional de Teatro). Apostando na diversidade tanto na forma como no conteúdo e com o lema de “ampliar o olhar” a curadoria formada por Antonio do Valle, Cesar Augusto, Manoel Neves e Paula de Renor selecionou 44 espetáculos que devem representar o que de melhor se faz em teatro no Brasil e no mundo. O 45º título é o convidado Esta Criança com a Companhia Brasileira de Comédia de Curitiba e Renata Sorrah. Por questões logísticas o grupo Teatro Cinema do Chile não trará o esperado Historia de Amor.
 
Esta Criança
 
        O Festival começa com o espetáculo de rua peruano Sueños de Gigantes com bonecos enormes saindo do centro da cidade e se encaminhando para a Represa Municipal, tradicional palco de abertura do FIT, onde será apresentado Os Gigantes da Montanha com o Grupo Galpão de Belo Horizonte.
 
Os Gigantes da Montanha

        No dia seguinte tem início a maratona com a apresentação de cerca de dez espetáculos por dia nos mais variados pontos da cidade.
         Entre os espetáculos nacionais para público adulto (nove) vale destacar Sobre Anjos e Grilos, solo da gaúcha Deborah Finocchiaro sobre o universo do poeta Mario Quintana, uma versão clown de As Três Irmãs com a Traço Cia. de Teatro de Florianópolis e As Estrelas Cadentes do Meu Céu São Feitas de Bombas do Inimigo, peça da Cia. Provisório Definitivo de São Paulo baseada em relatos de crianças e jovens que sofreram a tragédia de uma guerra.
 
Sobre Anjos e Grilos

 
        No módulo “espetáculos para a infância e juventude” serão apresentados cinco títulos. Meu Pai é Um Homem Pássaro é uma deliciosa peça infantil apresentada pela Cia. Simples de São Paulo; chama a atenção pelo seu tema o espetáculo O Buraco no Muro trazido pela Maracujá Laboratório de Artes do Rio de Janeiro: um oportuno alerta ao uso indiscriminado de Internet, celulares e outros objetos eletrônicos pelas crianças.
        Radicalizando a diversidade o módulo “Olhar Diverso” apresenta três trabalhos: os sérios Joelma e BR-TRANS que tratam do universo das travestis e transexuais e o muito divertido Vampiras Lésbicas de Sodoma vindo do Rio de Janeiro.
 
Vampiras Lésbicas de Sodoma
 
        O destaque dos espetáculos de rua (oito) fica com a Trupe Sinha Zózima de São Paulo que apresenta dois de seus trabalhos (Cordel do Amor Sem Fim e Dentro É Lugar Longe) em um ônibus que percorre as ruas da cidade durante as apresentações.
        Serão apresentados oito espetáculos internacionais desde o irreverente Saxophoníssimo (França) que parece ser um misto dos grupos Les Luthiers e Monty Python, passando pelo polêmico e ousado La Idea Fija (Argentina) até o politicamente engajado El Rumor Del Incendio (México).
 
 
La Idea Fija
 
El Rumor del Incendio

        Por último, mas não menos importante, o módulo dedicado aos grupos da cidade de Rio Preto apresenta 11 trabalhos com espetáculos infantis, performances, teatro de rua e teatro tradicional. A diversidade de forma e de conteúdo também é representativa neste módulo que apresenta companhias jovens (a mais antiga tem 10 anos de existência) lutando por seu espaço no ambiente teatral não só de Rio Preto, mas de todo o Brasil. Destaques para uma versão de rua de O Tartufo e para uma nova montagem de Os Meninos e as Pedras, importante e sempre atual texto que trata da amizade entre uma criança judia e outra palestina.
 
Os Meninos e as Pedras
 

       

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

ERA UMA VEZ UM CAIS...


 
          
ERA UMA VEZ UM CAIS...

        Esta seria uma forma bonita de iniciar esta matéria, mas este CAIS não ERA, ele É e sempre SERÁ. Eu e você passaremos, mas CAIS permanecerá porque já nasceu clássico. Baseado nas vivências de vários verões passados na sua juventude em Ilha Grande e também em relatos obtidos dos moradores do local, Kiko Marques transformou vida em arte seguindo intuitivamente com sua alma poética e o seu talento o lema de Ferreira Gullar, segundo o qual “A arte existe porque a vida não basta”. Kiko escreveu a primeira grande obra prima do teatro brasileiro do século 21. A segunda metade do século 20 nos deu três grandes autores que revolucionaram a dramaturgia brasileira: Nelson Rodrigues, Plínio Marcos e Jorge Andrade. Kiko Marques, pela sua poética, pela nostalgia presente, pelo uso da memória como meio narrativo e principalmente pela compaixão por seus personagens está mais próximo à dramaturgia de Jorge Andrade, apesar do seu grande salto na forma narrativa em consonância com a dinâmica dos dias atuais. A fragmentação da trama é muito bem vinda porque o dramaturgo soube contornar os perigos de transformar esse tipo de narrativa num baú de ossos onde nenhum espectador consegue decifrar o que é de quem. Usando o barco Sargento Evilázio como narrador e datando as cenas, assim como, fornecendo alguns dados para situar o espectador, Kiko permite a fruição da história que se desloca não cronologicamente por cerca de 50 anos de três gerações de habitantes da ilha.
 
 
       Não bastasse o talento de dramaturgo, Kiko revelou-se o melhor tradutor cênico de seu texto realizando um espetáculo belo e pungente, avis rara no cenário teatral brasileiro. Muniu-se de um elenco excepcional e homogêneo, assim como do músico Umanto que realizou um trabalho que é um exemplo do que deve ser uma trilha sonora (inexplicavelmente esse verdadeiro tesouro não foi contemplado com nenhum prêmio no ano de 2013), do cenógrafo Chris Aizner que projetou o belo cais onde se passa toda a ação da peça e dos bonequinhos criados pelo Grupo Sobrevento que são parte integrante e importante da história contada.
 
 
        No dia 11 de agosto de 2014 CAIS saiu mais uma vez de cena (a peça estreou modestamente no Instituto Capobianco em outubro de 2012 e sem nenhuma ajuda da mídia foi se impondo pelo boca a boca e tornou-se um verdadeiro fenômeno no ano de 2013 lotando aquele teatro durante as várias temporadas que lá cumpriu; circulou pelo festival de Curitiba e pelo interior de São Paulo e realizou esta temporada na Oficina Cultural Oswald de Andrade sempre com casas cheias). Assistindo nove vezes ao espetáculo fui testemunha de momentos chaves de seu percurso: Virginia Buckowski grávida de oito meses fazendo a Magnólia, Tatiana De Marca a substituindo, retorno da Virginia trazendo a pequena Anita para sua “estreia” teatral, saídas e entradas em cartaz, a bela apresentação para público maior em Curitiba, o verdadeiro convívio com todo o pessoal do elenco e de suporte (as queridas Rosana e Paulinha), o eterno entusiasmo da Fernanda Capobianco e agora a despedida nesse 11 de agosto que espero tenha sido apenas mais uma saída de cena para um breve retorno. É claro que esta encenação não vai poder ficar eternamente em cartaz e um dia vai ter um ponto final. Kiko Marques escreverá, dirigirá e atuará em outros textos; os atores, os músicos e o pessoal de suporte seguirão seus caminhos, mas o barco Sargento Evilázio, a doce poita Rosiméri, Magnólia, Bonifácio, Nilmar, Waldeci, Berenice, Walcimar, Juciara, Walciano, Cachorrinho, Osório, Andreia Polaca e todos os outros personagens viverão para sempre na memória e no coração de quem teve o privilégio de com eles conviver.
 
 
        No final desse último espetáculo Alejandra Sampaio em mais dos seus gestos generosos agradeceu nominalmente a mim, ao Carlos Colabone e à Ana Elisa Mattos que segundo ela fomos tijolinhos que colaboraram para construir a casa. A peça reuniu em torno de si um verdadeiro séquito de encantados que a reviram muitas e muitas vezes. A pergunta entre esses iniciados não era “Você viu CAIS?”, mas “Quantas vezes você viu CAIS?”. Fiquei feliz e orgulhoso com a citação, mas é minha alma que agradece por ter podido morar nessa casa por todo esse tempo e por ter feito de seus habitantes amigos verdadeiros. A arte nos aproximou e a vida nos uniu. VIVA O TEATRO!

domingo, 10 de agosto de 2014

PRÊMIO APCA TEATRO - INDICADOS DO PRIMEIRO SEMESTRE 2014


Conselho de Classe

     No dia 04 de agosto, dez dos críticos de teatro da Associação Paulista de Críticos de Artes se reuniram para fazer as indicações do primeiro semestre para o Prêmio APCA 2014 - Teatro. Após a análise de uma lista onde cada elemento presente pode incluir as suas escolhas pessoais, o grupo, por meio de votação, fez as seguintes indicações:
 
     ATOR
     Ricardo Blat e Thelmo Fernandes (A Arte da Comédia)
     Roney Facchini (Ou Você Poderia Me Beijar)
     Rubens Caribé [Assim É (Se Lhe Parece)]
 
Rubens Caribé
 
     ATRIZ
     Laila Garin (Elis, A Musical)
     Nathalia Timberg (Tríptico Samuel Beckett)
     Sandra Dani (Oh os Belos Dias)
 
Nathalia Timberg

 
     AUTOR / DRAMATURGO
     Alexandre Dal Farra (Abnegação)
     Jô Bilac (Conselho de Classe)
     Leonardo Cortez (Maldito Benefício)
 
Maldito Benefício
 
     DIRETOR
     Bel Garcia e Susana Ribeiro (Conselho de Classe)
     Marco Antônio Pâmio [Assim É (Se Lhe Parece)]
     Rubens Rusche (Oh os Belos Dias)
 
Oh os Belos Dias
 
     ESPETÁCULO
     A Arte da Comédia
     Assim É (Se Lhe Parece)
     Conselho de Classe
 
A Arte da Comédia
 
 
 
     O grupo também selecionou nomes e/ou eventos para o PRÊMIO ESPECIAL DA CRÍTICA e para o GRANDE PRÊMIO DA CRÍTICA os quais se somarão àqueles indicados no segundo semestre numa lista da qual (como nas outras categorias) sairão os premiados.