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quarta-feira, 27 de abril de 2016

CANTO PARA RINOCERONTES E HOMENS


        Eugene Ionesco (1909-1994) escreveu O Rinoceronte no final dos anos 1950 ainda sob o impacto deixado pelo terror do nazismo, mas a obra transcende esse período negro da humanidade, pois sua denúncia se estende a qualquer tipo de autoritarismo e à destruição do pensamento humano imposta pela cultura de massa que aliena o homem eliminando sua vontade/individualidade transformando-o em mais um, em um rinoceronte.
        Conectado com a realidade do mundo contemporâneo tragado pelo capitalismo, Rogério Tarifa voltou-se para a obra de Ionesco para criar este urgente Canto Para Rinocerontes e Homens junto com os formandos de 2015 da Escola de Arte Dramática (EAD) e com Jonathan Silva, seu parceiro de outras encenações, que compôs sugestivas canções para parte do texto. A trama do dramaturgo romeno é entremeada com intervenções onde cada ator criou cenas e a transformação de sua personagem em rinoceronte.
        A montagem tem a marca registrada “Tarifa”: recriação de um clássico para o momento atual; espaço cênico e cenografia (de sua autoria) compatíveis com a proposta da encenação; inserção de canções no melhor estilo brechtiano com direção musical de William Guedes; participação do diretor em algumas cenas, além de sua presença vigilante como espectador; citações em vídeo de intelectuais militantes (no caso José Saramago, Pepe Mujica e Eduardo Galeano) e, porque não dizer, certo barroquismo na concepção do todo que alonga o espetáculo alem do necessário.
        O mais admirável de Canto Para Rinocerontes e Homens é o rendimento do elenco. Egressos há menos de um ano da EAD demonstram muito talento e espírito profissional tanto nas cenas de conjunto como nas intervenções individuais. As performances de transformação em rinoceronte são todas bem elaboradas, mas não há como não destacar aquelas de Renan Ferreira e de Viviane Almeida. Merecem destaque também Rubens Alexandre que interpreta o protagonista Bérenger e Murilo Basso com um inflamado discurso à moda Bolsonaro (que horror!).


        Pelos impactos visual e intelectual e também pelo excesso de informações a montagem exige certa deglutição que se completa apenas tempos depois do término da mesma.
        Crítica mordaz ao capitalismo feroz que vem nos engolindo e nos transformando em marionetes, Canto Para Rinocerontes e Homens é espetáculo altamente necessário para os jovens de hoje. Foi com muita alegria que constatei que na sessão a que assisti à peça, a maioria do público era formada por jovens que acompanharam atentos a saga de Bérenger, o último resistente numa sociedade que se transformou em rinoceronte.
        CANTO PARA RINOCERONTES E HOMENS faz mais duas sessões no Centro Compartilhado de Criação (sábado às 20h e domingo às 19h) e volta ao cartaz no dia 07/05 no Galpão do Folias  às sextas, sábados e domingos até 29/05. NÃO DEIXE DE VER.

27/04/2016


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