A “Companhia Teatro Esplendor” do Rio de Janeiro para comemorar seus 15 anos de existência resolveu montar um clássico do teatro francês escrito em meados do século XVII: Tartufo de Molière (1622-1673).
Nos ensaios o diretor Bruce Gomlevsky propôs ao grupo que improvisasse as cenas sem se ater ao texto escrito, recurso bastante usado nesse estágio do processo criativo.
Algo que ninguém esperava é que essas improvisações evoluíram de tal maneira que estavam superando o que poderia resultar em uma montagem tradicional.
Só a magia do teatro e o talento e a criatividade daqueles que o fazem podem explicar o resultado arrebatador desse processo: UM TARTUFO!
Gomlevsky transformou um clássico em um dos espetáculos mais radicais e contemporâneos que os nossos palcos já viram, sem ser infiel ao conteúdo original, mas recriando-o e atualizando deixando claro os perigos do fanatismo e da crença em falsos mitos ,tão em voga no Brasil de hoje.
O impacto visual do início remete às encenações de Tadeuz Kantor (em especial a “A Nossa Classe”) para enveredar, a seguir, para o expressionismo alemão. estética que acompanha todo o espetáculo, nas cores dos figurinos, do cenário e na caracterização do elenco. A potência da encenação é reforçada pela trilha sonora realizada a partir das músicas do compositor esloveno Borut Krzisnik que evolui junto com a movimentação corporal precisa do elenco. O resultado é eletrizante.
A história do fanático e servil Orgonte e do seu explorador, o falso monge Tartufo, é contada sem uma única palavra e torna-se compreensível mesmo para quem não conhece o original de Molière.
Em uma coreografia precisa e harmônica o elenco movimenta-se no palco de maneira brilhante.
Pela importância dos papéis de Orgonte (Gustavo Damasceno que já havia interpretado “Outra Revolução dos Bichos”) e de Tartufo (impressionante caracterização de Yasmin Gomlevsky) tornam-se os destaques, mas é importante ressaltar a excelência de Thiago Guerrante, Ricardo Lopes, Victoria Reis, Glauce Guima, Lucas Garbois e Gustavo Luz nos demais papéis.
“Um Tartufo” não é apenas para ser recomendado pelas suas inúmeras qualidades, mas para alertar que se trata de uma experiência poucas vezes vista em nossos palcos e que deve obrigatoriamente ser vista por aqueles que se interessam pelos possíveis caminhos das artes cênicas.
A peça cumpriu uma curta temporada em quatro fins de semana no Teatro D Jaraguá, mas urge que volte ao cartaz em São Paulo pelo seu alto valor artístico e renovador.
31/03/2025