Eis
um trabalho repleto de boas ideias que, um pouco burilado após a estreia de 31/05/2017,
pode se transformar em ótimo espetáculo.
O
antimusical, assim denominado pelo autor, tem boa sacada desde o título dos
atos: o primeiro é Sonhos e o segundo
Pesadelos. Há de tudo um pouco na
trama elaborada por Dan Rosseto: humor, paródia dos musicais norte americanos,
muita ironia, realismo ao retratar a vida da protagonista Kelly, suspense,
crime, terror e até certo canibalismo, pois quem come hamburguer de carne
humana só pode ser considerado canibal, não é?
No
primeiro ato predomina o humor, apesar do retrato amargo da jovem balconista de
lanchonete maltratada não só pelo seu chefe, mas pela vida e que tem seu único
alento no sonho de ir para a “América” e se tornar estrela da Broadway. Nele
estão os melhores momentos da peça, entre eles a deliciosa cena do supermercado
que é virulenta crítica ao consumismo imposto pelas propagandas do sistema
capitalista. Outra boa ideia aparece quando surge uma fada/bruxa (?) que
promete realizar os sonhos de Kelly.
O
segundo ato destitui-se em grande parte do humor, correndo o perigo de resvalar
para o dramalhão. Com trama parecida àquela do filme colombiano Maria Cheia de Graça (2005) de Joshua
Marston, a protagonista, agora rebatizada como Maria de los Ángeles vai em
direção da “América” transportando drogas e tem final trágico. O ato alonga-se
em cenas como a do necrotério e da primeira fronteira. O humor e a ironia só
voltam a se destacar na irreverente cena final, uma crítica aos grands finales dos shows da Broadway.
Carol
Hubner tem forte presença cênica e se sai melhor como a sofrida Kelly do que a
aparentemente segura Maria do segundo ato. O restante do elenco se desincumbe de
vários papéis com destaque para Diogo Pasquim (hilário como o propagandista do
supermercado) e para a figura chapliniana de Juan Manuel Tellategui, excelente
tanto como o cruel gerente da lanchonete como as várias personagens que
desempenha no segundo ato.
A
trilha gravada com o coro incomoda este espectador ranzinza. Como seria o
rendimento de haver apenas a parte instrumental gravada e só os atores cantarem
ao vivo? Talvez perdesse em grandiosidade, mas com certeza ganharia em
espontaneidade.
Outra ótima ideia é a homenagem e a participação em off do grande ator de musicais Fred Silveira, também responsável pela trilha sonora original.
Outra ótima ideia é a homenagem e a participação em off do grande ator de musicais Fred Silveira, também responsável pela trilha sonora original.
Enquanto as Crianças Dormem é espetáculo
realizado sem patrocínio graças ao sangue e ao suor dos idealistas Dan Rosseto
e Fabio Camara e merece todo o apoio em sua tentativa bem sucedida de realizar
um musical, perdão... um antimusical com características totalmente locais.
A
peça está em cartaz no Teatro Aliança Francesa às quartas e quintas às 20h30. Temporada
prevista até 27/07.
02/06/2017
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