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segunda-feira, 20 de abril de 2020

NÓS QUE NOS AMÁVAMOS TANTO



        Nem todos os dias da quarentena se parecem. Em alguns o céu está azul e o sol entra pela janela, em outros o céu está alaranjado no final da tarde, ás vezes há muitas nuvens e ainda em outros a noite é iluminada pela lua. Os domingos parecem ser mais solitários porque não há a companhia dos programas de rádio que acompanho durante a semana e as pessoas parecem estar mais recolhidas e distantes do Facebook e do Whatsapp. Além disso, os dias diferem principalmente pelo meu estado de espírito que a cada dia pode estar diferente, assim como o humor da Valentina.

        Tudo isso para notar que no último domingo eu estava bastante emotivo. Não estava triste. Eram emoções gostosas que fizeram brotar lágrimas em meus olhos em diversos momentos.

        A primeira vez foi ao ouvir algumas canções de Ao Sul do Pacífico (South Pacific), musical de Rodgers e Hammerstein: Bali Hai preparou minha emoção que explodiu durante Some Enchanted Evening. E como não chorar ao ouvir Climb Every Mountain (The Sound of Music) e, principalmente, You’ll Never Walk Alone (Carousel).

        Com o coração devidamente sensibilizado escolhi dois filmes para assistir que de antemão eu sabia que iriam me levar às boas lágrimas.
 
 
        O primeiro foi Ladrões de Bicicletas (1948), a obra prima do neo realismo italiano, dirigida por Vittorio De Sica realizada com atores não profissionais e filmada numa Roma devastada pela pós guerra onde imperava o desemprego e a pobreza. Assusta pensar que poderemos ter situação parecida ao final dessa pandemia trazida pelo novo corona vírus.
        Leonardo Maggiorani está ótimo como o pai desesperado à procura da bicicleta, sua ferramenta de trabalho que foi roubada, mas quem carrega o filme e provoca lágrimas é o garoto Enzo Staiola, então com nove anos no papel do filho Bruno. Hoje Staiola é um belo senhor de 80 anos que se tornou professor de matemática, uma vez que sua carreira cinematográfica não deslanchou como a de tantos outros atores infantis que surgem com grandes interpretações apenas no primeiro filme (assisti a uma entrevista dele no youtube, logo depois de ver o filme). O filme me remete à minha infância e ao Cine Nacional onde meu tio Amadeu o assistiu por volta de 1952 e comentou que o garoto lembrava muito o Zezinho (eu!!).
 

        A segunda escolha recaiu em outro italiano: Nós Que Nos Amávamos Tanto (1974), um dos grandes filmes de Ettore Scola e que tem um dos títulos mais belos que se tem notícia, tanto em italiano (C’Eravamo Tanto Amati), como na tradução dada em português que me soa ainda mais bonita do que aquela original.
 

        O filme trata de três jovens que se conheceram durante a segunda guerra mundial e de seus encontros e desencontros até a velhice. Um deles conhece e se apaixona por uma bela jovem (Stefania Sandrelli, esplendorosa como sempre) que terá papel importante na vida dos três. Um belo filme sobre como na maioria das vezes os sonhos da juventude não se realizam e como as pessoas podem mudar ao longo da vida. A trama me lembrou daquela decepção que sentimos ao reencontrar antigos companheiros de juventude naqueles encontros comemorativos do ano de formatura no colégio ou na faculdade.
        Nino Manfredi, Vittorio Gassman e Stefano Salla Flores representam os três amigos e o elenco ainda conta com Aldo Fabrizi, ícone da comédia italiana. O filme ainda conta com deliciosas participações de Federico Fellini e Marcelo Mastroianni numa reconstituição da famosa cena na Fontana di Trevi de A Doce Vida e de Vittorio De Sica numa palestra sobre o filme Ladrões de Bicicletas. Todos falecidos.

        E assim passei mais este domingo que tive a oportunidade de viver.

- FIM -

        20/04/2020

Um comentário:

  1. Amo qdo vc comenta sobre cinema, como aprendo com vc sobre essa arte de que gosto tanto, mas sobre a qual tenho tão pouco conhecimento.

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