quarta-feira, 2 de junho de 2021

DE BAR EM BAR de ROGÉRIO CORRÊA

 

Uma das vantagens do teatro virtual ora praticado no Brasil devido ao isolamento social é a possibilidade de assistirmos a espetáculos de vários estados. Nesse período tive oportunidade de assistir a espetáculos, entre outros, do Rio Grande do Sul, do Espírito Santo, do Rio Grande do Norte, da Bahia e do Rio de Janeiro e de tomar conhecimento de atrizes, atores, diretores e dramaturgos de grande talento.

No início de maio assisti a Entre Homens, montagem carioca composta de duas peças curtas do dramaturgo Rogério Corrêa (que eu não conhecia) dirigidas por Cesar Augusto. Fiquei muito impressionado com a agilidade dos diálogos de Conectados, peça que trata da comunicação virtual entre gays e com a densidade dramática de Por Amor no qual um pai checheno (grande interpretação de Isaac Bernat) tem que optar entre entregar o filho gay para os campos de concentração para homossexuais onde ele será violentamente torturado e assassinado ou ele mesmo matar o filho, evitando assim a tortura antes da morte.

O autor Rogério Corrêa

Muito gentilmente o autor me enviou o link da apresentação de sua peça De Bar em Bar, dirigida por Isaac Bernat, que foi veiculada virtualmente em março deste ano.

Em 1960 o brasileiro elegeu um louco (Jânio Quadros) e deu no que deu. Ficou 30 anos sem votar para presidente e quando o fez em 1990, elegeu outro louco (Fernando Collor) e mais uma vez, deu no que deu! A irresponsabilidade chegou ao auge depois de outros 30 anos quando em 2018 elegeu o genocida (Inominável). Três das quatro personagens da peça de Corrêa muito provavelmente pertencem a esse grupo que elegeu esses paranoicos.

De Bar em Bar acontece no dia 23 de junho de 1996, dia em que PC Farias foi assassinado junto com a namorada, mas abrange um longo período que vai desde 1983 (Diretas já) e o fim da ditadura militar em 1985, passando pela famigerada era Collor.

São quatro monólogos que se entrelaçam: um garoto de programa que atua em saunas, uma dona de casa de classe média, um empresário de direita que foi casado com uma mulher de esquerda e uma cantora de axé que garante que transou com o presidente.

Em decorrência do isolamento, cada intérprete representa em seu espaço, mas a harmonia do todo é garantida pela segura direção de Isaac Bernat que concentra sua atenção no trabalho do elenco e na perfeita integração das cenas, neste caso, com a preciosa colaboração de Thiago Sacramento na direção de imagens.

Léo Wainer representa com propriedade o empresário; Thadeu Matos exibe seu físico e seu talento como o michê de sauna; Letícia Isnard exibe toda sua versatilidade como a impagável cantora de axé com sotaque nordestino que garante que “os punheteiros do Brasil a receberam de braços abertos e com a mão direita fechada” quando ela pousou nua para a Playboy e, finalmente, a excelente Angela Rebello que é responsável pela patética dona de casa que votou no Collor, mas que se arrepende até o último fio de cabelo, pois a retenção da poupança lhe rendeu o AVC do marido e a perda das economias provenientes da venda de dois imóveis. De uma maneira ou de outra todas as personagens da peça, talvez com exceção do michê, estão preocupadas com o seu umbigo, pouco se importando com os destinos do país e esse individualismo está cada vez mais presente no povo brasileiro.

O link que recebi inclui um lúcido e esclarecedor bate papo do autor com o ótimo Guilherme Terreri (Rita von Hunty). 

A peça não está disponível no momento, mas preste muita atenção em um eventual retorno, porque ela é ABSOLUTAMENTE IMPERDÍVEL.

02/06/2021

 

 

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