DIVERSÃO
E REFLEXÃO NA MEDIDA CERTA
Pode-se
imaginar uma comédia muito divertida e irreverente comentando e denunciando a
morte de Vladimir Herzog ou de outros tantos presos políticos que morreram nos
porões da ditadura militar? É mais ou menos isso o que o genial dramaturgo
italiano Dario Fo fez com Morte Acidental
de Um Anarquista, peça escrita em 1970 que teve excelente montagem brasileira
em 1982 dirigida por Antonio Abujamra e tendo Antonio Fagundes no papel do
Louco. Depois de quase 30 anos a peça retorna com direção de Hugo Coelho e com Dan
Stulbach no papel principal. Infelizmente, continua muito atual; felizmente,
porém, continua divertindo como nunca.
Capa do programa da montagem de 1982.
Por
acaso preso numa delegacia, um louco com mania de se fazer passar por outras
pessoas vê a oportunidade de se travestir em juiz e assim questionar o delegado
e o secretario de segurança sobre a morte de um anarquista que estava preso
naquelas dependências e que foi torturado para poder confessar seu suposto
envolvimento num atentado. O prisioneiro, segundo as autoridades, com medo de
um rato suicidou-se se atirando pela janela ocasionando a tal morte acidental.
Qualquer semelhança com casos ocorridos em dependências policiais brasileiras
não é mera coincidência. Para enfrentar a chegada de uma jornalista o louco
muda seu disfarce para um capitão e depois para um bispo até que é desmascarado
pelo comissário que o estava interrogando no início da ação. Tudo ocorre em tom
fortemente farsesco provocando gargalhadas no público durante toda a peça,
inclusive no seu final impactante que não vou revelar aqui.
Dan
Stulbach aproveita para tirar o máximo de humor de todas as situações, bem
auxiliado por um elenco afinado formado por Riba Carlovich como o secretario de
segurança, Henrique Stroeter talvez histriônico em excesso como o delegado de
polícia, Fernando Sampaio da Cia. La Mínima que aproveita seus dotes de palhaço
para a personagem do subalterno comissário e Maira Chasseraux como a
jornalista, acometida de afonia na noite em que assisti ao espetáculo e que o
elenco aproveitou para fazer o público rir com a situação deixando a atriz à
vontade e repetindo seu texto cada vez que ele se tornava inaudível. A
participação de Rodrigo Geribello fazendo a sonoplastia ao vivo apenas com seus
recursos vocais e um teclado é um espetáculo à parte e provocadora de muitas
gargalhadas do público.
O
humor anarquista e demolidor de Dario Fo estão totalmente presentes na montagem
de Hugo Coelho inclusive na introdução ao espetáculo onde o elenco recebe o
público cantando uma canção e depois realiza um pequeno bate papo contando a
origem da encenação que se deu nas conversas de Stroeter e Stulbach enquanto
esperavam a passagem do João Gilberto no calçadão da praia do Leblon!! Tudo
muito divertido, mas dando margem à reflexão e à indignação em relação ao nosso
pobre país.
MORTE ACIDENTAL DE UM ANARQUISTA está em
cartaz no Teatro Porto Seguro às quartas e quintas às 21h até 10 de
dezembro.
25/09/2015
Nenhum comentário:
Postar um comentário