O
russo Vsevolod Meierhold (1874-1940);
ator, diretor e teórico de teatro; foi perseguido e eliminado (fuzilado na
prisão) pela ditadura socialista por entenderem que ele não estava de acordo
com os cânones do realismo social. Em Ricardo
III Não Terá Lugar o dramaturgo romeno Matéi Visniec (1956) inspirou-se em
fatos da vida de Meierhold para denunciar a ditadura de Ceausescu que vigorou em seu país de 1965 a 1989, criando
uma virulenta crítica a todo e qualquer regime totalitário.
Meierhold
É uma
das peças mais instigantes de Visniec usando e abusando do meta teatro para
mostrar os delírios de Meierhold durante os ensaios de Ricardo III de Shakespeare envolvendo seus pais, sua esposa, seu
filho recém nascido (Camarada Bebê), o ator que interpreta Ricardo III, a
comissão que irá liberar (ou não!) a sua encenação e o Generalíssimo (poder
supremo, clara referência a Stalin e a Ceausescu). Todos o questionam sobre a
maneira como está conduzindo a encenação fazendo com que ele se autocensure a
todo momento.
A
jovem companhia Grupo Pandora de Teatro
sediada no bairro de Perus enfrentou a difícil tarefa de levar essa peça à cena
e o fez com excelentes resultados. É sempre entusiasmante quando vemos jovens
de talento arriscando-se em empreitadas desse porte e saindo-se muito bem. O
diretor Lucas Vitorino, assim como todo o elenco, está na faixa dos 30 anos e a
companhia tem uma sólida de existência de 12 anos (iniciaram as atividades em
2004 com nada menos que O Senhor Puntila
e Seu Criado Matti de Bertolt Brecht e têm em seu currículo cerca de dez
títulos, todos significativos e condizentes com a realidade de Perus e do
país).
As várias
personagens da peça são interpretadas por apenas cinco atores. Em papéis fixos
o excelente Rodolfo Vetore sem sair de cena durante os 90 minutos da
apresentação interpreta Meierhold com muita energia e demonstrando toda a sua
perplexidade e o seu medo (estão sempre batendo na porta!), Filipe Dias
(Ricardo III) e Thalita Duarte (a esposa de Meierhold). Marcio Gonçalves e
Lucia Machado revezam-se com muita versatilidade nos demais papéis. As soluções
encontradas pelo encenador para as personagens da Camarada Mãe, do Camarada Pai
e do Camarada Bebê são muito criativas e por si merecem a ida ao teatro.
A
trilha sonora da peça é toda baseada na obra de Shostakovich (1906-1975),
grande compositor russo igualmente perseguido pelo regime stalinista.
É
inacreditável e, eu diria, inconcebível que espetáculo dessa importância passe
de maneira meteórica por São Paulo (foram feitas duas obscuras apresentações
nos teatros Flávio Império e Alfredo Mesquita no início do ano e agora esta
única apresentação no Itaú Cultural). A peça e o grupo têm porte para realizar
temporada mais longa nos palcos da cidade e se tornarem conhecidos além dos
muros do distrito de Perus, onde realizam importante atividade cultural na
chamada Ocupação Artística Canhoba.
Obs:
O grupo usou a tradução literal do título em francês (Richard III n’Aura Pas Lieu), mas acho mais apropriada aquela usada
pela Editora É que é Ricardo III Está
Cancelada.
Referências:
Páginas
no Facebook: Grupo Pandora e Ocupação Artística Canhoba.
Blog:
grupopandora.blogspot.com.br
Endereço:
Rua Canhoba, ao lado do número 333 – Vila Fanton – Perus/SP
Publicação:
Efêmero Concreto – Trajetória do
Grupo. Volume organizado por Lucas Vitorino e Thalita Duarte.
03/08/2016
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