segunda-feira, 10 de novembro de 2014

KARAMÁZOV- ESPETÁCULO OBRIGATÓRIO


Dostoiévski
 
         O espetáculo Karamázov dirigido por Ruy Cortez em cartaz na SP Escola de Teatro é formado por três partes independentes, mas complementares que podem ser assistidas em sequência ou em dias alternados. Escolhi a primeira opção e julgo que desse modo há uma melhor fruição do todo. Trata-se da adaptação de um conto e do romance Os Irmãos Karamázov de Dostoiévski (1821-1881) realizada a quatro mãos por Luís Alberto de Abreu e Calixto de Inhamuns.

         A primeira parte, Uma Anedota Suja, baseia-se no conto Uma História Lamentável de 1862 onde o autor satiriza os pseudo-humanistas por meio de um general que se diz liberal e que com o intuito de ser simpático invade a festa de casamento de um subordinado, homem do povo simples. Os ótimos atores/músicos Jean Pierre Kaletrianos e Rafael Steinhauser narram e interpretam as personagens da trama.
 

         Os Irmãos. Nesta segunda parte está a trama central do romance de Dostoiévski: a conturbada relação do pai (Fiódor) com os quatro filhos (Dmitri, Ivan, Aliócha e o bastardo Smierdiakóv). O romance é o último escrito (1880) pelo grande autor russo e tem cerca de 1000 páginas. O desafio dos adaptadores foi sintetizar esse monumento literário num espetáculo de três horas composto pelas segunda e terceira partes de Karamázov, para tanto fizeram uso intenso da narração em relação à dramatização. Por outro lado, quiseram manter (e entende-se porque, pois são belíssimos) alguns trechos que não compõem a trama central como as histórias contadas por Ivan ao irmão Aliócha sobre o grande inquisidor e sobre o garoto que é estraçalhado por cães a mando de um general e também o longo sonho místico de Aliócha; tudo isso  em detrimento de partes importantes como o julgamento de Dmitri e as relações com Cátia e Grúchenka).                                                                                                                                    Os quatro atores (Antonio Salvador, Eduardo Osorio, Marcos de Andrade e Ricardo Gelli) desdobram-se na narração da história e na interpretação das personagens masculinas. Vestidos com significativos ternos de duas cores (belo trabalho de Anne Cerutti) e fazendo uso de chapéus coco de cores diversas dão vida aos quatro irmãos e ao pai. Todos excelentes, suas interpretações são merecedoras de um prêmio coletivo.
 
 

         A direção de Ruy Cortez é objetiva e concentra-se na interpretação dos atores.
         O cenário de André Cortez inspirado na obra do pintor abstracionista russo Malevich (1879-1935) além da não funcional (os atores esbarram várias vezes nos fios e têm que se agachar para ajustar as partes) é, ao meu modo de ver, feio e ainda dificulta a visão do público quando uma incômoda parede separa as duas plateias. Espetáculo tão bem sucedido podia prescindir dessa parede, apesar de que o encenador deve ter suas razões filosóficas, psicológicas e cênicas para mantê-la.

 
         Os Meninos. A última e talvez a melhor realizada parte do espetáculo. Por se basear numa subtrama do livro a dificuldade dos adaptadores foi menor e pode contrabalancear melhor as partes narradas com as dramatizadas. Os quatro atores, antes com ternos de cores sombrias, agora usam ternos de duas cores claras, para contar as aventuras dos meninos Kólia e Iliúcha, este último, filho de um homem pobre chamado Snieguirióv que foi humilhado publicamente por Dmitri. Aliócha aproxima-se da família para tentar reparar o erro do irmão. Iliúcha fica doente e morre; a cena do seu enterro é uma das mais belas do espetáculo. Os atores interpretam várias personagens e só Antonio Salvador ainda aparece como Aliócha sendo responsável pelo comovente monólogo do final do espetáculo. O uso da parede nesta terceira parte é mais equilibrado, não prejudicando tanto a visibilidade do público.


         Pelo texto de Dostoiévski admiravelmente adaptado por Luís Alberto de Abreu e Calixto de Inhamuns, pela direção segura de Ruy Cortez e pelo magnífico trabalho dos atores, Karamázov é espetáculo imperdível que já ocupa seu lugar entre os melhores deste ano.
 
          Karamázov fica em cartaz às segundas, sextas, sábados e domingos na SP Escola de Teatro até 15 de dezembro.
 
           Fotos de Bob Sousa

Um comentário:

  1. Um texto de Dostoiévski, com adaptação dos grandes dramaturgos Luis Alberto de Abreu e Calixto de Inhamuns é de fato obrigatório. Quero ver novamente Os Irmãos.
    Nadya Milano

    ResponderExcluir