Quantos Joãos são necessários para
conceber um Severino?
Muitos Joãos, Pedros, Josés e até
Severinos devem ter cruzado o caminho de João Cabral de Melo Neto (1920-1999),
poeta e diplomata pernambucano, para inspira-lo na criação de personagens
sofridas do sertão nordestino, sendo Severino do poema “Morte e Vida Severina”
a mais famosa.
Marcelo Marcus Fonseca, dramaturgo do
espetáculo, condensa todas essas inspirações em uma única personagem de nome
João, que está migrando para o sul com a cara e a coragem. No encontro com o
poeta surgem os primeiros belos diálogos da peça.
João Cabral segue sua carreira de
escritor enquanto João - só João - vai para o Sul Maravilha onde se engaja com
Gaivota, uma travesti valente, mas muito carinhosa. A vida urbana não é fácil e
o casal acaba sucumbindo à especulação imobiliária.
João Cabral, João e Gaivota são os pilares do
espetáculo e são defendidos com muita garra por Vitor Vieira, Dudu Galvão e
Mattilla, respectivamente.
Vitor empresta seu conhecido talento para criar um João Cabral nobre e até meio esnobe na sua altivez, Dudu tem graça e singeleza como o inocente João e Mattilla é um verdadeiro furacão em cena com uma interpretação que tira do chão e deslumbra o espectador, algo de que só a verdadeira arte é capaz. Curiosamente, Mattilla só entrou na montagem às vésperas da estreia, para substituir Marina Mathey que teve que passar por um procedimento cirúrgico.
O musical “João” tem bela e até
sofisticada tradução cênica de Kleber Montanheiro que utiliza os quatro cantos
da Cia da Revista como cenário.
A luz (Gabriele Souza), os figurinos
(Marcos Valadão) e o visagismo (Louise Helène) colaboram harmoniosamente com a
direção.
João Cabral, tão avesso à música,
ficaria encantado com as canções criadas por Marco França e tão bem letradas
por Vitor Rocha. Diga-se de passagem, que ele já deve ter se encantado em 1965
quando o jovem Chico Buarque musicou seu poema “Morte e Vida Severina” na
montagem do TUCA dirigida por Silney Siqueira.
O elenco de apoio também é muito bom,
com destaque para Bia Rezi, encantadora presença cênica.
Uma ressalva: Apesar do elenco estar
micro fonado e do espaço não ser muito grande, o espetáculo acontece em volume
muito alto, algo que chega a prejudicar a fruição do mesmo.
A sala de espera da Cia da Revista
está decorada com figurinos e cenas dos espetáculos de Kleber Montanheiro.
Fotos de Edgar Machado
JOÃO está em cartaz no Espaço Cia da Revista de sexta a domingo às 20h até 03 de agosto.
23/06/2025
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