segunda-feira, 10 de setembro de 2012

MIRADA 2 – RIR, CHORAR... REFLETIR.

     Emocionei-me com dois belíssimos espetáculos apresentados no Mirada. Num deles (Incêndios) houve uma verdadeira comoção e todo público saiu da sala de espetáculos com lágrimas nos olhos; no outro (Ato Cultural) se ri demais e saímos do teatro com outro tipo de emoção. O mais importante é que ambos, por vias completamente diferentes, nos fazem refletir sobre a caótica situação deste século que já tem 12 anos e ainda não aprendeu a crescer.
     Incêndios. O espetáculo -  do grupo mexicano Tapioca Inn dirigido por Hugo Arrevillaga Serrano com texto do libanês de nacionalidade franco-canadense  Wadji Mouawad – é um soco no estômago. A história da mulher que esconde dos filhos gêmeos a sua história e a origem dos mesmos tem inspiração melodramática (inclusive pelas coincidências que se revelam próximo ao final), porém a encenação e o próprio texto conseguem chegar ao limite do gênero, driblando-o e apresentando um trabalho cheio de vigor dramático e de denúncia social. O trabalho dos atores e, em especial, o da grande atriz Karina Gidi é não menos que excelente e está em concordância com a proposta da direção. O cenário composto por praticáveis de madeira,  por meio de pequenos movimentos nos transporta de um insípido escritório de advocacia numa grande cidade para regiões devastadas pela guerra no Oriente Médio. Tudo funciona perfeitamente e há momentos (como os monólogos da mãe) em que a emoção chega à beira do insuportável. A boa notícia é que este digníssimo espetáculo deverá cumprir uma temporada de três semanas no Sesc de São Paulo no início do ano que vem. Guardem esse nomes: Incêndios e Karina Gidi. Não é sempre que temos a oportunidade de assistir a trabalho tão excepcional. Em tempo: esta peça serviu de roteiro para o filme homônimo (2010) dirigido por Denis Villeneuve.
Incêndios - Foto de divulgação.

     Ato Cultural. Espetáculo do grupo Actoral 80 da Venezuela. Texto de José Ignacio Cabrujas (de quem vimos há algum tempo atrás El Dia Que Me Quieras)com direção de Héctor Manrique. Membros de uma entidade “de fomento à arte, à ciência e à indústria” de uma pequena cidade resolvem apresentar uma peça de teatro sobre Cristovão Colombo e o descobrimento da América. Metateatro onde os componentes do grupo tentam representar, mas não conseguem deixar de lado seus problemas pessoais. Tudo é muito engraçado e os atores  dirigem-se diretamente à plateia que somos nós, a sociedade da cidade de San Rafael de Ejido. A peça é apresentada em dois atos com um intervalo entre eles. Na parte final da malograda apresentação eles constatam que a maioria do público foi embora (“Ausente” como anuncia um dos atores ao ser nominado alguém que estava presente no início da apresentação) ou está dormindo. Um riso amargo percorre os lábios do público (nós) presente. Espetáculo saborosíssimo com seis atores talentosos e espontâneos, onde voltamos a refletir sobre os problemas atuais.
O talentoso elenco de Ato Cultural - Foto de divulgação.

     Acredito que isso é teatro, ao contrário do que declarou um conhecido diretor brasileiro presente em um dos encontros que estão acontecendo paralelamente ao festival:” Teatro não é para refletir nem para emocionar; quem quiser isso que leia um livro ou vá assistir à Miss Saigon”, foi mais ou menos o que ele disse, descartando qualquer tipo de espetáculo que não seja o que ele faz. Lamentável!

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