MEMÓRIAS DE UM ESPECTADOR
PETER BROOK
(21-03-1925/02/07/2022)
No ano de 1967 eu era um jovem
estudante de engenharia que aproveitava avidamente as horas vagas para ir ao
teatro e não me alienar numa profissão que já se mostrava sufocante.
Acredito que eu gostava de teatro
desde a tenra idade quando assisti E a Faustina Derrapou, minha primeira
peça de circo-teatro, no circo do Piolin, no final dos anos 1950.
Minha jornada como espectador de
verdade começou no ano de 1964 e, eu diria, que começou muito bem pois até 1967
eu já havia assistido a Pequenos Burgueses no Teatro Oficina; Depois
da Queda de Arthur Miller com Maria Della Costa e Paulo Autran; Quem Tem
Medo de Virginia Woolf com Cacilda Becker, Walmor Chagas. Lilian
Lemmertz e Fulvio Stefanini; Morte e Vida Severina no recém criado TUCA;
Diário de Um Louco com Rubens Corrêa; A Megera Domada (meu
primeiro Antunes Filho!); Arena Conta Zumbi; A Alma Boa de Set-Suan
(o primeiro Brecht); Opinião e Liberdade, Liberdade. Esse repertório
de ouro foi meu batismo de fogo como espectador, mas ainda havia (e ainda há)
muito a aprender.
Em 1967 acontece um dos grandes
impactos que a vivência como espectador me trouxe: A Perseguição e o
Assassinato de Jean-Paul Marat Conforme Foram Encenados Pelos Enfermos do
Hospício de Charenton, Sob a Direção do Marques de Sade, popularmente
conhecida como Marat-Sade. A peça de Peter Weiss dirigida por Ademar
Guerra foi um dos grandes acontecimentos daquele ano sombrio, junto com Navalha
na Carne, O Homem do Princípio ao Fim (a primeira Fernanda
Montenegro) e, é claro, O Rei da Vela.
Após assistir a Marat-Sade
várias vezes, tomei conhecimento do filme do mesmo nome, dirigido pelo
encenador inglês Peter Brook. Outro impacto e a comprovação que a encenação
brasileira bebia em muitas das soluções cênicas adotadas por Brook.
Aguçada a curiosidade comecei a procurar mais
coisas sobre ele e no início do ano de 1970 é lançado no Brasil o livro O
Teatro e Seu Espaço (The Empty Space). Nessa época eu estava
envolvido com um grupo de teatro universitário, escrevendo, atuando e dirigindo
e o meu interesse pelo pensamento de Brook tornou-se ainda maior. Devorei o
livro e olhando hoje para suas páginas amareladas vejo as marcas que nele
deixei com observações e marcas nos trechos que mais me interessavam. O quanto
utilizei de seus sábios relatos nesses trabalhos, eu não sei avaliar, mas de
uma lição jamais vou esquecer: “A play is play, uma peça é um jogo,
representar é uma brincadeira”, frase icônica que fecha o livro.
No ano de 1975, em visita a Paris,
tive o privilégio de assistir Timon de Atenas, dirigido por Brook, no
recém inaugurado Théâtre des Bouffes du Nord (na verdade, um espaço em ruínas
abandonado há mais de 25 anos, restaurado para abrigar a companhia de Brook).
Na noite em que a Vera e eu assistimos ao espetáculo, um simpático e acessível Brook
(na época avaliei que ele devia ter aproximadamente 50 anos e acertei em
cheio!).
Nunca mais voltei a fazer teatro, mas
minha vida de espectador só aumentou e o interesse pela obra de Brook continuou
cada vez maior lendo seus inúmeros escritos, assistindo a seus filmes e às suas
montagens, que por obra e graça do SESC chegaram até nós: A Tragédia de
Hamlet (2002), Tierno Bokar (2004), Sizwe Banzi Est Mort
(2006) e Fragments (2008).
03/07/2022
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