Texto,
interpretações, cenário, iluminação, trilha sonora, imagens projetadas; toda
essa excelência harmonizada pelo toque de mestre do diretor Kiko Marques.
Talvez
essa frase coubesse melhor ao final desta matéria, mas quero iniciar enfatizando
como é uniforme este espetáculo em todos os aspectos que compõem uma montagem
teatral.
A
guerreira e talentosa Dinah Feldman é a realizadora do projeto inspirado em
fatos ocorridos com pais e avós de seu primo William Jedwab. Ao tratar mais uma
vez do holocausto (de forma bastante original, é bom ressaltar), a peça
transcende a questão judaica e enfatiza que lembrar é preciso, pois a extrema
direita está à espreita a espera de qualquer brecha para voltar ao poder.
A
confecção do texto foi entregue à dramaturga Nanna de Castro (autora do
inesquecível Novelo, que merecia uma nova montagem). O resultado, misto
de fatos reais e ficção é brilhante e os diálogos fluem naturalmente,
carregados de verdade e de humanidade. A autora, auxiliada pela direção de Kiko
Marques e pela interpretação de Noemi Marinho, soube contornar os perigos da
peça cair em um melodrama piegas.
A
envolvente trilha sonora composta por Gregory Slivar é baseada em canções da
música judaica e colaboram para o envolvimento do espectador na ação.
O
cenário de Márcio Medina é composto de dois praticáveis onde estão dois
quartos. Na parte livre do palco desenvolve-se as outras ações da peça.
Iluminação discreta e eficiente de Wagner Pinto.
André
Grynwask e Pri Argoud voltam a brilhar com as poderosas imagens projetadas no
telão ao fundo do palco. Fotos de família e imagens destorcidas das cidades
arrasadas pelas guerras compõem esse mosaico que ilustra o tema da peça.
Os
figurinos em tons cinza de João Pimenta revelam o espírito dos personagens.
Apenas a cuidadora Ruth tem vestimentas mais leves e coloridas.
Resta
escrever sobre o elenco! Coisa fácil quando se está diante de tanto talento. A
peça gira em torno de quatro personagens: Samuel, o jornalista que volta de
Israel com muitas dúvidas sobre o passado da família; seu pai Franz já falecido;
sua avó Esther de 92 anos, última sobrevivente e detentora do passado e Ruth, a
cuidadora de Esther. A trama circula entre o passado e o presente de forma
bastante fluida e entendível.
Fabio
Herford, em seu bem-vindo retorno ao teatro representa o atormentado Franz.
Dinah
Feldman reserva-se um papel quase secundário como a cuidadora Ruth e o faz com
muito talento e dignidade.
Emílio
de Mello, outro auspicioso retorno aos palcos paulistanos, encarrega-se de
maneira brilhante do personagem de Samuel. Sua dicção perfeita e seus diálogos
com a avó são inesquecíveis.
Todas
as honras para Noemi Marinho como a idosa Esther. A composição da atriz é
emocionante, mantendo sempre a pronúncia judaica, circulando entre a lucidez e
a demência e também adquirindo posturas distintas nas diferentes idades
exigidas pela trama. Noemi, além de tudo, dá toques de humor aos momentos
dramáticos, fazendo o público rir e se emocionar ao mesmo tempo. Trata-se a meu
ver da melhor interpretação dessa grande atriz que com certeza estará na lista
das indicadas aos prêmios de interpretação feminina do ano.
E
como foi dito no início, Kiko Marques rege todo esse talento que resulta em um
momento raro do nosso teatro.
Assiste-se
ao espetáculo de hora e meia sem um piscar de olhos e estes marejam-se no final
surpreendente e emocionante que justifica o título do mesmo.
Completam
essa excelência o visagismo de Louise Helène, as fotos de João Caldas e a
perfeita direção de produção da incansável e entusiasmada Marcela Horta.
Foi
realizado um robusto programa de 84 páginas com informações importantíssimas e
belas fotos que, infelizmente, só está disponível virtualmente.
Parabéns à Dinah Feldman pela realização desse belíssimo projeto.
O
VAZIO NA MALA está em cartaz no Centro Cultural FIESP até 30 de junho, de
quinta a sábado às 20h e domingos às 19h. Ingressos gratuitos.
Conselho: A temporada é longa, mas não deixe para o final, porque com certeza você vai querer ver de novo. É IMPERDÍVEL!!
01/04/2024
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