Certa vez conversando com o diretor do
Grupo TAPA, Eduardo Tolentino, ele me disse que gostaria muito de montar Agosto: Osage County do dramaturgo norte americano Tracy Letts, mas a peça exigia
a construção de cenário grandioso que representava em corte uma antiga casa do
sul dos Estados Unidos de três andares o que inviabilizava a produção por duas
razões: o alto custo e o uso exclusivo do palco do teatro durante toda a temporada
da peça, algo quase impossível nos dias de hoje, onde a maioria dos teatros
mais parece shopping centers com mais
de três peças simultaneamente em cartaz. Essa conversa ficou em minha memória
junto com o desejo de assistir à peça em nossos palcos, pois eu havia assistido
ao filme homônimo nela baseado, que no Brasil foi rebatizado como Álbum de Família, mesmo título da famosa
peça de Nelson Rodrigues.
Em 2017 eu soube que André Paes Leme
montava a peça no Rio de Janeiro tendo Guida Vianna à frente do elenco no papel
de Violet, personagem de Meryl Streep no filme citado acima. Impedido de ir até
o Rio persistiu a vontade de assistir ao espetáculo.
Eis que neste 12 de julho de 2018 a
montagem chegou a São Paulo no icônico Teatro Anchieta, palco, desde 1967, de
espetáculos tão importantes para o teatro brasileiro e todas as emoções que eu
acreditava que ia sentir, se concretizaram no espetáculo apresentado.
A montagem de André Paes Leme é
superlativa em toda a sua simplicidade, a partir do cenário. Segundo ele, as
necessidades oriundas de restrições de produção, o obrigaram a reduzir o cenário
a um palco nu, com alguns adereços e concentrar as mudanças de locais da ação na
iluminação (belíssimo trabalho de Renato Machado). Essa concepção fez com que o
encenador criativamente intercalasse ações e até falas, dando um frescor e uma
beleza ao trabalho, jamais imaginada, creio eu, nem pelo autor da peça, que
sempre teve a mesma encenada com cenários realistas. O cenário original é
descrito no início da peça pela empregada Johnna e está implícito em sua fala o
pedido famoso de Shakespeare na abertura de Henrique
IV, para que com o auxílio da imaginação o público “veja” os diversos
aposentos onde se passam as ações.
Nada contra as narrativas fragmentadas
surgidas após o advento do teatro pós-moderno, mas como é bom ouvir uma boa
história, desde que bem contada, dentro dos cânones da dramaturgia tradicional,
com começo, meio e fim e com diálogos fluentes e bem estruturados. E Tracy
Letts faz isso muito bem, como já tínhamos visto em Killer Joe (filme e peça aqui montada por Mário Bortolotto). Louve-se
a ótima tradução do texto realizada por Guilherme Siman, também presente no
elenco.
Letícia Isnard e Guida Vianna
O elenco de onze atores é ótimo e
homogêneo e a peça oferece momentos de destaque para cada personagem, mas não
há como salientar os papéis de Barbara e Violet, as verdadeiras protagonistas,
aqui vividas com muito brilho, respectivamente, por Letícia Isnard (atriz pouco
presente nos palcos paulistanos) e a talentosíssima Guida Vianna, que acompanho
desde 1981 quando assisti ao inesquecível Poleiro
dos Anjos, com o seu grupo Pessoal do
Cabaré, dirigido por Buza Ferraz.
Um aparte: Levei o programa de Poleiro dos Anjos para mostrar à Guida
Vianna e as fotos abaixo podem testemunhar a emoção e a alegria que tomou conta
de nós dois.
Esta é a foto de 1981 que estamos vendo. Guida Vianna está na frente, ao centro.
Voltando a Agosto: É um espetáculo
forte com dramaturgia consistente, tradução cênica criativa e bela,
interpretado por elenco talentoso e que desde já pode ser considerado um dos
melhores já apresentados em nossos palcos neste ano.
No programa, a idealizadora do projeto,
Maria Siman, inicia o seu texto com a frase “Gosto de histórias” e nada mais coerente
com esse pensamento o fato dela escolher para produzir o drama dessa família
disfuncional do árido sul dos Estados Unidos tão bem retratada no texto de
Tracy Letts.
As fortes emoções contidas nos 130
minutos de duração do espetáculo e a excelência do mesmo, assim como o precioso
trabalho de Guida Vianna e do elenco, fazem com que esse tempo passe em um piscar
de olhos e só nos traga de volta à realidade na ovação final. Além disso, com
certeza, você vai ver alguém de seu conhecimento retratado em uma das 12
personagens da peça.
AGOSTO está em cartaz no Teatro
Anchieta de quinta a sábado às 21h e domingo às 18h até 05/08/2018.
ABSOLUTAMENTE IMPERDÍVEL!
13/08/2018
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