segunda-feira, 15 de dezembro de 2025

ETIQUETA DO LUTO – Ninguém pergunta nada à mãe da menina morta

 

                    
 

“Minha filha sonhava em ser atriz, e de alguma forma, estar novamente no palco é também um reencontro com ela”

(Daniele Tavares)

À primeira vista pode parecer que se trata de mais um monólogo voltado para o umbigo da intérprete onde ela discorre sobre os dramas que sofreu na vida. “Etiqueta do Luto” poderia até ser isso, mas é MUITO MAIS DO QUE ISSO.

Com uma dramaturgia consistente preparada por Marcelo Varzea, Mariela Lamberti e Bruno Rods a partir do texto de Daniele Tavares e a interpretação iluminada de Daniele, estamos diante de uma tragédia que se anunciou, mas Daniele não percebeu e que se traduziu cenicamente em um dos espetáculos mais pungentes do ano.

Basta uma cadeira em cena e um desenho de luz magnífico de Vini Kedi que direciona a atriz por todo o espaço cênico para Daniele Tavares demonstrar que os trinta anos em que esteve fora do palco não arranharam o seu talento e sua empatia com o público.

A direção de Marcelo Varzea é enxuta e bastante fiel aos preceitos do Teatro Essencial.

Alguns trabalhos apresentados nos últimos tempos foram tema de assuntos parecidos como a minissérie “Adolescência” (os males das redes sociais) e a peça “O Filho” (problemas de saúde mental), mas nenhum deles tratou o assunto de maneira tão envolvente e corajosa como Daniele Tavares o fez ao expor no palco o quanto, talvez – tem sempre um talvez- ela pudesse ter dado mais importância àquilo que foi destruindo sua filha à sua vista e ela não percebeu. De qualquer maneira fica claro em todas essas narrativas que o quarto dos jovens encerra mais perigos do que pode imaginar nossa vã realidade. (Obrigado, Shakespeare).

O que levou aquela moça bonita de narizinho arrebitado, boa saúde, sem maiores problemas financeiros, com vontade de ser atriz e bem relacionada com sua família (pai, mãe e irmão) a iniciar um processo de autodestruição que culminou com sua morte aos 21 anos?

Essa é uma pergunta que acompanha Daniele desde a morte da menina e ela até tenta algumas respostas ao final do espetáculo.

Em determinado momento da peça a atriz passa o microfone para o público e ao ser arguida se essas apresentações onde ela reabre a ferida a cada vez não lhe fazem mal, ela respondeu que sente isso como um dever ao jogar para o público esse grito de alerta para que se preste atenção ao desenvolvimento dos jovens. Essa atenção pode salvar uma vida, algo que não aconteceu com a de sua filha.

Daniele também sentiu que durante muito tempo amigos, familiares e conhecidos evitaram falar sobre o acontecido e isso lhe fez muito mal e o teatro talvez tenha siso a maneira dela fazer o grande desabafo publicamente.

O tema é espinhoso e Daniele não se furta a pisar nos espinhos para oferecer ao público uma das interpretações mais autênticas e viscerais desta temporada, mas o seu talento transcende o tema e ainda iremos presenciar novos trabalhos onde ela vai mostrar tudo aquilo de que uma grande artista é capaz!

Fotos de Jukio Arakack 

ETIQUETA DO LUTO tem sua última apresentação de 2025 nesta segunda, dia15, mas volta ao cartaz de 10 de janeiro a 2 de fevereiro no Teatro Pequeno Ato aos sábados e segundas às 20h e aos domingos às 19h.

ABSOLUTAMENTE IMPERDÍVEL! 

No melhor estilo de teatro documentário deverão ocorrer algumas sessões em 2026 em que a atriz Veronica Nobili interpretará Daniele Tavares como personagem. Isso promete! 

14/12/2025





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