Quantas vezes nos
pegamos falando com o bichinho de estimação, trocando ideias com uma pessoa
imaginária ou até preparando a mesa do jantar com velas e vários lugares quando
sabemos que iremos comer sozinhos. Vontade
de compartilhar uma alegria ou uma tristeza, mas uma ausência muito presente
nos traz de volta à realidade. A peça Ausência
da dupla André Curti e Artur Ribeiro da Cia. Dos à Deux nos mostra um caso
desses numa situação limite que se passa num futuro (2036) mais tenebroso que o
nosso presente onde a falta de amigos é acompanhada da escassez de água e de
alimentos e só os ratos marcam uma presença constante. A carente personagem só
pode externar sua afetividade para com um peixinho, o qual no final da ação
será sacrificado para que a água do seu aquário sacie a sede do pobre
protagonista. As entranhas da solidão são mostradas por meio desse homem triste
e solitário cujo único contato com a vida é esse peixinho que vai morrer para
que ele sobreviva por mais algum tempo.
A encenação é primorosa desde o sugestivo cenário de
Fernando Mello da Costa constituído de tubulações e de sucata de objetos
metálicos cada um deles com funções bem definidas dentro da ação, passando pela
iluminação perfeita com claro-escuros e luzes tênues e focadas em pequenos
espaços de autoria de PH e Artur Ribeiro. A trilha sonora composta
especialmente para o espetáculo por Fernando Mota completa o clima
claustrofóbico e solitário proposto pela encenação.
Por último, mas tão importante quanto, a interpretação
despojada de Luís Melo que entrega todo seu talento à proposta dos encenadores
vivendo visceralmente e com gestos
precisos uma personagem que não tem sequer uma fala.
O peixinho morre, os ratos continuam a chegar, mas sentado à
janela talvez o solitário ainda vislumbre alguma esperança. Espetáculo pungente
e desde já presente na lista dos melhores do ano.
“A arte tem de ter algo que me tira do chão e deslumbra”, a
frase de Ferreira Gullar cabe perfeitamente neste triste, mas necessário
espetáculo. IMPERDÍVEL!
Ausência está em
cartaz no Sesc Ipiranga aos sábados às 21h e aos domingos às 18h até o dia 28
de julho.
Um espetáculo que mostra a aridez da solidão, tocante. Digno de ser visto mais de uma vez. E que trabalho de ator e direção!
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