segunda-feira, 25 de abril de 2016

SALINA – A ÚLTIMA VÉRTEBRA


        O dramaturgo e romancista francês Laurent Gaudé escreveu Salina em 2003 e esta é a primeira montagem de um texto seu no Brasil. A iniciativa coube ao grupo carioca Amok Teatro liderado por Ana Teixeira e Stéphane Brodt que vem se especializando em espetáculos épicos de caráter étnico. Em 2007 tivemos a oportunidade de assisti-los com Savina ambientado no mundo cigano, depois disso o grupo criou a trilogia de guerra (O Dragão, Kabul e Histórias de Família) que não foi apresentada nos palcos paulistanos.
        Salina é uma epopeia africana com elementos de tragédia grega e essa mistura aparentemente estranha resultou em dos mais belos espetáculos apresentados em São Paulo nesta temporada. Conta a saga de Salina, jovem que por ser obrigada a casar com um homem a quem não ama desencadeia terrível onda de ódio e violência. Nesse aspecto a peça me lembrou de Abril Despedaçado, o filme de Walter Salles de 2002 baseado no romance homônimo de Ismail Kindaré, onde vingança gera ódio que gera morte que por sua vez gera vingança num circulo vicioso interminável; mas em Salina há redenção e perdão como se constata na comovente cena final onde também se justifica o sub título da peça.

Ariane Hime (Salina) - Foto de Daniel Barbosa

         A trama inicia com Salina, ainda uma jovem bonita e graciosa que ainda “não sangrou” e termina em sua velhice , quando já “não sangra” mais e está sofrida e desfigurada, exigindo um tour de force da atriz que a interpreta (Ariane Hime). O elenco, formado apenas por atores negros, surgiu a partir de oficina realizada em 2014 pelo Amok Teatro. Algumas interpretações são irregulares, sem, porém, comprometer o todo.  Cumpre destacar as interpretações da já citada Ariane Hime e de Tatiana Tiburcio, talvez a presença mais poderosa em cena com sua potente voz e perfeita dicção.

Tatiana Tiburcio (Khaya Djimba) - Foto de Daniel Barbosa

        A partir de pesquisas realizadas pelo grupo a narrativa é permeada por cantos e danças africanas sem jamais cair no aspecto meramente folclórico. Os coloridos e vistosos figurinos (Prêmio Shell nessa categoria no Rio de Janeiro em 2015) criados pela dupla de encenadores emolduram esses belos momentos do espetáculo.
        Sem maiores destaques na mídia paulistana o espetáculo cumpre temporada menor do que um mês no Sesc Belenzinho, a qual se encerra no próximo domingo, dia 1º de maio, o que é lastimável, pois trata-se de montagem digna que, além de valorizar o trabalho dos atores negros (tão carentes de protagonismo na cena teatral brasileira), conta uma bela história por meio de narrativa que mantém o espectador preso na poltrona durante as suas três horas de duração.
        Sábado e domingo às 18h no Sesc Belenzinho. IMPERDÍVEL.

25/04/2016

         

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