terça-feira, 24 de setembro de 2013

OS GIGANTES DA MONTANHA


O cenário de Gabriel Villela, Helvécio Izabel e Amanda Gomes.
 

     Um calor incomum para esta época do ano assolou São Paulo durante o dia do último sábado e a noite prometia ser quente e com lua cheia. Com muita expectativa me dirigi para o Parque da Independência para assistir ao novo trabalho do sempre bem vindo Grupo Galpão de Belo Horizonte. Escadaria repleta de gente e o palco iluminado e enriquecido com os adereços para o espetáculo. Músicas ditas bregas, ecoavam de um alto falante com som estridente. Num piscar de olhos um forte vento tomou conta do pedaço fazendo tremer os penduricalhos inventados por Gabriel Villela, obrigando os contrarregras a recolher parte deles. Perigo à vista: Chuva? Possibilidade de suspensão do espetáculo? O vento diminuiu, apesar de ainda tremular de maneira muito bonita as cortinas do cenário e às 20h30 com um prólogo de Teuda Bara teve início o esperado Os Gigantes da Montanha.
 Desta cidade restará apenas o vento que por ela perpassa                         (Bertolt Brecht)
 
 
     O dramaturgo italiano Luigi Pirandello (1867-1936) trabalhou cerca de oito anos nesta obra que permaneceu inacabada e cujo terceiro ato tem apenas um esboço ditado em seu leito de morte ao seu filho Stefano. A peça apresenta imensas dificuldades tanto cênicas como dramáticas e havia uma grande curiosidade sobre a maneira como Villela trabalharia essas dificuldades num espetáculo de rua.
 
 
     Com o auxílio do espírito do Galpão, o encenador conseguiu transformar o complexo e belo texto de Pirandello num divertido espetáculo popular, sem, no entanto, abdicar dos temas importantes tratados no original: teatro, magia, realidade e, principalmente, as dificuldades de fazer e comunicar arte para um mundo hostil e material. As cenas são ilustradas com músicas do cancioneiro popular italiano que se encaixam perfeitamente à trama; o melhor exemplo disso é a cena do suicídio da personagem Spizzi, onde ele canta Ciao, amore, ciao. Diga-se que a preparação vocal do elenco (Babaya)está perfeita .
     Evitando uma excessiva duração e também cenas de complexa tradução cênica, o diretor optou por usar o recurso de narrar alguns trechos da peça. Foi utilizada a ótima tradução de Beti Rabetti, a mesma usada em 1991 na encenação carioca de Moacyr Góes.
     Tive o privilégio de ver Cleyde Yáconis e Ziembinsky em 1969 numa equivocada montagem do italiano Federico Pietrabruna. Inês Peixoto e Eduardo Moreira são desta vez os intérpretes da Condessa Ilse e do mago Cotrone e brilham nos papéis. Todo o elenco está ótimo com destaque para Antonio Edson (um levíssimo Cromo) e Arildo Barros (Conde). Paulo André é responsável por bons momentos cômicos como o/a hilário/a Batalha.
Inês Peixoto, a Condessa Ilse.
 
     A solução encontrada por Gabriel Villela para o desfecho é engenhosa mostrando Pirandello em cena escrevendo o final do segundo ato e as últimas palavras do mesmo que são ditas pela personagem Diamante “Eu tenho medo! Eu tenho medo!”. A seguir num tipo de teatro de sombras ele mostra o que teria acontecido para a Condessa na apresentação da peça A Fábula do Filho Trocado (peça dentro da peça) para o povo dos gigantes. Esse último momento é baseado nas indicações que o autor fez ao seu filho, como já citado acima.

 
 
 
     Belíssimo espetáculo com claras referências às dificuldades de se fazer bom teatro no Brasil. Deixa-se o espaço com a alma alimentada.

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