Dário
é ascensorista de um prédio sombrio e decadente; esse microcosmo é habitado por
amostra significativa de nossa sociedade: seres abjetos movidos a egoísmo, ódio,
frustração e violência. Tendo de conviver com essas criaturas Dário refugia-se
no amor a um passarinho e nos poucos momentos de paz que desfruta quando o
elevador está se movendo entre um andar e outro e não há ninguém no mesmo.
Dário reage com crises violentas de vômito ao ver desfilar diante de si tanta
desumanidade, mas é obrigado a ficar em posição de sentido e a sorrir cada vez
que a porta do elevador se abre. O instigante texto de Angela Ribeiro criado na
7ª turma do Núcleo de Dramaturgia do Sesi-British Council é muito bem
estruturado e bastante cruel com seus personagens, os habitantes do prédio;
revelando apenas certa compaixão pela senhorinha que espera por um filho que
nunca vem e, é claro, enorme simpatia
pelo herói da história, o pobre Dário que acaba sucumbindo diante de tantas
atrocidades.
Se
o texto é instigante, o que dizer da encenação de Eric Lenate? O diretor tem
bom gosto para o espetacular e pelo cuidado estético com cenários, iluminação e
trilha sonora e aqui ele atinge raro patamar de excelência criando instalação
cenográfica que auxiliada pela iluminação de Aline Santini e pela trilha sonora
de L.P. Daniel é estímulo para os sentidos visual e auditivo remetendo o
espectador àquele mundo sombrio (o corredor do prédio lembra aquele do filme O Iluminado de Stanley Kubrick).
As
máscaras criadas por Leopoldo Pacheco são excelentes, exteriorizando ainda mais
a sordidez daquelas criaturas. Os figurinos de Rosângela Ribeiro complementam o
visagismo, reforçando o ar caricatural de história em quadrinhos, presente em
toda a encenação.
Maurício
de Barros como Dário domina o espetáculo com seu ar chapliniano. Sem sair de
cena durante os 80 minutos da ação tem atuação digna das antologias de teatro.
Todo o elenco tem atuação primorosa dentro da proposta caricatural do
encenador, mas não há como não destacar a sempre poderosa Lavínia Pannunzio como
a “estrela” Diva e Laerte Késsimos, ótimo como Seu Túlio.
Triste
mundo esse, mostrado em Refluxo. Mais
triste ainda por se revelar muito verdadeiro e presente em nosso cotidiano.
“Que não morram os nossos pássaros!” é o grito de alerta da promissora dramaturga
Angela Ribeiro e a nossa voz junto com a dela deveria repetir: “Que não morra
nossa esperança!”.
Refluxo pode se inscrever desde já como
um dos melhores espetáculos da temporada teatral de 2017 e o maior mérito cabe
ao encenador Eric Lenate pela concepção geral do mesmo.
REFLUXO
está em cartaz até 02/07 no Espaço Mezanino do Centro Cultural FIESP de quarta
a sábado às 20h30 e aos domingos às 19h30. Os ingressos são gratuitos e são
poucos os assentos disponíveis. Portanto... CORRA!
Fotos de Leekyung Kim
25/05/2017