A arte tem de ter algo que me tira do chão e deslumbra
(Ferreira Gullar)
Assisto a muitos espetáculos. Alguns não me dizem nada ou quase nada (saio como entrei), outros me dão muito sono, outros ainda me irritam e desenergizam, tem aqueles que eu gosto e são bem realizados não passando disso, mas é muito difícil acontecer a magia de eu me surpreender, ficar com os olhos arregalados, o coração palpitando e realmente ter a sensação de sair do chão com tanto deslumbramento. Só aí acontece a tão almejada magia dessa arte única chamada teatro, onde artista e público entram numa rara sintonia.
Para minha alegria nos últimos dias essa magia aconteceu três vezes. Primeiro com a força política de Prontuário 12.528, depois com a beleza de Cão Vadio e agora com a surpresa de Dom Casmurro que eu corria o risco de não assistir, devido à pouca divulgação do espetáculo.
Trata-se de uma produção relativamente modesta, mas que tem o básico para ser um ótimo espetáculo: em primeiro lugar uma adaptação rigorosa e bem feita do texto de Machado de Assis (Davi Novaes), em seguida letras e músicas envolventes (Guilherme Gila), algo fundamental em todo musical que se preze, bons músicos, elenco impecável que é brilhante tanto interpretando como cantando e diretor de talento (Zé Henrique de Paula) que sabe harmonizar todos esses elementos.
Dispensa-se cenários grandiosos com escadaria, figurinos luxuosos e elenco numeroso, concentrando-se em contar a história de Bentinho e Capitu.
Rodrigo Mercadante tem a melhor interpretação de sua carreira narrando ou interpretando Bentinho com todas nuances e dubiedades requeridas por esse personagem icônico de Machado de Assis. Um trabalho digno de ser lembrado nas listas dos melhores do ano
Egresso da Banca dos Corações Partidos e muito bem-vindo aos palcos paulistanos Fábio Enriquez brilha como José Dias e dá um show de talento na cena sobre São Paulo.
Luci Salutes compõe uma Capitu delicada e sabe dar seu recado na cena que acontece após os aplausos.
Cleomácio Inácio como Escobar, marca mais um gol em seu trajeto, ainda curto, pelos palcos paulistanos.
Nábia Villela enriquece todos os espetáculos em que participa, mesmo que seu papel seja pequeno, como é o caso de Dona Glória, mãe de Bentinho.
Eduardo Leão interpreta Tio Cosme e Larissa Carneiro tem grande empatia com o público tanto como a velha prima Justina como a jovem Sancha.
Completam o quadro os músicos Guilherme Gila, Daniel Alfaro, Felipe Parisi e Samir Alves.
Cabe ainda destacar a iluminação de Fran Barros que cobre de vermelho todas as cenas de ciúme e de desconfiança de traição de Bentinho.
É com muito entusiasmo que recomendo esse espetáculo que tem lotado o Teatro Estúdio mesmo sem a divulgação merecida.
Parabéns aos jovens idealizadores do projeto (A Casa Que Fala e Tomate Produções), o futuro do teatro paulistano está nas mãos deles.
DOM CASMURRO está em cartaz no Teatro Estúdio às segundas, terças e quartas às 20h.
CORRA PARA VER!!!
20/11/2024