domingo, 12 de junho de 2022

O ANJO DE CRISTAL

 

É surpreendente observar o currículo de Luccas Papp, um jovem com menos de 30 anos, e constatar a quantidade de títulos que ele acumula nas mais diversas funções teatrais seja como autor, ator, diretor, produtor, ou ainda, como professor de teatro. Desconheço a formação acadêmica de Papp, mas tenho certeza que a prática muito lhe ensinou, haja vista a consistência da estrutura dramatúrgica como também a fluidez e a agilidade dos diálogos daqueles textos de sua autoria a que pude assistir; em alguns casos há certa imaturidade e falta de profundidade no tratamento dos temas, algo perfeitamente compreensível para autor tão jovem. Não há dúvida que Luccas Papp é um dos mais promissores dramaturgos brasileiros, com importante carreira pela frente. Nosso teatro está necessitando disso.

A última incursão de Papp como ator e autor (segundo ele, a peça foi escrita em quatro horas!) é O Anjo de Cristal, ora em cartaz no Teatro União Cultural.

A trama desta peça envolve um homem muito tímido que compra uma hora com prostituta de luxo vinda do interior que “faz a vida” para pagar a faculdade na FAAP. O texto faz referências simpáticas a coisas e lugares de São Paulo e, como já citado acima, tem diálogos ágeis e um grande mérito ao louvar o empoderamento e a liberdade de escolha da mulher.

Como em outras peças do autor a que assisti, há uma reviravolta no final, que não vou relatar qual é para não ser um desmancha prazer para as/os futuras/os espectadoras/es (melhor assim do que “es futures espectadores”, não é?).

Luccas Papp se sai bem como o visitador, exagerando às vezes nas caras e bocas (principalmente da projeção do queixo para a frente) para demonstrar a timidez e as surpresas com as investidas da jovem.

 Carolina Amaral é uma belíssima mulher e demonstra talento e coragem para enfrentar a personagem de Isadora, a prostituta, cabendo um senão à pouca projeção de sua voz. Irritante e artificial é o mascar de chiclete nas cenas iniciais, mostrando antipatia e pedantismo que a personagem não tem.

Se no cinema já é difícil, no teatro é muito mais complexo resolver as cenas de sexo; na maioria das vezes a situação é resolvida com um indesejado black out entre o antes e o depois. Neste caso, o encenador Kiko Rieser optou por realizar a cena na penumbra, havendo certas inverossimilhanças que aqueles que irão assistir ao espetáculo irão notar, mas o importante é que a cena resulta bonita. Rieser conduz o espetáculo sem arroubos criativos (algo extremamente correto para esse tipo de texto) concentrando sua atenção na interpretação e na movimentação cênica do elenco,

A ação da peça se passa no flat onde a jovem atende os seus clientes e o cenário que procura mostrar esse ambiente leva, para minha surpresa, a assinatura de Kleber Montanheiro, cenógrafo colorido e um tanto “barroco”. No meu modo de ver, fez falta ali uma silhueta dos prédios da cidade através da janela, uma reprodução de um quadro da Beatriz Milhazes ou do Romero Britto na parede e uma cortina de tecido um pouco mais nobre.

A iluminação de Lui Seixas procura refletir a intenção de cada cena e a trilha sonora de Mau Machado a partir de clássicos de jazz está mais para Nova York do que para São Paulo, mas funciona: afinal ela é uma garota de programa culta e refinada.

Muito importante: um bem-vindo programa impresso simples, mas contendo sinopse, ficha técnica, impressões dos envolvidos e fotos é distribuído aos espectadores e a um pesquisador como eu, que necessita dessas informações para desenvolver seu trabalho em prol da memória de nosso teatro. 

O ANJO DE CRISTAL está em cartaz no Teatro União Cultural apenas às quintas feiras às 20h até 28/07.

PRESTIGIE O AUTOR BRASILEIRO! 

12/06/2022

 

 

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