quarta-feira, 25 de junho de 2025

A MÉDICA

 

 

Dra Ruth Wolff é uma médica de origem judaica, sem religião, que dirige com mãos firmes uma clínica para pacientes de Alzheimer. Rígida em seus princípios e ciente de sua capacidade, a doutora sofre um revés em sua vida profissional e pessoal ao impedir que um padre católico entre em um quarto para dar a extrema unção a uma jovem agonizante.

A peça do dramaturgo britânico Robert Icke (1986-) é inspirada em “Professor Bernhardi” do escritor vienense Arthur Schnitzler (1862-1931). O início das duas peças é semelhante, mas enquanto “Professor Bernhardi” coloca em xeque apenas o antissemitismo, “A Médica” vai além, expandindo os preconceitos para aqueles de gênero, sexo e também raça.

A peça apresentada pelo “Círculo de Atores” usa a ótima tradução de Diego Teza e é dirigida de forma clara e lucida por Nelson Baskerville.

A primeira parte da peça tem um ritmo frenético com a discussão entre os médicos da clínica de como tratar as repercussões negativas do caso, a movimento dos atores em cena é um espetáculo à parte.

No terço final surge um programa televisivo tipo “Roda Viva”, onde a doutora é bombardeada com questões sobre o acontecido, além de cenas domésticas da doutora, onde se revela sua opção sexual. Há uma visível queda de ritmo nesta parte final.

O elenco afinado garante a qualidade do espetáculo. Adriana Lessa e César Mello têm brilhantes momentos na defesa da doutora; Anderson Müller e Sergio Mastropasqua atuam com autoridade como opositores; Thalles Cabral é uma ótima revelação como o estagiário; Luisa Silva está bem como a secretária Rebeca; Cella Azevedo garante alguns momentos de descontração e humor como Sami; Chris Couto interpreta a companheira Cacá de Ruth com dignidade; Isabella Lemos adota a altivez e a autoridade da Ministra Kênia e Kiko Marques empresta seu talento tanto como o Padre José como o pai da menina morta.

Todos holofotes vão para Clara Carvalho em uma guinada em sua gloriosa carreira ao interpretar uma mulher de pulso firme e irreversível em suas decisões e pontos de vista.  Clara que já deu provas de talento como tradutora e diretora, agora surpreende como atriz em uma outra chave interpretativa bastante diferente daquela que já estávamos acostumados.

Apesar de suas ações radicais, Icke trata Ruth como a heroína da trama sem questionar essa posição e coloca os opositores como vilões, algo que diminui a abrangência da peça.  

A produção se completa com os talentos de Marisa Bentivegna na criação de cenário propositalmente frio com módulos de paredes transparentes que se movem nas mudanças de cena; de Marichilene Artisevskis (figurinos); de Wagner Freire (iluminação); de “Um Cafofo” (direção de imagem).

Destaque especial para a trilha sonora composta por Gregory Slivar e executada ao vivo por ele e Edézio Aragão.

Saindo das peças de Bernard Shaw, o Círculo de Atores se volta para outro baluarte do teatro internacional.

A MÉDICA está em cartaz no auditório do MASP. Sexta e sábado 20h. Domingo 18h 

24/06/2025

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