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sexta-feira, 6 de novembro de 2015

E O VENTO (DE OUTUBRO) LEVOU...


         O teatro é a arte do efêmero e no mês de outubro o vento levou cinco importantes espetáculos que ficarão apenas na memória daqueles privilegiados espectadores que tiveram a oportunidade de vê-los. Dois deles (A Máquina Tchekhov e Do Amor) foram comentados neste blog, mas o tempo exíguo não permitiu que eu escrevesse uma matéria sobre os outros três. São eles:


         BT TRANS – Corajoso espetáculo do grupo As Travestidas de Fortaleza, onde o ator Silvero Pereira se desnuda do suposto charme de Gisele (seu alter ego) e apresenta sem maquiagem e sem glamour fatos da vida de travestis (a violência homofóbica, o preconceito, o difícil relacionamento com a família). Belo trabalho que termina com uma dramática interpretação de Geni e o Zepelin de Chico Buarque.


         DESTERRADOS/UR EX DES MACHINE – O espetáculo da Cia. Antropofágica cumpriu apenas oito apresentações no Teatro Anchieta integrando a programação paralela da exposição Máquina Tadeusz Kantor no Sesc Consolação. O encenador Thiago Reis Vasconcelos fazendo jus ao nome de sua companhia preparou uma salada muito bem temperada de Bertolt Brecht, Kurt Weill e Tadeusz Kantor, citando de maneira entre outros, Stanley Kubrick (os macacos de 2001- Uma Odisseia no Espaço e a personagem Alex de A Laranja Mecânica) e até a cena da barricada de um musical da Broadway (Les Misérables)!. É claro que, na melhor tradição de Kantor, Thiago permanece em cena fumando durante toda a apresentação. O espetáculo tem ares de superprodução graças ao patrocínio do Sesc e ao imenso palco do Teatro Anchieta. Adequando-se às dimensões da sede da companhia no Espaço Pyndorama a montagem poderia ali cumprir temporada mais longa, permitindo assim que um público maior possa desfrutar dessas duas horas de bom e criativo teatro.


         MANUELA – O que parecia ser uma ideia, no mínimo estranha, tornou-se um dos espetáculos mais interessantes do ano: criar uma peça onde a protagonista é Manuela, a máquina de escrever de Mário de Andrade, assim chamada por ele em homenagem ao seu amigo Manuel Bandeira. Vera Lamy tomou para si a tarefa e saiu-se muito bem tanto na dramaturgia como na atuação. Na dramaturgia ela mescla as falas da máquina com as do escritor e com trechos de suas obras (Macunaíma, O Poeta Come Amendoim e outros poemas). Na atuação a atriz não é menos que virtuosa; interpretando e cantando seu trabalho pode se inserir entre os melhores do ano, fato atestado pelos calorosos aplausos do público que lotou a última apresentação do espetáculo no último fim de semana. O pianista e percursionista (ele faz som até com os tamancos que calça!) Lincoln Antonio é peça importante da encenação fazendo as vezes da viola, outra companheira inseparável do escritor e que chega até a provocar os ciúmes da possessiva Manuela. Após apresentações no Sesc Ipiranga, a peça cumpriu temporada relâmpago na sede da Cia. do Feijão.

         Ainda há tempo de assistir a outros dois bons espetáculos ainda não comentados:

         O BALCÃO – A (boa) adaptação reducionista de Roberto Alvim eliminou as personagens de Chantal e Roger que fazem parte da causa revolucionária que acontece fora dos limites do bordel de Madame Irma, mas a revolução está presente na poderosa trilha sonora de LP Daniel que ilustra não só nas cenas, mas também os blackouts entre elas. A encenação de Alvim é visualmente deslumbrante com desenho de luz realizado pelo próprio encenador e figurinos que levam a assinatura de Juliana Galdino. Desta vez veem-se as personagens e entende-se o que elas dizem, fatos quase sempre ausentes nas montagens do Club Noir. A interpretação de Juliana Galdino utilizando todas as nuances de sua poderosa voz é marcante. Em cartaz no Club Noir.

         FILOCTETES – O texto verborrágico de Heiner Müller recebe tradução cênica de Marcio Aurélio que prima por cuidadosa movimentação dos atores (quase uma dança) e pela sugestiva trilha sonora. Boas atuações de Paulo Marcello, Washington Luiz e Marcelo Lazzaratto que volta a atuar no grupo Razões Inversas. Em cartaz na Funarte.

         A crise brasileira está brava, mas o teatro responde bravamente colocando em cartaz muita coisa de qualidade. Que os ventos de novembro e dezembro soprem a favor!


06/11/2015


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