sábado, 18 de outubro de 2014

ILHADA EM MIM - SYLVIA PLATH



        Eu queria ter veia poética para poder traduzir com palavras adequadas todas as sensações que tive ao assistir Ilhada em Mim em cartaz no auditório do Sesc Pinheiro. A encenação de André Guerreiro Lopes é absolutamente sensitiva e fica difícil escrever sobre ela de maneira racional, mas  vou tentar!
     Era muito importante contextualizar a obra e a vida da poetisa americana Sylvia Plath (1932-1963) e de seu companheiro, também poeta Ted Hughes (1930-1998) para o espectador adentrar no universo do casal; tal fato se apresentado de forma realista iria totalmente contra o viés poético que André Guerreiro Lopes concebeu para o espetáculo e a solução encontrada não poderia ser mais bela: com a presença semi estática do casal numa cena onde a água está presente no chão e nos pingos que gotejam de objetos de gelo, ouve-se uma entrevista original que Sylvia e Ted deram para a BBC no início dos anos 1960. O que se ouve (uma conversa suave sobre como se conheceram) contrasta com as ações ao vivo onde as expressões de Sylvia revelam a angústia que irá permear toda a peça e aquelas de Ted já demonstram sua indiferença e sentimento de superioridade em relação a ela. Dessa maneira o publico tem informações suficientes para o que vem a seguir.
     Em um artigo de Rodrigo Garcia Lopes sobre a poetisa, há a citação de uma frase do poeta russo Ievguêni Ievtuchenko (1933-) que diz: “A autobiografia de um poeta é sua poesia. O resto não passa de nota de rodapé”. O encenador, conhecedor ou não dessa frase, segue a mesma linha de pensamento na realização do seu espetáculo. Se não são as poesias, são frases ditas por Plath que compõem o texto costurado por Gabriela Mellão e tão bem traduzido cenicamente por Guerreiro Lopes.
 
 
     Essa tradução cênica revela-se no cenário  cheio de metáforas como a água que pinga dos objetos de gelo (A vida que se esvai? O tempo que passa?), cadeiras e sofás semi enterrados, a água que envolve a cena e que pode ser tanto sinal de vida como de morte (o gás que matou Sylvia). Aqui sinto falta daquele pendor poético citado acima para poder significar todas as sensações produzidas pelo cenário, parte integrante e fundamental da dramaturgia de cena.
     Aliem-se ao cenário, o precioso desenho de luz de Marcelo Lazzaratto e a significativa trilha sonora de Gregory Slivar.
 
 
     E por último... OS ATORES! André Guerreiro Lopes compõe um Ted arrogante e senhor de si que destrói escritos da companheira com prazer insuportável (momento excelente do espetáculo onde os efeitos sonoros sincronizados com o amassar dos papéis ampliam os gestos do ator). Djin Sganzerla, pessoa delicada e singela dotada de grande beleza, adquire em cena a máscara trágica de Sylvia Plath em seus últimos dias de vida e que expressa sua angústia interior, suas fraquezas e sua dependência e amor por um homem que só a diminuiu e desprezou.
     Ilhada em Mim revela-se um belo momento do teatro, onde a poesia sobe à cena para contar um pouco sobre Sylvia Plath, por meio da memorável interpretação de Djin Sganzerla  e da sensível e poética direção de André Guerreiro Lopes.
     Ah! Se eu fosse poeta escreveria muito mais...
 
     Auditório do Sesc Pinheiros. De quinta a sábado às 20h30. Até 01 de novembro.
 
     FOTOS DE LENISE PINHEIRO

Nenhum comentário:

Postar um comentário