ASSIM
RASTEJA A HUMANIDADE
Impossível não se indignar e não ficar
com um nó na garganta diante dos fatos relatados no espetáculo Bonecas Quebradas em cartaz só até domingo
no Itaú Cultural: o assassinato cruel de jovens mexicanas pobres, a maioria de origem
indígena, que após serem violentadas e torturadas são mortas e, não satisfeitos,
os seus carrascos ainda as estraçalham, jogando pedaços de seus corpos nas
areias do deserto. Esses verdadeiros
restos que dificultam a identificação das vítimas se assemelham a bonecas
quebradas e às vezes são reconhecidos pelos familiares por um pedaço de vestido
ou por uma pasta escolar que a menina portava quando foi assediada pelos
bandidos. Para dramatizar esses fatos a equipe do espetáculo foi ao México e fez
extensa pesquisa que resultou no pungente retrato apresentado ao público.
A encenação de Verônica Fabrini começa
de forma singela com uma atriz contando o trajeto que uma menina faz de sua
casa para o trabalho ou do trabalho para a escola. Percursos feitos diariamente
por cada um de nós e por nossos filhos. Mas os monstros estão à espreita,
prontos para atacar e um percurso,agora de vida, pode estar sendo interrompido a
partir daquele momento. Devidamente preparado para a violência que está por vir
o público adentra o espaço cênico que tem ao fundo lençóis estendidos, bonecos
pendurados no teto e a areia do deserto como chão.
Usando imagens projetadas no fundo
branco e no chão, depoimentos em telas de TV, canções indígenas e o talento das
três atrizes a encenadora mostra toda essa barbárie de forma lúdica e poética ocasionando
indignação sim, mas também fazendo o público refletir sobre esse momento
sombrio por que passa a assim chamada humanidade. Impossível não expandir a
indignação para a violência com as mulheres brasileiras, assim como, com os
homossexuais e com aqueles que têm uma posição política diferente da sua. O
ódio está presente na maioria das relações e o poder do dinheiro e do
capitalismo selvagem resultam no menino morto naquela praia onde ele poderia
estar brincando com seu baldinho de areia. A montagem de Bonecas Quebradas nos faz pensar sobre tudo isso.
A dramaturgia bem amarrada do
espetáculo é assinada por João das Neves e foi realizada em processo
colaborativo com a diretora e as atrizes.
É um grande prazer ver Isa Kopelman de
volta aos palcos de São Paulo. Atriz de grande versatilidade que demonstrava grande
potencial nos anos 1980, mas, ao que eu saiba se afastou dos palcos para
lecionar na Unicamp. Sua atuação como
uma das gêmeas com um imenso laço de fita em A Aurora da Minha Vida -1981- é uma daquelas coisas que a memória
insiste em manter em nossa cabeça. Em Bonecas
Quebradas Isa tem momentos emocionantes como a mãe que procura em vão pela
filha que desapareceu. Luciana Mitkiewicz sai-se bem tanto como uma das meninas
que vai desaparecer como uma miss vulgar, protótipo do objeto a ser manipulado
pelo macho. Finalmente Lígia Tourinho: torrente de emoções em cena, seu
desempenho visceral com gestual e voz de alta potência não deixa o público
desviar o olhar sobre ela.
A lamentar a curtíssima temporada
(apenas quatro apresentações) de espetáculo tão importante e oportuno para o
momento em que vivemos. AINDA HÁ TEMPO ESPECTADORES: Hoje sábado (05/09) às 21h
e amanhã domingo (06/09) ás 19h no Itaú Cultural. Ingressos gratuitos a serem
retirados 30 minutos antes do espetáculo.
05/09/2015
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