domingo, 27 de maio de 2018

LEOPOLDINA – INDEPENDÊNCIA E MORTE



AQUILO QUE JOAQUIM SILVA NÃO ME CONTOU


        Na minha época escolar a maioria dos livros de História era de autoria desse senhor Joaquim Silva. Eles mostravam versão romanceada dos protagonistas da História; Dom Pedro I, por exemplo, era o herói bonitão que proclamou a independência do Brasil e que só se apaixonou pela sensual Domitila porque sua esposa Leopoldina era feia e desinteressante. Essa versão, de interesse da classe dominante, só se consolidou através dos tempos como, por exemplo, através do filme Independência ou Morte (produzido em 1972, no auge da ditadura militar), onde os protagonistas eram Pedro (Tarcisio Meira) e Domitila (Glória Menezes) e à pobre Leopoldina era reservado um papel secundário representado ali por Kate Hansen (pelo menos aqui ela era bonita!). A vida me levou para outras áreas de interesse e essa versão permaneceu na minha memória, apesar de que com o tempo cada vez mais ter desconfiado das versões oficiais da nossa história.
        Eis que Marcos Damigo apoiado nos dados obtidos com a consultoria histórica de Paulo Rezzuti traz para o teatro uma versão revolucionária da figura de Leopoldina, que foi uma mulher inteligente, estrategista e a verdadeira agente da independência do Brasil, enquanto isso o seu Pedro voltava de Santos esfarrapado montado em uma mula às margens do riacho Ipiranga! Essa e outras importantes ações de Leopoldina, como seu amor e conhecimento pelas plantas, são a base do texto e da encenação de Damigo. Sem saber, no século 19, Leopoldina plantou a semente do feminismo e dos direitos da mulher no Brasil.
        A peça é dividida em três pequenos atos. No primeiro, Leopoldina, que era austríaca, fala sobre suas dificuldades em se adaptar em um país tropical dominado pelos grosseiros portugueses e onde os negros desfilam seminus pelas ruas. No segundo há o embate com José Bonifácio, onde ela toma conhecimento das manobras de Pedro com Domitila. Uma envelhecida (apesar da pouca idade) e revoltada Leopoldina domina o terceiro ato onde ela expõe toda a fragilidade de Pedro. Cada ato é separado por informações históricas apresentadas em vídeo. A montagem de Damigo chega a ser didática, sem absolutamente ser monótona. Há momentos tragicômicos como quando Leopoldina revela que apesar de seus esforços ela só será lembrada no Brasil como estação de trem ou enredo de escola de samba.
        Joca Andreazza representa José Bonifácio mostrando a força da personagem, mas também sua fragilidade em momento que está sujeito a ser enviado a Portugal sob-risco de ser condenado a morte. Sara Antunes brilha como Leopoldina. Seus dois solos que vão da perplexidade do primeiro ato à revolta do terceiro, assim como seu diálogo com José Bonifácio revelam, ou melhor, consolidam a carreira dessa grande atriz. Sua movimentação em cena é prejudicada por uma marcação convencional e, principalmente, pelo figurino de Cassio Brasil, que dificulta o seu andar.
        O cenário de Renato Bolelli Rebouças com um telão ao fundo não diz muito ao que veio.
        A revelação de fatos importantíssimos da História do Brasil e a interpretação extraordinária de Sara Antunes tornam obrigatório o espetáculo em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil até 21/06.
        Segunda, quarta, quinta, sexta e sábado às 20h e domingo às 18h.



        27/05/2018
 

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