A Vida na Praça
Roosevelt
de Dea Loher (2005) e Roberto Zucco de Bernard-Marie Koltès (2010) foram
encenações marcantes da companhia de teatro Os Satyros, liderada pelos
guerreiros Ivam Cabral e Rodolfo García Vázquez. No meu restrito ponto de
vista, a maioria das encenações que veio a seguir seguia a temática da peça de
Dea Loher (tratar dos habitantes do entorno da praça), sem, no entanto, atingir
a densidade dramatúrgica daquela que lhe serviu de modelo.
Eis que, diante do
texto clássico de Arthur Miller, Rodolfo García Vázquez realiza um dos
espetáculos mais impactantes e mais belos não só desta temporada teatral que
está chegando em sua metade, mas também da história do teatro brasileiro, de
1964 até os dias de hoje, período do qual sou testemunha ocular e auditiva.
As Bruxas de Salém se passa no ano de
1692 no povoado de Salém em Massachusetts, quando um grupo de meninas é
flagrado pelo pai de uma delas, em um ritual na floresta. O desdobramento desse
fato leva a uma verdadeira e escabrosa caça àquelas que o povo histérico e
manipulado da cidade considera bruxas. A peça de Miller é baseada em um fato
real e foi escrita em 1953 para denunciar o chamado “mcarthysmo” então vigente
nos Estados Unidos. O paralelo desses fatos com a realidade brasileira que
culminou com o famigerado 08 de janeiro de 2023 em Brasília, devem ter levado
Ivam e Rodolfo a escolher a peça do dramaturgo norte americano, peça esta que
só foi montada profissionalmente em São Paulo em 1960, dirigida pelo saudoso
Antunes Filho.
Para contar essa
terrível história, Rodolfo coloca em cena mais de 30 atores, quase o mesmo
número dos privilegiados espectadores que ocupam os reduzidos lugares da plateia.
A entrada no espaço
cênico na penumbra passando pelos habitantes da cidade carregando lampiões já
introduz o público no clima em que vai se passar a peça, clima esse sufocante
desde as primeiras cenas.
Para manter o clima
citado acima, as alusões ao momento atual são feitas de maneira sutil durante a
ação da peça, mas ficam bastante claras com o prólogo e o epílogo narrados pelo
ator André Lu.
As cenas de conjunto
são orquestradas harmoniosamente por Rodolfo criando grande impacto e as cenas
da ação em si são defendidas bravamente por todo o elenco.
Com tanta gente
talentosa no elenco, fica difícil, mas é impossível não destacar as
interpretações de Anna Paula Kuller (impressionante como a insegura Mary Warren,
principalmente na cena do julgamento), Diego Ribeiro (Reverendo Hale), Gustavo
Ferreira (Reverendo Parris) e finalmente aqueles que são os verdadeiros
protagonistas da peça, Henrique Mello (um excelente e vigoroso John Proctor) e
Julia Bobrow (mais uma vez comprovando seu grande talento no papel da perversa
e manipuladora Abigail Williams).
Por seu conteúdo
dramático, pela denúncia presente nesse conteúdo, pelo brilhante desempenho do
numeroso elenco e por sua beleza cênica, As Bruxas de Salém torna-se
OBRIGATÓRIA para todas/ todos aquelas/aqueles que amam o teatro e se preocupam
com o andamento dessa carruagem chamada Brasil.
AS BRUXAS DE SALÉM
está em cartaz no Espaço dos Satyros até 27 de agosto de quinta a sábado às
20h30 e aos domingos às 18h.
18/06/2023
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