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sábado, 29 de abril de 2023

AGAMEMNON Voltei do Supermercado e Dei Uma Surra no Meu Filho

 

 

         “Desta cidade apenas restará o lixo que                                    nela despejam” (Paráfrase amparada                          no texto de Bertolt Brecht)

        Rodrigo Garcia (1964-) e sua companhia La Carniceria Teatro estiveram em São Paulo na primeira MITsp em 2014 com a peça/performance Golgota Picnic instigando e até chocando o público na primeira parte, com um palco cheio de pão de hamburguer e carne moída no local onde Jesus foi crucificado e fazendo duras críticas à mercantilização da fé, para depois irritá-lo com a execução completa de As Sete Últimas Palavras de Cristo obra de Joseph Haydn (1732-1809), executada ao piano por um pianista nu por quase uma hora.

        Em 2022 o nome de Garcia voltou ao cartaz dos palcos paulistanos com Agamenon 12h. Assisti a duas versões desta peça, das doze apresentadas em projeto de Carlos Canhameiro no SESC Paulista, e não consegui apreender o conteúdo do texto do dramaturgo argentino em nenhuma delas.

        Eis que por iniciativa da Cia. Arthur-Arnaldo uma nova versão da peça é encenada em São Paulo com tradução e direção de Soledad Yunge. Por se tratar de um grupo que se dedica ao teatro jovem, Soledad optou por uma encenação bastante palatável e até didática, mas jamais tediosa ou esquecendo do alto poder de denúncia do texto ao consumismo desenfreado e às marcas que um capitalismo selvagem deixam no ser humano.

        Usando recursos clownescos, interpretações propositalmente exageradas, cenário coberto de material reciclável (de Julia Reis e Lucas Bueno), um originalíssimo uso das vestimentas (figurinos de Rogério Romualdo) e a bela iluminação de Junior Docini, Soledad cria um espetáculo colorido, vivo e provocativo deixando claras as intenções sócio-políticas do autor e despertando a atenção do público para refletir sobre tudo aquilo que é apresentado.

        Originalmente um monólogo, aqui o texto é dividido entre as atrizes Carú Lima e Júlia Novaes e o ator Tuna Serzedello.

        Na primeira parte, rica em ação e imagens, o homem vai ao supermercado, se entope de coisas inúteis (a sociedade de consumo me consome) e ao chegar em casa dá uma surra na mulher e no filho, para em seguida levá-los a um restaurante.

        Na segunda parte (mais política) a família está em volta de uma mesa da Kentucky Fried Chicken, onde a palavra se sobrepõe à ação e se discute sobre os conceitos de tragédia e de esperança.

        O final parece comunicar que “do lixo viemos e ao lixo retornaremos”. Triste civilização a nossa!

        AGAMEMNON cumpriu curta temporada na Oficina Cultural Oswald de Andrade. Hoje, sábado, 29/04 às 18h é sua última oportunidade de assistir a esse importante espetáculo.

        29/04/2023

sexta-feira, 28 de abril de 2023

MIRÓ - ESTUDO Nº 2

 

Giordano, Bruno, Mário. Erivaldo, Lucas, Pedro e uma passante
Foto de Pedro Escobar 

Um pouco de história.

Meu primeiro contato com essa turma querida do Grupo Magiluth se deu em 2012 durante o Festival de Curitiba em um ensaio da peça Aquilo Que Meu Olhar Guardou Para Você na Casa Hoffmann. Foi amor à primeira vista com Erivaldo, Giordano, Lucas (a cena do balão de ar enchido por Maria Rosa jamais sairá da minha lembrança como uma das cenas mais tocantes que já presenciei em um teatro) e os dois Pedros. Nesse mesmo ano assisti aqui em São Paulo a outros dois preciosos trabalhos do grupo: Torto (solo do Giordano) e Canto de Gregório. A partir daí acompanhei todos os trabalhos do Magiluth, sempre que se apresentaram em São Paulo. Um dos Pedros saiu, Mário e Bruno entraram e a terra deu muitas voltas   até chegar ao excelente Apenas o Fim do Mundo em 2019. Veio a pandemia e não tive a oportunidade de assistir ao elogiado Tudo Que Coube Numa VHS apresentado virtualmente. Em 2022, o grupo apresentou Estudo Nº 1 Morte e Vida, o qual confesso que não me entusiasmou.

Chegou a vez do Estudo Nº2 e fiquei meio receoso de assistir depois do Nº1, mas não podia deixar de ir prestigiar e dar um abraço nos amigos pernambucanos.

 

Miró – Estudo Nº2

A peça começa com um delicioso prólogo, excelente exemplo de meta teatro, que já conquista a plateia, onde os três atores buscam a melhor definição de pessoa/personagem, protagonista, antagonista, coadjuvante e figurante. Nessa cena há uma hilária intervenção virtual de Pedro Wagner dando instruções de como o artista deve dirigir o seu olhar. Erivaldo se apossa da função de protagonista e através dele que começamos a saber um pouco da vida e obra do poeta, também pernambucano, Miró da Muribeca (1960-2022).

A partir daí o espetáculo, escrito e dirigido coletivamente, se utiliza de várias formas para ilustrar a vida de Miró (não confundir com o pintor catalão) e os poemas que escreveu sobre a periferia pernambucana.

Bruno Parmera, Erivaldo Oliveira e Giordano Castro se desdobram em cena atuando e manipulando o som e a luz realizando uma coreografia harmoniosa, diferente daquela anárquica, presente no Estudo Nº1.

Com linguagem altamente teatral e atraente, o Magiluth volta aos seus dias de glória, ainda sem a presença de Mário, Lucas e Pedro, os quais espero que também estejam presentes nas próximas e já bem-vindas encenações do grupo.

A curta temporada do espetáculo no Itaú Cultural termina no próximo domingo, dia 30/04, com sessões de quinta a sábado às 20h e domingos às 19h.

CORRA!!

28/04/2023

 

 

segunda-feira, 24 de abril de 2023

GOLD HERANÇA

 

Há um alguém na multidão...

A linda canção Gold Herança foi composta por Carlos Colla e Gérard Gambus (maestro, compositor e marido de Evinha) para louvar os sete irmãos Correia José Maria, todos ilustres músicos, mais conhecidos por Golden Boys e Trio Esperança.

Entre outras pérolas a letra diz “Sonho e fantasia / Tudo que eu queria / Era todo mundo junto/ E no mesmo palco”, sonho que se concretizou nesse show, que infelizmente não conta mais com Roberto que faleceu em 2016. Na apresentação do último fim de semana no SESC Pompeia Regina também não pode participar por estar com um problema nos olhos, conforme informado por Evinha no início do show.

O grupo Golden Boys surgiu em 1958 formado pelos irmãos Roberto (1940-2016), Ronaldo (1942), Renato (1944) e o amigo Valdir Assunção (1941-2016) e o Trio Esperança surge logo em seguida em 1961 formado por Regina (1946), Mário (1948) e Eva (1951); com a saída de Eva em 1968 para seguir carreira solo, o Trio recebe a caçula da família Marisa (1957). O repertório dos dois grupos está na memória de qualquer criatura brasileira com mais de 50 anos.

Eu ontem fui na festa na casa do Bolinha...

Na carreira internacional, ainda em atividade, as três irmãs respondem pelo nome Trio Esperança. Diga-se, de passagem, que o Trio tem um disco gravado em 1992 que é uma verdadeira obra prima; trata-se de A Capela do Brasil (a canção Gold Herança consta desse disco com a participação dos Golden Boys).

O show no SESC Pompeia foi uma verdadeira festa. O público lotou as duas plateias do teatro e os balcões laterais, aplaudindo entusiasmadamente, cantando junto e se emocionando com as lindas canções dos dois grupos. Foi um show familiar: com exceção de um dos músicos, os instrumentistas eram o marido de Evinha e os filhos dos integrantes dos Golden Boys. Até a netinha e o netinho de Evinha e Gérard participaram de uma canção. Pura delícia.

Deve ser muito gratificante para um artista fazer tanta gente feliz, nem que seja apenas durante aquela hora e meia que dura a apresentação e ver todo mundo cantando junto: POR ONDE FOR QUERO SER SEU PAR!

Só pra terminar: além de continuar cantando lindamente, a família Correia José Maria é de uma simpatia contagiante.

Noite inesquecível.

Quem viu, viu... 

24/04/2023

 

 

domingo, 23 de abril de 2023

UMA CERTA NOVIÇA REBELDE

 

 

Lá se vão 58 anos. Em 1965 eu tinha 21 anos, estava no segundo ano da faculdade de engenharia e acho que ainda tinha um pensamento meio adolescente enxergando ingenuamente a ditadura que se instalara há um ano no Brasil como algo terrível, mas passageiro. Gritávamos “Abaixo a Ditadura”, cantávamos músicas de protesto e bobamente fazíamos parte da patrulha ideológica que não nos permitia gostar de certos filmes ou peças de teatro que eram considerados alienados, vergonhosamente apolíticos e dirigidos apenas a uma elite pequeno burguesa.

Contrariando meus líderes políticos fui ao antigo Cine Rivoli na Avenida São João (no quarteirão entre a Rua Dom José de Barros e a Avenida Ipiranga) assistir a um desses filmes: A Noviça Rebelde (The Sound of Music). E não contei pra ninguém, mas ADOREI o filme!

Filmado em belíssimas locações nos Alpes suíços o filme é de beleza e alegria contagiantes mostrando a história da ex-freirinha Maria junto aos sete filhos do Capitão Trapp. E que músicas!!! 

A gênese desse filme é bastante curiosa: no início dos anos 1950 a verdadeira Maria von Trapp (1906-1987) escreveu livro contando sua história.

Duas Marias: a da lenda e a real

O livro deu origem ao filme alemão A Família Trapp (1958) estrelado por Ruth Leuwerick, com relativo sucesso na época (em São Paulo ficou várias semanas em cartaz no antigo Cine Olido).

Entusiasmada com a saga da família von Trapp e vendo ali grande potencial para um musical, a Broadway reúne Howard Lindsay e Russel Crouse para escrever o libreto, Oscar Hammerstein II para criar as letras das canções e Richard Rodgers para compor a música. Nascia em 1959 um dos maiores sucessos norte-americanos: The Sound of Music, tendo Mary Martin no papel de Maria.

Finalmente em 1965 a peça é adaptada para o cinema com roteiro de Ernest Lehman e direção de Robert Wise com Julie Andrews, contando com algumas novas canções compostas por Richard Rodgers.

E o resto é história, mas vale lembrar que as versões teatrais que vieram depois do filme estão mais próximas deste do que do original de 1959. 

Tudo isso para contar que dias atrás me deparei com duas fotos no Facebook. A primeira reúne o elenco do filme em 1965 e a outra mostra o mesmo grupo cerca de 50 anos depois. Bateu uma saudade imensa e deu vontade de ouvir as canções (é o que estou fazendo agora) e rever o filme com aquele fim maravilhoso da família fugindo pelos Alpes da perseguição nazista na Austria, ao som de Climb Ev’ry Mountain, fato que na realidade nunca ocorreu, mas como dizia John Ford : Quando a lenda é mais interessante que a realidade , imprima-se a lenda

E por falar em realidade, estou aqui em meu quarto olhando o céu azul de uma manhã ensolarada de domingo que caberia muito bem no cenário do filme, mas não vejo os Alpes suíços e sim a cauda de Valentina sempre presente na paisagem da janela.

Estou feliz!

23/04/2023

sábado, 22 de abril de 2023

UNIVERSO

 

Que a terra não era o centro do universo a gente já desconfiava desde os tempos de Nicolau Copérnico (1473-1543) e a certeza veio depois que Galileu Galilei (1564-1642) provou que a terra é que se move, mas quantas e quantas vezes nos dias de hoje, sentados no conforto de nossa privada e olhando para o espelho não consideramos a nossa ilustríssima pessoa como o centro do universo e que tudo e todos giram em torno de nós?

A lucidez, a árdua pesquisa em torno de pensadores / cientistas/ dramaturgos / filósofos e a coerência com suas posições políticas e humanas são marcas registradas do casal Fernando Kinas e Fernanda Azevedo, responsáveis pelo Coletivo Comum (ex-Kiwi Companhia de Teatro) junto com Daniela Embón e Beatriz Calló.

Neste excelente Universo Kinas recorre mais uma vez ao teatro documentário e a pensadores como Carl Sagan, Bertolt Brecht e Daniel Bensaid para demonstrar quão insignificante é o homem perante o universo, mas quão importante e necessário ele é perante este planetinha em que reside, quando empresta sua indignação e dá seu grito de guerra diante das injustiças e cerceamentos de liberdade por aqui cometidos.

Em equilibrado cenário clean (perdão, não achei uma palavra mais apropriada em português) criado por Julio Dojscar e iluminado por Clébio Ferreira, uma cientista/artista/filósofa interpretada com talento, sobriedade e distanciamento por Fernanda Azevedo dá sua conferência (auxiliada por projeções ao fundo do espaço cênico) sobre aonde chegou a dita civilização humana; ela é várias vezes interrompida por um demiurgo sarcástico e debochado vestido de forma caricata e avesso às funções que lhe foram designadas por Platão interpretado com muita ginga por Beatriz Calló.

O desenvolvimento da trama criada por Fernando Kinas poderia perfeitamente prescindir da presença do demiurgo, mas com certeza a personagem foi criada para dar um toque do humor e leveza às gravidades dos problemas tratados pela conferencista. A interação das duas atrizes é muito oportuna e beneficia sobremaneira o equilibrado resultado final.

Sem jamais ser didático ou portador de uma mensagem, Universo atinge o espectador com a clareza e a lucidez com que expõe a sua tese, fazendo-o refletir sobre a mesma, como preconizava o Seu Bertolt.

Mais um trabalho digno e potente de Fernanda e Fernando, desta vez com a importante parceria de Beatriz Calló.na assistência de direção e na pesquisa dramatúrgica.

UNIVERSO está em cartaz no SESC Belenzinho até 07/05 às sextas e aos sábados às 21h30 e aos domingos às 18h30. 

22/04/2023

sexta-feira, 21 de abril de 2023

MÃOS TRÊMULAS

 

Na primeira cena de Mãos Trêmulas, Yara de Novaes coloca a atriz e o ator semi despidos vestindo apenas roupas íntimas sob forte luz amarelada que destaca as marcas que o tempo faz no corpo de todos nós. São dois velhos em cena, mas o que poderia ser um muro de lamentação sobre a velhice logo a seguir muda de lado quando eles sorriem e se dão as mãos.

Essas duas pessoas idosas que estão juntas há dias, ou há meses, ou há anos, ou por toda uma vida, juntam suas mãos para enfrentar a sociedade que lhes virou a cara depois que essas mãos ficaram trêmulas.

Há muita paixão na relação do casal e o sexo se faz presente numa deliciosa cena logo no início do espetáculo. SIM, eles estão vivos e seus corpos clamam por isso.

O texto de Victor Nóvoa é poético e delicado, mas não deixa de por a mão na ferida que é a violência, ou no mínimo o descaso, com que a velhice é tratada pela sociedade capitalista que se baseia na aparência e no dinheiro.

Yara de Novaes faz uma direção discreta, mas que tem a sua marca nos mínimos detalhes como na já citada cena inicial e naquela em que o casal mostra a força de suas, mesmo que trêmulas, mãos. Para tanto conta com o cenário de André Cortez e a preciosa iluminação de Marisa Bentivegna.

Completam a excelência da ficha técnica Catarina Milani na direção de produção, Raul Teixeira com a excelente ambientação sonora, Ana Vitória Bella na preparação corporal, Lilian de Lima na preparação vocal e Fábio Namatame nos figurinos (as tais roupas íntimas e as vestimentas teatrais) cujas cores harmonizam com o ambiente. É louvável presenciar o cuidado da produção na escolha dos profissionais para realizar o projeto.

E o que dizer do elenco? É um verdadeiro privilégio assistir ao desempenho de Plínio Soares e de Cleide Queiroz. Ambos expõem corpos e almas para mostrar as agruras e as alegrias daquele casal de velhos que insiste em dar dignidade às suas vidas, mesmo quando batem fortemente à porta, arrombando-a a seguir.

Espetáculo belo e otimista que faz um idoso como eu, lembrar que o que nos resta de vida tem que ser vivido intensamente, mesmo que o corpo, às vezes, diga o contrário.

MÃOS TRÊMULAS está em cartaz no SESC Pinheiros (Auditório, 3º andar) até 06 de maio, de quinta a sábado às 20h.

21/04/2023

domingo, 16 de abril de 2023

INVERNO

 

Como dramaturga Eloisa Vitz é incansável: nos últimos oito anos completou sua tetralogia filosófica (Amor, Fortuna, Graça e Gloria) e já está na metade da tetralogia das estações do ano (Verão e Inverno), todas elas produzidas, encenadas, dirigidas e interpretadas por ela, sendo que em muitas das montagens assina também a trilha sonora e a iluminação, numa espécie de um “Charlie Chaplin faz tudo” do nosso teatro. Só para lembrar Eloisa ainda tem em seu currículo outros títulos e muitas peças infantis, perfazendo um total de 14 títulos e vem aí Outono e Primavera para completar a nova tetralogia.

Para a realização desses trabalhos, apresentados no aconchegante Teatro do Sol em Santana, Eloisa conta com suas e seus fiéis companheiras e companheiros do Grupo Gattu Miriam Jardim, Mariana Fidelis, Lilian Peres e Daniel Gonzales.

Agora chegou a vez de Inverno estreado na última sexta-feira, dia 14 de abril.

        A peça segue o estilo leve e bem humorado da dramaturga, mas não deixa de tocar em assuntos sérios como a fome, a diferença de classes, a situação dos desfavorecidos pela sorte e a arrogância dos poderosos.

        Tudo se passa nos bastidores do poder em uma cozinha do século XVII onde os servidores de um Duque tramam ingenuamente uma revolução, enquanto são oprimidos por seus patrões e pela igreja, aqui representada por um bispo lascivo e perverso.

        O criativo cenário de Heron Medeiros escancara as paredes laterais do teatro fazendo com que o público visualize a cidade lá fora para reforçar a atemporalidade dos fatos tratados.

        Daniel Gonzales empresta seu talento para o engraçado Florian, que insiste em dizer que é delicado como a flor que carrega em seu nome, mas vive correndo atrás de uma saia; muito humor também está presente na composição de Josephine representada com brilho por Lilian Peres; Miriam Jardim, sempre poderosa, é a cozinheira Margot; completa a lista de serviçais a dama de companhia Emma numa interpretação surpreendente da bela Mariana Fidelis. Isaque Patrício representa Henri, um intermediário entre os poderosos e os empregados e Ricardo Teodoro tem muita energia como o capataz.

        Você deve pensar que, como eu imaginei, Eloisa Vitz reservou para si a personagem de uma bela duquesa. Ledo Engano. Sua hilária entrada em cena demonstra sua versatilidade como atriz e sua capacidade de nos fazer rir com os desmandos de quem detém o poder.

        O simpático acolhimento, uma característica do Grupo Gattu, mais uma vez está presente nesta temporada recém iniciada e ainda sem data para terminar.

        O teatro não fica muito longe da estação de metrô Santana e posso garantir que uma ida até lá vai lhe reservar boas surpresas.

        INVERNO tem sessões às quartas e quintas às 20h, às sextas e sábados às 21h e aos domingos às 19h. O Teatro do Sol fica na Rua Damiana da Cunha, 413 em Santana. Entrada gratuita. Reservas: (11)95679-2526 e (11)3791-2023.

        16/04/2023 

sexta-feira, 14 de abril de 2023

A AFORISTA

 

O deslumbramento com este espetáculo já começa ao abrir a cortina: vê-se a silhueta da atriz no meio do palco iluminada suavemente, circundada por dois pianistas simetricamente colocados nos dois extremos do palco.

Uma mulher de meia idade caminha sem parar relembrando as relações com dois colegas de juventude na faculdade de música, o talentoso e bem sucedido John Marcos Martins (o Johnzinho) e o invejoso e frustrado Polacoviski (um náufrago, segundo ela) que cometeu suicídio e ela está em dúvida se vai ou não a seu enterro. Esses colegas lhe deram o apelido de aforista.

Simples assim.

Com esse fio de história Marcos Damaceno escreve, inspirado nos escritos de Thomas Bernhard, e encena um dos espetáculos mais instigantes surgidos nos palcos paulistanos nos últimos tempos; para tanto conta com a inspiradíssima iluminação de Beto Bruel, a trilha sonora de Gilson Fukushima executada ao vivo em dois pianos de cauda por Sérgio Justen e Rodrigo Henrique e, obviamente, com a interpretação arrebatadora de Rosana Stavis.

Paradoxalmente, apesar de estar caminhando continuamente, a atriz permanece estática e em pé no palco, apenas movimentando braços, mãos e a cabeça com os cabelos brancos que se movimentam loucamente durante os 70 minutos de duração da peça. Há uma perfeita sincronia entre os movimentos da atriz e a trilha executada pelos pianistas.

O cenário da peça também de autoria de Damaceno é um longo prolongamento do vestido de Rosana que tanto pode representar uma cauda como o longo caminho percorrido pela personagem.

Assim como na obra de Bernhard a repetição de palavras e fatos é hipnotizante deixando o espectador com os olhos arregalados e o corpo afastado da poltrona para poder sorver cada segundo das palavras emitidas pela personagem/narradora e para se espantar com o esplendor que é a interpretação soberba de Rosana Stavis.

O teatro brasileiro é pródigo quanto à presença de grandes atrizes e neste primeiro quadrimestre da temporada teatral já temos mais uma prova disso com os trabalhos marcantes de Vera Holtz em F(r)icções, Alejandra Sampaio e Virginia Buckowski em Banco dos Sonhos e agora Rosana Stavis em A Aforista. 

                A AFORISTA está em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil até 21 de maio às quintas e sextas às 19h e aos sábados e domingos às 17h.

        Realização da Cia. Stavis-Damaceno (Curitiba)

        ABSOLUTAMENTE IMPERDÍVEL!

        14/04/2023

 

segunda-feira, 10 de abril de 2023

A CERIMÔNIA DO ADEUS

 

                             Haverá algum lugar no mundo onde possamos colocar nossa esperança?

        1. Um pouco de história.

Foi em 1972 que Mauro Rasi, então com 23 anos, estreou sua primeira peça A Massagem em São Paulo, vinda na onda de peças com dois atores iniciada em 1969 com Antônio Bivar, Zé Vicente, Leilah Assumpção, Consuelo de Castro e Isabel Câmara.

Em 1974 foi a vez de Ladies na Madrugada, estreia tumultuada e desastrosa do autor na direção que, retirada de cartaz, teve de ser redirigida por Amir Haddad; a produção era de Ney Matogrosso e o espetáculo revelava o talento do saudoso Patrício Bisso, recém vindo de Buenos Aires, com apenas 17 anos.

Em seguida veio a onda besteirol, onde a maioria de suas peças estreou no Rio de Janeiro.

Finalmente em 1987, Rasi estreia uma de suas obras primas no Rio de Janeiro: A Cerimônia do Adeus; no ano seguinte a peça estreia em São Paulo no Teatro Anchieta com direção de Ulysses Cruz. A peça é a segunda de uma trilogia (mas a primeira a ser escrita e estreada) formada por A Estrela do Lar e Viagem a Forli (a última). De alguma maneira a peça Pérola escrita anos depois também faz parte do universo da trilogia.

Rasi continuou escrevendo até sua morte prematura aos 54 anos em 2003. 

        2. Abril de 2023

Eis que 35 anos depois, Juliano, Aspázia, Brunilde, Francisco, Lourenço, Simone e Sartre, as personagens de A Cerimônia do Adeus, voltam ao mesmo palco, mais uma vez pelas mãos de Ulysses Cruz e a peça conserva todo o frescor da época em que surgiu, sem necessidade de atualizações gratuitas. Isso é que torna um texto um clássico, não é? As inquietações do jovem Juliano e as intervenções político-filosóficas do casal francês estão todas lá, da maneira que Rasi as concebeu.

Novos cenários e figurinos (ambos de Ulysses Cruz), trilha sonora (de André Abujamra), iluminação (Nicolas Caratori) e, obviamente, novo elenco.

Ulysses Cruz remodelou a postura gestual e interpretativa dos personagens de Simone de Beauvoir e de Jean-Paul Sartre e o que minha memória traz depois de 35 anos é que os outros personagens mantém as mesmas características da montagem anterior.

Se o elenco de 1985 era excelente, este não fica atrás. A importante figura da mãe Aspázia é interpretada com muita intensidade por Malu Galli; Olívia Araújo tem bonita participação como a simpática tia Brunilde, sendo responsável por bons diálogos engraçados com Aspázia; Rafael de Bona é o primo revoltado e obcecado pelo protagonista Juliano e Fernando Moscardi mostra a vivacidade juvenil do amigo Francisco.

Eucir de Souza representa um Sartre já avançado na idade e Beth Goulart empresta seu enorme talento para uma solene e irônica Simone de Beauvoir, sem deixar de dar um  toque de humor em suas intervenções.

No centro da roda está o Juliano de Lucas Lentini. Em 2015 ao assistir a Sobre Cartas & Desejos Infinitos eu já pontuava: “a peça revela o talento de Lucas Lentini, intenso nas emoções da personagem Rafa” e Lentini não deixou de mostrar o seu talento em toda a sua trajetória até aqui, coroando-a com esta formidável interpretação do jovem Juliano.

A Cerimônia do Adeus é um dos grandes momentos desta temporada teatral que não para de nos surpreender.

Sempre reforço que o teatro é o templo da esperança e da utopia e talvez isso responda em parte à questão que Simone levanta na frase que serve de epígrafe para esta matéria.

Cabe destacar o belo programa da peça com belíssimas fotos em preto e branco creditadas a Lenise Pinheiro. 

A CERIMÔNIA DO ADEUS está em cartaz no Teatro Anchieta até 21/05/2023 às sextas e aos sábados às 20h e aos domingos às 18h. 

10/04/2023

 




sábado, 8 de abril de 2023

JUDY – O ARCO-ÍRIS É AQUI

 

Em apenas uma semana assisti a dois bons espetáculos muito parecidos na forma: Dolores com Rosana Maris e Judy com Luciana Braga.

Parece ser a hora e a vez dos musicais biográficos minimalistas: uma atriz mescla a vida e a obra de uma cantora com sua própria trajetória interpretando canções da biografada com acompanhamento de um pequeno grupo de músicos.

Nada de cenários espetaculosos que sobem e descem nem sempre dizendo porquê, nem coreografias mirabolantes tentando chegar perto daquelas de Bob Fosse e muito menos elenco grandioso com a mocinha com voz sopraninho lembrando aquela da noviça rebelde da Julie Andrews; aqui tudo se resume a uma excelente atriz que se aventura a cantar, muito bem por sinal.

Judy Garland (1922-1969) não teve vida fácil. Baixinha (1m51) e meio rechonchuda, foi levada aos medicamentos, diga-se drogas, ainda na adolescência pela sua opressora mãe e pelos executivos da Metro-Goldwin-Mayer com o objetivo de emagrecer e manter o intenso ritmo de trabalho a que era submetida. Tal fato a marcou para sempre, viciando-a e levando-a à morte precocemente aos 47 anos de vida.

O texto e o espetáculo de Flávio Marinho não deixam de citar esses tristes fatos, mas mantém um clima de arco-íris depois da tempestade enfatizado brilhantemente por uma solar Luciana Braga que encanta o público desde a entrada deste na sala de espetáculos, recebendo-o com contagiante e espontânea simpatia.

A primeira vez que assisti a um trabalho de Luciana Braga foi em 1986 quando ela se apresentou com o Grupo Tapa em São Paulo em O Tempo e os Conways. Era uma jovem de 24 anos em um elenco numeroso, mas que já se fazia notar. Voltei a vê-la, mais madura, contracenando com Carla Camuratti em Cartas Portuguesas (1992) e depois em duas peças com seu autor/diretor atual Flávio Marinho: Coração Brasileiro (2000) e Um Caminho Para Dois (2005).

Dezoito anos depois Luciana volta aos palcos paulistanos para brilhar de forma muito intensa dando vida à não menos brilhante Judy Garland. Luciana se parece com Judy e os figurinos (perfeitos) e o penteado reforçam essa semelhança. A atriz não procura imitar a biografada nem no gestual nem na interpretação das canções, mas Judy insiste em se fazer presente aqui e ali durante os deliciosos 90 minutos que dura o espetáculo.

Luciana Braga é acompanhada pelos músicos Liliane Secco e André Amaral e os arranjos e a direção musical são de Liliane Secco. A fundamental preparação vocal é assinada por Felipe Abreu. Cenário e figurinos (já elogiados acima) de Ronald Teixeira. A competência habitual de Paulo César Medeiros comparece na iluminação.

Por seu extremo bom gosto, pela riqueza da obra de Judy Garland e pela excelente interpretação de Luciana Braga, Judy – O Arco-Íris É Aqui é espetáculo imperdível que deve levar multidões ao Teatro FAAP até o final da temporada em 28 de maio. Sessões às sextas e aos sábados às 20h e aos domingos às 18h.

Não deixe pra depois...

08/04/2023

quarta-feira, 5 de abril de 2023

AB CENAS PAULISTANAS

 

 

                                       Vamos almoçar, sentados na calçada

                                               Conversando sobre isso e aquilo

                                               De coisas que a gente não entende nada”

                                                         (Torresmo à Milanesa)

Quando as luzes do espaço cênico da aconchegante Casa da Gioconda se acendem, aos poucos vemos surgir aqui e ali a Pafunça; a infeliz Iracema, antes que um carro a “pinchasse” no chão; o Arnesto que deu a maior mancada com seus amigos, o Mané que foi abandonado pela Inês que saiu pra comprar pavio pro lampião e não “vortou” mais, a Gioconda, moça que deu nome à Casa; os sem teto Mato Grosso e Maloca e o Dito, que “troxe” ovo frito na “maumita”. Prestando bem atenção dá até para ver umas “mariposa” em “vorta” das “lampida”.

O universo e os personagens de Adoniran Barbosa (1910-1982) são recriados pelo dramaturgo Milton Morales Filho em pequenas cenas que são ilustradas pelas canções que lhes deram origem.

Conduzido por elenco e músicos afiados, o público passeia pelo Bixiga, pelo Viaduto Santa Efigênia, pela Vila Esperança, por Jaçanã e chega até a casa do Arnesto e dá com o nariz na porta; tudo isso sem sair da Rua Conselheiro Carrão.

        São vários os personagens em cena, mas vale destacar os sem teto vividos por Alexandre Meirelles (Maloca) e Thiago Carreira (Mato Grosso), o casal composto por Carlos Morelli (Mané) e Cy Teixeira (Inês), a Iracema de Joice Jane Teixeira e seu companheiro interpretado por Joaz Campos. João Attuy (presença forte), Frederico Mendonça e Leandro Medeiros completam o elenco.

        William Guedes assina a direção musical e a preparação vocal do elenco. Músicos: João Nepomuceno (violão), Lucas Brogiolo (percussão) e Marco Rochael (sopro)

        A denúncia à instabilidade/desigualdade social constante na obra de Adoniran também marca presença no espetáculo e tem seus momentos mais potentes nas falas de Maloca e Mato Grosso e, principalmente, na cena em que todo o grupo interpreta aquela que para este receptor é a obra prima de Adoniran: Despejo na Favela, mais atual do que nunca, haja vista a enormidade de seres vivendo nas ruas em condições sub humanas.

        O cenário composto de praticáveis que se deslocam conforme a necessidade é assinado, assim como os figurinos, pelo diretor e por Cy Teixeira.

        A meu ver, a montagem deveria ressaltar no título o nome de Adoniran Barbosa e não se limitar a um simples AB que não explicita um nome que poderia atrair público maior, uma vez que Adoniran é um querido tanto do Bixiga como de toda São Paulo.

        A peça está em cartaz na Casa da Gioconda até 15 de maio com sessões aos sábados, domingos e segundas às 19h30.

        05/04/2023

 

 

terça-feira, 4 de abril de 2023

DOLORES minha composição

 

A atriz Rosana Maris fez exaustiva pesquisa sobre a vida e a obra de Dolores Duran (1930-1959) a qual resultou em um texto teatral que numa primeira leitura durou, segundo ela, quatro horas.

 Depois dos, como sempre sofridos e necessários cortes, o texto chegou ao formato atual de um belo e dinâmico show/espetáculo de pouco mais de hora e meia.

Para tal resultado Rosana se cercou de profissionais do quilate de Luiz Fernando Marques na direção, Fernanda Maia na preparação musical, Denise Weinberg na sua preparação de atriz, além de três excelentes músicos que a acompanham nas canções: Marcelo Farias (piano), Pedro Macedo (contrabaixo) e Rodrigo Snaches (bateria).

O cenário concebido pelo diretor é dividido em três ambientes: a casa de Dolores com um criativo armário de onde a atriz, a cada puxada de gaveta, retira todos os objetos necessários para ilustrar as cenas; um palco com microfone de pedestal e um bar onde estão os músicos.

O espetáculo tem caráter intimista e Rosana incorpora Dolores Duran de tal maneira que o público sente que é ela que está ali contando fatos de sua vida e cantando para nós.

A dramaturgia de Rosana contempla a presença de outras e outros artistas que foram importantes para Dolores como Julie Joy, Marisa Gata Mansa, Maysa, Vinicius de Moraes e o saudoso Tom Jobim, em um dos momentos mais emocionantes da apresentação.

Rosana também não esquece de indicar o preconceito contra as mulheres e os negros tanto na época de Dolores como nos dias de hoje, mas ressaltando que agora a presença de cantoras negras na vida artística brasileira é bem maior do que na década de 1950.

Dolores minha composição é espetáculo agradabilíssimo de ser assistido e muito importante por trazer um pouco da vida e obra de Dolores Duran, uma grande cantora/compositora hoje um pouco esquecida e até desconhecida das novas gerações.

O espetáculo está em cartaz no Itaú Cultural até 16/04 de quinta a sábado às 20h e aos domingos às 19h. Entrada gratuita.

 

04/04/2023

sábado, 1 de abril de 2023

O AVESSO DA PELE

 

Vitor Britto/Marcos Oli/Bruno Rocha/Alexandre Ammano

É muito gratificante para este velho espectador assistir a um espetáculo que atinge surpreendente resultado tanto na forma como no conteúdo, realizado por jovens que ainda não chegaram aos 30 anos. É nessa geração que está o futuro do nosso teatro!

Eu não li o romance de Jeferson Tenório, mas não deixarei de fazê-lo, após assistir à excelente adaptação teatral feita por Beatriz Barros e Vitor Britto e que resultou no não menos excelente espetáculo teatral dirigido por Beatriz ora em suas últimas apresentações no SESC Avenida Paulista.

Sinopse constante do programa da peça: “A história é narrada por Pedro. O seu pai, Henrique, é um professor de literatura da rede pública de ensino que sofre uma desastrosa abordagem policial, sendo assassinado voltando para casa depois de uma das melhores aulas de sua vida. A partir dessa morte, Pedro, então decide resgatar o passado da família e refazer os caminhos paternos”

A partir desse material a encenadora realizou espetáculo belo e complexo, repleto de surpresas que mantém o espectador tenso e desperto durante o pouco mais de uma hora de sua duração. Para tanto Beatriz contou com elenco de quatro jovens atores absolutamente integrados entre si e na trama. Eles se revezam na interpretação do narrador Pedro, do pai, da mãe, dos alunos do pai e até de um hilário par de terapeutas.

A criatividade da encenação já é sentida nos primeiros momentos da mesma quando o quarteto literalmente emerge de uma montanha de livros e continua com as notáveis cenas coreografadas (excelente direção de movimento e preparação corporal de Castilho) ao som pulsante do funk e da direção musical de Felipe Oládélè.

Colaboram para o excelente resultado a cenografia de Wanderlei Wagner, o desenho de luz de Gabriele Souza e o figurino de Naya Violeta.

Mas tal resultado seria impossível sem o elenco formado por quatro atores em momento inegavelmente iluminado. Não há como destacar este ou outro nome, mas vale lembrar de momentos marcantes como Vitor Britto e Marcos Oli representando Henrique em sala de aula buscando a atenção dos alunos para a saga de Raskólnikov, personagem de Crime e Castigo de Dostoiveski ou aquele com Bruno Rocha em excelente exercício corporal ilustrando a narração que o professor faz do romance russo e ainda o início da peça com um pungente relato feito por Alexandre Ammano. Mas esses são apenas alguns momentos que me vêm à memória  porque os quatro nos tocam e emocionam durante  todo o espetáculo.

Espetáculo de denúncia contra o racismo, sem ser panfletário ou agressivo, O Avesso da Pele se inscreve entre os melhores trabalhos apresentados neste primeiro trimestre nessa temporada teatral paulistana bastante rica e diversificada.

A peça sai de cartaz no próximo domingo, 02/04 e está com ingressos esgotados (não é impossível conseguir um lugarzinho na fila da esperança que se forma algumas horas antes do início, mas...). A boa notícia é que a peça possivelmente cumprirá nova temporada no Centro Cultural São Paulo. 

Em tempo: na Folha de Paulo desta sexta feira (31/03) há uma extensa reportagem sobre abordagem policial racista. 

01/04/2023