sábado, 5 de setembro de 2015

BONECAS QUEBRADAS



ASSIM RASTEJA A HUMANIDADE
 
 

         Impossível não se indignar e não ficar com um nó na garganta diante dos fatos relatados no espetáculo Bonecas Quebradas em cartaz só até domingo no Itaú Cultural: o assassinato cruel de jovens mexicanas pobres, a maioria de origem indígena, que após serem violentadas e torturadas são mortas e, não satisfeitos, os seus carrascos ainda as estraçalham, jogando pedaços de seus corpos nas areias do deserto.  Esses verdadeiros restos que dificultam a identificação das vítimas se assemelham a bonecas quebradas e às vezes são reconhecidos pelos familiares por um pedaço de vestido ou por uma pasta escolar que a menina portava quando foi assediada pelos bandidos. Para dramatizar esses fatos a equipe do espetáculo foi ao México e fez extensa pesquisa que resultou no pungente retrato apresentado ao público.
         A encenação de Verônica Fabrini começa de forma singela com uma atriz contando o trajeto que uma menina faz de sua casa para o trabalho ou do trabalho para a escola. Percursos feitos diariamente por cada um de nós e por nossos filhos. Mas os monstros estão à espreita, prontos para atacar e um percurso,agora de vida, pode estar sendo interrompido a partir daquele momento. Devidamente preparado para a violência que está por vir o público adentra o espaço cênico que tem ao fundo lençóis estendidos, bonecos pendurados no teto e a areia do deserto como chão.
         Usando imagens projetadas no fundo branco e no chão, depoimentos em telas de TV, canções indígenas e o talento das três atrizes a encenadora mostra toda essa barbárie de forma lúdica e poética ocasionando indignação sim, mas também fazendo o público refletir sobre esse momento sombrio por que passa a assim chamada humanidade. Impossível não expandir a indignação para a violência com as mulheres brasileiras, assim como, com os homossexuais e com aqueles que têm uma posição política diferente da sua. O ódio está presente na maioria das relações e o poder do dinheiro e do capitalismo selvagem resultam no menino morto naquela praia onde ele poderia estar brincando com seu baldinho de areia. A montagem de Bonecas Quebradas nos faz pensar sobre tudo isso.
         A dramaturgia bem amarrada do espetáculo é assinada por João das Neves e foi realizada em processo colaborativo com a diretora e as atrizes.
         É um grande prazer ver Isa Kopelman de volta aos palcos de São Paulo. Atriz de grande versatilidade que demonstrava grande potencial nos anos 1980, mas, ao que eu saiba se afastou dos palcos para lecionar na Unicamp.  Sua atuação como uma das gêmeas com um imenso laço de fita em A Aurora da Minha Vida -1981- é uma daquelas coisas que a memória insiste em manter em nossa cabeça. Em Bonecas Quebradas Isa tem momentos emocionantes como a mãe que procura em vão pela filha que desapareceu. Luciana Mitkiewicz sai-se bem tanto como uma das meninas que vai desaparecer como uma miss vulgar, protótipo do objeto a ser manipulado pelo macho. Finalmente Lígia Tourinho: torrente de emoções em cena, seu desempenho visceral com gestual e voz de alta potência não deixa o público desviar o olhar sobre ela.

         A lamentar a curtíssima temporada (apenas quatro apresentações) de espetáculo tão importante e oportuno para o momento em que vivemos. AINDA HÁ TEMPO ESPECTADORES: Hoje sábado (05/09) às 21h e amanhã domingo (06/09) ás 19h no Itaú Cultural. Ingressos gratuitos a serem retirados 30 minutos antes do espetáculo.

05/09/2015

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