O maior elogio que
posso fazer ao ótimo Hamlet 16x8 defendido brilhantemente por Rogério
Bandeira é que fiquei com muita vontade de reler Hamlet e o Filho do Padeiro
– Memórias Imaginadas, autobiografia de Augusto Boal. Já tirei o livro da estante
para voltar a lê-lo.
Hamlet 16x8 baseia-se não só nas
memórias de Boal, mas também naquelas do ator que tem em seu currículo
passagens importantes pelo CPT de Antunes Filho e pela Cia. do Latão,
além de uma vida pessoal marcada pela ditadura, uma vez que seu pai Iberê
Bandeira de Mello atuou na defesa de presos políticos nesse tenebroso período e
foi muitas vezes detido para prestar esclarecimentos sobre suas atividades.
Na
posse de todas essas memórias Bandeira e o diretor Marco Antônio Rodrigues
criaram a consistente dramaturgia do espetáculo.
Bandeira entra em cena
claudicante e inseguro (isso faz parte da encenação) dirigindo-se à plateia com
elogios ao livro de Boal. Após fazer comparações entre a sua vida e à do Boal,
o ator finalmente salta no vazio com seu guarda-chuva e com muita segurança
inicia de verdade o seu relato.
Eu me lembro do belo e
atlético jovem Rogério Bandeira circulando pelos corretores do sétimo andar do
SESC Consolação onde funciona o icônico Centro de Pesquisas Teatrais (CPT)
que era coordenado por Antunes Filho. Era o ano de 1997, eu frequentava o curso
de designer sonoro e ele fazia o CPTzinho. Há excelente momento na peça
onde Bandeira relembra a bronca que Antunes lhe deu após a apresentação de uma
cena sua com a Djin Sganzerla. A recriação da figura de Antunes desde o seu
“OK” interrompendo a cena até o final da bronca é perfeita.
E momentos excelentes
é que não faltam em Hamlet 16x8, como aqueles no nordeste em que Boal encontra o Padre Batalha e o
diálogo com o camponês Virgílio ao final de um espetáculo, onde Boal confessa
ter compreendido ali a “falsidade mensageira do teatro político” que o
fez entender ”que não temos o direito de incitar seja quem for a fazer
aquilo que não estamos preparados pra fazer”.
E de momento em
momento cumprem-se quase duas horas desse emocionante e, em certo sentido,
didático trabalho dirigido com muita sensibilidade por Marco Antônio Rodrigues
e interpretado por Rogério Bandeira.
Hamlet 16x8 encerrou a temporada (virtual e presencial) em 19/09/2021 com apenas dez apresentações. Urge que volte ao cartaz, pois trata-se de importante ferramenta para reverenciar a importante figura de Augusto Boal e estimular a memória do nosso teatro, além de contar com a excelente interpretação de Rogério Bandeira.
20/09/2021
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