domingo, 29 de setembro de 2024

PARA MARIELA

 


 

O Sobrevento reinventa os tempos de delicadeza 

Parafraseando o Seu Bertolt: Eu vivo nas cidades nos tempos de guerra, insegurança e violência. Eu vivo num tempo sem sol.

As pessoas andam tristes, cabisbaixas e olhando para o próprio umbigo em um individualismo assustador.

Mais ou menos nesse estado de espírito percorrendo de Uber essa cidade da qual restará apenas o vento que por ela perpassa (olha o Brecht de novo) chega-se ao aconchegante Espaço Sobrevento que fica muito perto do tenebroso templo de Salomão.

Crianças circulam brincando na frente do teatro e um público bastante simples aguarda o início do espetáculo Para Mariela, concebido, dirigido e interpretado pelo casal fundador do grupo há 38 anos, Sandra Vargas e Luiz André Cherubini.

O espaço cênico foi reformulado para o espetáculo: a plateia fica em volta de uma plataforma retangular coberta de areia que será o cenário do espetáculo.

Os atores vestindo macacões, no bolso dos quais vão tirando objetos que farão parte da cena, iniciam histórias que rememoram a infância passada na zona rural de um país. Boa parte dessas histórias foi recolhida pelo grupo com as crianças bolivianas que moram nas imediações do teatro. Ao formatar casinhas com a areia da plataforma eles vão construindo uma cidade em clima que lembra uma atmosfera tchekoviana com longos silêncios e gestos lentos. Cabe notar que a grande quantidade de crianças presentes acompanha as cenas com muita atenção e em silêncio.

Os mais variados objetos vão surgindo em cena, material extremamente lúdico cuja manipulação é uma característica do teatro de objetos do Sobrevento.

Em clima nostálgico um homem comenta sobre a vontade de ver o mar que inexiste na Bolívia, o grupo canta uma canção enquanto há um desfile de objetos que podem ser encontrados no mar.

De repente, explode uma canção boliviana que vira o jogo do clima silencioso e meditativo para um clima de festa com desfile de máscaras e tipos do folclore bolivariano. A participação das crianças da plateia é a coisa mais emocionante desse momento que cada um de nós sente um lampejo de esperança no futuro.

Certas cenas da peça me lembraram o bonito texto de Eduardo Galeano sobre um menino que não conhecia o mar e foi com o pai até ele. Ao chegar o menino deslumbrado com aquela magnitude e beleza olhou para o pai e disse: “Por favor pai, me ajude a olhar.” E é isso que o espetáculo faz, nos ajuda a sentir a vida com mais paciência e mais esperança. Viva o Sobrevento! 

PARA MARIELA está em cartaz de sexta a segunda às 20h até 14 de outubro. Ingressos grátis - reservas no email: info@sobrevento.com.br 

29/09/2024

 

 

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