No início dos anos
2000, circulavam pelas escolas de teatro e pelas oficinas de dramaturgia,
cópias xerox de textos de certo dramaturgo romeno que estava em voga na Europa.
Tratava-se de Matéi Visniec, um ilustre desconhecido entre nós.
Um desses textos - que
foi o primeiro a que tive acesso - era Com os Bolsos Cheios de Pão. Na
minha superficial análise da ocasião escrevi “Bons diálogos, um conflito
atrás do outro, mas que não leva a nada e lembra ‘Esperando Godot’”. Não há
dúvida que nessa fase o autor tem uma grande influência de Samuel Beckett, mas
daí a concluir que o texto não leva a nada foi um equívoco da minha parte.
O interesse pela obra
de Visniec cresceu e teve surpreendente expansão com o lançamento da maioria de
suas peças pela Editora É. Só na segunda década deste século foram montadas em
São Paulo mais de uma dezena de suas peças por renomados nomes do nosso teatro.
Chegou a vez da, ao
que eu saiba, primeira montagem profissional de Com os Bolsos Cheios de Pão e
o resultado é surpreendente.
Aqueles dois homens,
um com uma bengala e o outro com um lenço na cabeça, que substitui o chapéu do
original, estão ali, diante de um poço onde caiu um cão que não se sabe se está
vivo ou morto. Tagarelam, fazem mil conjecturas, mas não fazem nada de concreto
para salvar o cão. É aquela imobilidade tão comum entre nós que faz com que os
que detém o poder sigam em frente com suas insanas atitudes.
- Então vamos?
- Vamos!
(permanecem imóveis
no mesmo lugar)
Dessa maneira
terminam o primeiro e o segundo ato de Esperando Godot de Beckett e essa
(in)ação domina toda a trama da peça de Visniec; mas há uma grande diferença
entre Vladimir e Estragon e os homens de Com os Bolsos Cheios de Pão, a questão
dos primeiros é mais metafísica enquanto os segundos têm diante de si um
problema concreto e nada fazem para resolvê-lo, além de falarem, falarem,
falarem... sem sair do lugar!
A criativa encenação
de Vinicius Torres Machado situa toda a ação em um bloco circular com cerca de
um metro e meio de diâmetro e a mesma medida de altura. O cenário e os figurinos
são assinados por Eliseu Weide.
Bastante verborrágica
e propositalmente repetitiva nos diálogos, a dinâmica da peça encontra seus
aliados na criativa e surpreendente iluminação de Wagner Antonio e na força e
talento de seus intérpretes.
Edgar Castro empresta
seu conhecido talento ao homem da bengala, aparentemente mais forte e convicto
de suas ideias.
Donizeti Mazonas
compõe com maestria o patético e frágil homem com chapéu. Seu tom de voz, suas
expressões faciais e sua movimentação cênica naquele exíguo espaço me deixaram
literalmente com um sorriso amargo na boca aberta. A temporada teatral está
apenas começando, mas esse trabalho já pode ser considerado como um dos
melhores e mais significativos do ano.
A peça encerra a
temporada no SESC Pompeia em 18/03 (de terça a sexta às 21h), mas deve cumprir
uma nova no Teatro Cacilda Becker em data a ser divulgada.
NÃO DEIXE DE VER!
10/03/2022
qual o titulo da peça em romeno?
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