O
primeiro contato que tive com a obra de Robert Lepage foi em 2002 quando
assisti no Rio de Janeiro à montagem de Monique Gardenberg de Os Sete Afluentes do Rio Ota. O impacto
foi imediato o que me fez rever o espetáculo por mais três vezes quando foi
apresentado em São Paulo (naveguei pelos afluentes do Ota por 20 horas, já que
a peça tinha cinco horas de duração). A partir daí pesquisei o trabalho do
artista e em 2004 assisti ao filme O Lado
Secreto da Lua que foi outro
impacto e me fez buscar mais informações sobre ele.
Cenas da montagem brasileira de Os Sete Afluentes do Rio Ota (2002-2003)
O Lado Escuro da Lua (filme)
Ontem
tive a oportunidade de conhecer pessoalmente Robert Lepage no Sesc Santo Amaro
onde ele participou de um bate-papo com o público, mediado pelo Prof. Luís
Fernando Ramos e tendo a diretora
Beatriz Sayad como intérprete.
Ramos
abriu a sessão comentando que apesar de muito criativos e inovadores na forma
os espetáculos de Lepage têm narrativa clara e direta o que vai contra os
preceitos do teatro pós dramático que tem um dos seus baluartes na
anti-narrativa . Lepage respondeu à questão dizendo que Quebec (sede de sua
companhia Ex Machina no Canadá) é uma
cidade pequena e é necessário fazer espetáculos que sejam acessíveis aos seus
moradores. Senti uma ponta de ironia nessa resposta, mas o assunto não foi
levado adiante.
O
encenador/ator/diretor cinematográfico comentou sobre as diferenças em fazer
cinema (que é uma arte horizontal) e teatro, que segundo ele é vertical, tendo
o homem no centro, suas aspirações no alto e embaixo seu inferno. Falou também
de suas experiências em dirigir óperas e um espetáculo do Cirque du Soleil.
Fez
uma exposição sobre o processo de criação de seus espetáculos onde as
personagens normalmente surgem antes da história. Chamou as improvisações
feitas durante o período inicial do processo de “balde sem fundo”. Segundo ele,
seus espetáculos começam a ter forma após a estreia.
Quanto
à sua companhia Ex Machina, disse que
ela existe há aproximadamente 20 anos e está sediada num antigo quartel do
corpo de bombeiros em Quebec. O grupo tem elementos do mundo todo e não se
fazem testes (auditions) para a
admissão no mesmo. A companhia não tem a hierarquia do teatro tradicional.
Lepage
disse que procura fazer espetáculos que tenham duas histórias: uma com H
maiúsculo e outra com h minúsculo cujo tema universal e cotidiano seja uma
porta para o espectador melhor compreender a primeira.
Jogo de Cartas: Espadas
A
seguir falou da tetralogia Jogos de
Cartas cujas duas primeiras partes (espadas e copas) serão apresentadas em
São Paulo. Tudo realmente começou com improvisações com jogos de cartas. Ao
descobrir que o jogo foi uma invenção árabe, o grupo foi tomando consciência da
influência da cultura dessa parte do oriente na cultura ocidental e o mundo
árabe acabou se tornando o tema de todo o projeto. Cada naipe do baralho tem um
significado bastante claro e este se tornou o norte para cada uma das
encenações: espadas (militarismo), copas (crenças, religião), ouros (negócios)
e paus (trabalhador). As duas últimas partes ainda estão em fase de preparação.
Algumas
pérolas ditas durante o bate papo:
- Há
uma grande diferença em incentivar um aluno a ser o “número um” e a ele ser
“único”.
- O
teatro é semelhante ao esporte. Cada vez é uma coisa única. O espectador deve
se sentir privilegiado ao estar presente a um ato efêmero que nunca mais vai se
repetir daquela maneira. Citou a lenda
da escultura em gelo feita por Michelangelo que segundo as testemunhas oculares
foi a mais bela obra do artista italiano. Quem vai desmenti-las?
-
Usualmente os ocidentais representam uma árvore com o tronco e os ramos, já os
chineses e os japoneses a representam com o tronco e as raízes. É necessário
sempre conhecer e aprofundar as raízes.
Se
já havia uma forte expectativa em relação aos espetáculos que serão
apresentados, ela se tornou muito maior após as palavras do simpático e
acessível encenador.
Curioso
e lamentável notar a presença muito pequena de atores e gente ligada ao teatro no público
presente.
JOGO
DE CARTAS :ESPADAS estará em cartaz de 11 a 15 de outubro e JOGO DE
CARTAS:COPAS de 22 a 25 de outubro no ginásio do Sesc Santo Amaro.
Que excelente apresentação, para quem não conhece, do encenador Robert Lepage. Fiquei ainda mais curiosa por assistir aos espetáculos.
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