quarta-feira, 14 de junho de 2017

FIT RIO PRETO 2017

FESTIVAL INTERNACIONAL DE TEATRO (FIT) DE RIO PRETO 2017


        É grande a expectativa em torno da edição deste ano do FIT RIO PRETO que se realiza de 06 a 15 de julho. Depois de ser (des)organizado  e desmoralizado por vários anos pela gestão anterior e atingir o fundo do poço no último ano, eis que ressurge tal qual Fênix, agora sob a batuta do competente Jorge Vermelho e de novo com o patrocínio do Sesc, que nos últimos anos havia se retirado do evento por razões facilmente imagináveis.
        A programação é poderosa: vários títulos internacionais aparentemente muito atrativos, espetáculos nacionais adultos e para crianças e jovens e espaço para os trabalhos dos grupos da cidade em “Cena Rio Preto). É de tirar o fôlego!
        Da programação “espetáculos nacionais adultos” fazem parte oito montagens já testadas com muito sucesso de público e de crítica em São Paulo, além de SUASSUNA O AUTO DO REINO DO SOL, espetáculo de abertura apresentado pela Cia. Barca dos Corações Partidos que encantou São Paulo em 2016 com AUÊ. Publiquei matérias sobre elas e faço aqui uma compilação das mesmas para quem se interessar.

GRITOS


        Difícil de explicar e de definir, mas muito fácil de elogiar “Gritos”, novo espetáculo da “Companhia Dos à Deux” formada por André Curti e Artur Luanda Ribeiro, ora em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil. A tênue e bela iluminação direciona o olhar do espectador para aquelas figuras que ilustram os três poemas gestuais (é assim que o grupo define as cenas) que tratam de amor, preconceito e guerra. A penumbra e até a escuridão têm função estética, revelando um teatro “noir”, bastante diferente de certo tipo praticado em nossos palcos. Os dois atores auxiliados por um contrarregra manipulam bonecos e máscaras criando surpreendente efeito visual. A mais pungente é a última cena onde mãe refugiada de guerra perde seu filho durante a fuga. Lindíssimo na forma e tocante no conteúdo, GRITOS merece ser visto

IRACEMA VIA IRACEMA


        Quantas Iracemas viajam naquele ônibus que tem ponto na Praça Roosevelt? Quantas daquela Iracema você já encontrou e até desprezou pelas ruas da cidade? Ela mesma pergunta “Perdeu alguém parecido comigo?”.
        A pesquisa conjunta das companhias Agrupamento Andar 7 e Trupe Sinhá Zózima resultou nesse espetáculo que tem forte interpretação de Luciana Ramin e direção de Anderson Maurício a partir do texto de Suzy Lins de Almeida.
        A encenação é composta de vários flashes da vida dessa mulher marginalizada e semi analfabeta, mas dona de muita coragem e perspicácia para enfrentar os inimigos que encontra pela sua sofrida vida. Apesar de se ressentir de mais forte amarração entre esses flashes, a peça flui de maneira vigorosa em função do trabalho da atriz e dos detalhes da encenação: o ônibus como personagem, os adereços de cena, a iluminação cenográfica de Tomate Saraiva, os figurinos e a trilha sonora com canções que emolduram os vários momentos da vida de Iracema, incluindo até uma bonita versão de India, cantada pela própria atriz, na cena em que a personagem vai a um programa de rádio.
        Luciana Ramin tem porte e talento e entrega-se com muita coragem à sua personagem, despindo-se de qualquer pudor para personificar a sua Iracema. A atriz sabe interagir com o público, além de contornar muito bem certas interferências de algum espectador mais afoito.
        Desta vez o encenador Anderson Maurício optou por manter o ônibus da Sinhá Zózima parado durante a apresentação. A meu ver, solução cênica correta, pois a interação com o cenário externo torna-se mais forte como as investidas de Iracema junto aos passantes e também com o surpreendente momento final.

TRILOGIA ABNEGAÇÃO

ABNEGAÇÃO 1 – UM ESPETÁCULO ESTRANHO


        Desde seu título esta peça nos distancia de qualquer raciocínio lógico. Abnegação? As cinco personagens não têm absolutamente nada de abnegadas e nem o gesto suicida de uma delas pode ser assim chamado.
        O texto instigante de Alexandre Dal Farra beira o absurdo ao não esclarecer o que está acontecendo com aquelas pessoas pertencentes a um determinado grupo (partido político? empresa? alguma confraria?) que se digladiam em torno de fatos que o público desconhece até o final do espetáculo. O já citado suicídio do líder no final da primeira parte vai mover toda a ação da segunda, onde os “sobreviventes” que se aproveitaram da situação remoem os seus remorsos.
        O uso de dois praticáveis (que remete à solução cenográfica usada em Les Éphémères do grupo francês Théâtre du Soleil) é bastante interessante, com a ressalva que a troca de cenário no praticável à direita da plateia desvia a atenção  do público do que está acontecendo em cena.
        O grande trunfo do espetáculo é o elenco e nota-se que os diretores (Dal Farra e Clayton Mariano) concentraram suas atenções nas interpretações cheias de silêncios e gestos enigmáticos. Transitando por frases soltas e ações inconsistentes (pelo menos para o público) eles atuam com energia e verdade passando uma verossimilhança daquilo que é, senão inverossímil, pelo menos, racionalmente incompreensível. Todos estão ótimos, mas é necessário destacar o vigoroso trabalho de Vitor Vieira, que já havia nos brindado em 2012 com uma grande interpretação em Mateus 10.
        Este corajoso trabalho da companhia Tablado de Arruar com toda sua estranheza, surpreende e faz refletir sobre a situação do Brasil atual. “Surpreender” é sinônimo de bom teatro e “refletir” é sinônimo de um salutar engajamento, prova que o Tablado de Arruar não está brincando em serviço.
        O espetáculo tem 2h10 de duração e talvez merecesse alguns cortes na primeira parte como também no número de charutos fumados por André Capuano!

ABNEGAÇÃO 2
UM SOCO NO ESTÔMAGO!


        Assisti a Abnegação 2 pela primeira vez em um dia particularmente infeliz para o público (um sério problema na linha azul do metrô por volta das 19h deixou toda a cidade congestionada) e também para o grupo Tablado de Arruar  (um refletor foi danificado e todas as cenas de fundo foram prejudicadas). Isso aconteceu no dia 30 de abril de 2015 na Oficina Cultural Oswald de Andrade e quando não acontece a esperada comunhão entre espectador e ator algo sai fora dos eixos. Saí do espetáculo sem confirmar as boas expectativas que tinha em relação a esse novo trabalho de Alexandre Dal Farra (Abnegação 1 foi para mim um dos melhores textos brasileiros da temporada de 2014), mas sentindo que ele tinha potencial para dar bons resultados.
        Na última semana revi o espetáculo agora no simpático Armazém Cultural e o que vi foi, no meu ponto de vista, uma outra peça.
        Abnegação 2 tem o subtítulo de O Começo do Fim e declara-se inspirada no caso do assassinato em 2002 de Celso Daniel que foi prefeito de Santo André. É dividida em dois planos: a vida pública e a vida privada (as cenas deste plano é que ficaram prejudicadas na primeira vez a que assisti a montagem). Tudo é corrupção, conchavo político e muita libertinagem (drogas, traições públicas e privadas). Enquanto as podridões do plano público são apresentadas em tom histérico, aquelas do plano privado são ditas à meia voz com os atores semiestáticos, mas em ambas fica patente a sordidez de que é capaz o ser humano em busca de poder e privilégios. A peça é um soco no estômago e não deixa pedra sobre pedra. O ser humano é tratado como mera mercadoria a base de troca tanto no sexo como na aquisição de valores e na luta pelo poder. Com a situação política atual creio que já estamos não mais no começo, mas a meio caminho do fim.
        Há quem diga que o espetáculo é uma virulenta crítica ao PT, o que não deixa de ser verdade, mas a sua abrangência é muito mais ampla: as intrigas palacianas apresentadas fazem parte de toda a política brasileira.
        Os diretores Alexandre Dal Farra e Clayton Mariano optaram por uma montagem literalmente suja: Jorge (a personagem que vai ser assassinada) cobre-se de cerveja para depois bêbado ser “lavado” com detergente; José (um dos articuladores do crime) banha-se em cocaína e por aí a fora. Tudo é muito exteriorizado nas cenas do plano público levando os espectadores a um proposital incômodo enquanto a pior forma de sedução é mostrada nas cenas do plano privado, o que também não deixa de provocar um mal estar. Neste plano os dois papeis femininos têm alta importância, algo que havia me escapado na primeira vez e as atrizes Ligia Oliveira e Alexandra Tavares desempenham seus papeis com garra e coragem. Vinicius Meloni sai-se bem, principalmente, no seu monólogo final, mas sua dicção em certos momentos dificulta a compreensão do texto. André Capuano é um ótimo ator, mas sua interpretação over over para uma personagem que já é over perde impacto no decorrer da ação. Vitor Vieira brilha no papel de Jorge; ele é um ator de forte presença cênica e suas atuações junto ao Tablado de Arruar tornam-se cada vez mais poderosas. Sua interpretação em Abnegação 2 vem juntar-se a outros notáveis trabalhos masculinos deste ano : Chico Carvalho (Consertando Frank), Daniel Costa (Urinal), Danilo Grangheia (Krum), Eduardo Mossri (Cartas Libanesas) Gustavo Gasparani (Ricardo III), Jarbas Homem de Mello (Chaplin) e Marcos Breda (Oleanna).
        Segundo o dicionário “abnegação” significa “desinteresse, renúncia, desprendimento, devotamento”. Esta aí mais uma ironia do dramaturgo ao dar esse título à peça.
        Abnegação 2 junta-se a Abnegação 1 e a Os Collegas (peça do ano 2003 da Bendita Trupe injustamente esquecida) na denúncia das intrigas e sujeiras da política brasileira (curiosamente um tema pouco tratado pelos nossos dramaturgos) e precisa ser vista por quem acredita que tomando conhecimento e refletindo sobre o assunto possa contribuir para mudar esse lamentável estado de coisas.
        O fôlego de Alexandre Dal Farra é bastante forte e como ainda há muita sujeira a ser mostrada ele já tem Abnegação 3 em preparo.

ABNEGAÇÃO III 
CENAS DA VIDA PRIVADA DE UM PAÍS À BEIRA DO CAOS.


        Em Abnegação II, as cenas dividiam-se em públicas (extremamente dinâmicas) e privadas (semi-estáticas). Nesta Abnegação III que trata da vida privada, os encenadores Clayton Mariano e Alexandre Dal Farra resolveram radicalizar optando por deixar os atores sentados com os braços estendidos ao longo do corpo, dando vida às falas das personagens apenas com suas expressões faciais e vocais. Pouquíssimas vezes e em momentos necessários para o desenvolvimento da ação eles se debruçam para frente, ficam em pé ou caem no chão. Há de se convir que tal solução cênica poderia resultar em espetáculo, no mínimo cansativo, mas os diretores, sabedores da força e do talento do seu elenco, apostaram e o resultado é surpreendentemente dinâmico e envolvente. Um emblemático pano vermelho cobre todo o fundo do palco.
        O texto de Alexandre Dal Farra, dividido em nove cenas, visita cinco famílias de várias classes econômico-sociais todas elas envolvidas, de alguma maneira, com o PT. A partir da 6ª cena as quatro primeiras voltam a aparecer em momentos diferentes, ficando a quinta (Na casa de um oficial) como um divisor entre os dois tempos ocorridos. Diálogos ágeis entremeados com longas falas (“bifões”, como se diz, na gíria teatral) dão vigoroso painel da situação do Brasil no momento em que se preconizava a agonia do PT (2014). Curiosamente, se na leitura do texto os “bifões” chegavam a incomodar, na encenação eles funcionam muito bem em função da maneira como são interpretados pelos atores.
        Poucas vezes temos a oportunidade de ver em nossos palcos elenco tão coeso e talentoso. Os seis atores, utilizando-se quase que apenas de seus recursos faciais e vocais passam para o público toda a emoção e o ridículo de certas situações. A ironia presente é responsável por risos nervosos e também irônicos do público.
        Ligia Oliveira tem seu melhor momento como a patética Adriana, empregada de uma família de herdeiros ricos. É difícil acreditar que seja a mesma pessoa que encarnou a espevitada perua de peruca longa em Abnegação II.
        Antonio Salvador entra para a trilogia apenas nesta última e empresta todo seu talento para as várias personagens que interpreta.
        André Capuano despoja-se das interpretações exageradas das duas primeiras “abnegações” e usa máscaras variadas para dar vida a seus personagens.
        Alexandra Tavares, parecendo muito mais jovem, com seu cabelo cortado rente, tem dicção clara e consegue parecer uma menina ou uma velha (a mãe de uma das cenas) com igual desenvoltura.
        Amanda Lyra é um vulcão em cena, sendo responsável pela maior parte das falas engraçadas da peça.
        E finalmente Vitor Vieira, ator que confirma mais uma vez (se isso fosse necessário!) seu grande talento e versatilidade.
        Muitos elogios? Pode ser, mas todos verdadeiros e muito necessários. Se houvesse algum prêmio dedicado a elenco o meu voto iria com certeza para este trabalho onde predomina a ideia de coletivo.
        Com 15 anos de existência, só tomei contacto com a Tablado de Arruar em 2012 quando assisti ao impactante Mateus 10. A partir daí surgiu Abnegação que deu origem à trilogia que ora se encerra. Trilogia corajosa onde um grupo nitidamente de esquerda faz crítica feroz do partido de esquerda que levou o país à situação ora vivida por todos nós.
        Antes do início do espetáculo, um amigo e eu comentávamos a situação dramática que ora vivemos, pelo fato de não haver perspectivas de luz no fim do túnel, pois este túnel só tem políticos corruptos e arrivistas. E essa falta de luz é muito bem metaforizada ao final do espetáculo com o black out que ocorre na casa pobre e com a ausência dos atores no palco. Soco no estômago, como Alexandre Dal Farra e Clayton Mariano sabem muito bem dar!

BLANCHE
MAIS UMA DO MESTRE ANTUNES


        Antunes Filho volta a surpreender a começar pela escolha de um homem para interpretar uma das personagens femininas mais importantes e icônicas da dramaturgia mundial. Ela surgiu em 1947 no teatro norte americano pelas mãos de Jessica Tandy e foi imortalizada no cinema por Vivien Leigh (1951). No Brasil Blanche Dubois já foi vivida por Henriette Morineau (1950), Maria Fernanda (1965), Eva Wilma (1974), Tereza Rachel (1986), Leona Cavalli (2002) e Maria Luisa Mendonça (2015); agora é a vez de Marcos de Andrade trazer à luz a frágil e sofrida personagem.
        Retomando e radicalizando a estética de A Falecida Vapt Vupt encenada em 2009 o encenador volta a apresentar um espetáculo no Espaço CPT iluminado apenas com as lâmpadas do local, sem uso de refletores e com reduzidos objetos de cena. O único recurso extra-interpretação usado é a inserção de algumas músicas para ilustrar a ação (trilha sonora selecionada por Raul Teixeira). A casa da irmã Stella não tem portas (as cortinas do espaço servem como tal); a campainha é ouvida pelo som de quem a toca; os atores mimicam o comer, o beber e o lavar a louça. Tudo se passa como se fosse um ensaio... mas não é um ensaio! Coisas do Mestre Antunes que como sempre resultam em algo inovador e surpreendente.
        Falado em fonemol (qual seria a diferença com gromelô?) a ação torna-se totalmente compreensível para quem conhece a peça de Tennessee Williams uma vez que esta é seguida quase à risca. Para facilitar o acompanhamento da trama é fornecido ao público um roteiro com a sinopse da mesma cena por cena.
        Há a clara intenção de denunciar a violência física e moral com mulheres e travestis e isso é evidenciado com a ênfase na cena do estupro muito bem estilizada pelo diretor.
        Com tal radicalismo na encenação a peça exige muito dos atores que são praticamente o único recurso cênico da mesma. Marcos de Andrade compõe uma Blanche perfeita; sem afetações e maneirismos inúteis ele comunica ao público a graça e a fragilidade da personagem emocionando na medida certa. Outro bom destaque é Alexandre Ferreira com seu patético Mitch. Andressa Cabral se sai bem como Stella, mas falta a Felipe Hofstatter a brutalidade exigida para interpretar Stanley Kowalsky, coisa que fica mais patente com o figurino “arrumadinho” usado por ele (fica difícil acreditar que Stanley use aquele robe de chambre). O restante do elenco cumpre o seu papel.
        Volto a repetir que a interpretação de Marcos de Andrade é tão perfeita que após o estranhamento inicial, esquecemos que estamos diante de um homem travestido, mas sim perante uma frágil senhorita perdida, à procura de um bonde chamado desejo.

PROJETO BRASIL


        Não é fácil escrever sobre esse instigante espetáculo da Companhia Brasileira de Teatro (Curitiba). Trata-se de 16 cenas denominadas pelo encenador Marcio Abreu de discursos verbais e não verbais onde as mostram as mazelas desse bRASIL com letra minúscula: preconceitos, muita violência, individualismo exacerbado. A cor preta predomina nos figurinos, no geométrico e belo cenário e nas bexigas pretas que ao estourarem remetem aos tiros que matam tantos inocentes no dia a dia violento de nossas metrópoles. Para a criação do texto o grupo valeu-se de suas próprias improvisações além de discursos de Christiane Taubira (ex-ministra de Justiça da França) e de Pepe Mujica (ex-presidente do Uruguai). Marcio Abreu assina o texto final.
Rodrigo Bolzan tem um dos melhores momentos de sua sólida carreira de ator e Giovana Soar, além do imenso desgaste físico com tombos e agressões físicas, está ótima na interpretação em libras da letra da música Um Índio de Caetano Veloso e, principalmente, no emocionante monólogo (discurso 15) quase ao final da peça. Nadja Naira e Felipe Storino (músico) completam o elenco. Apesar de tudo a peça acredita no homem. Em que homem não se sabe, mas em um homem que talvez virá (Virá que eu vi). Eis as palavras com que a peça se encerra:
        - Depois do futuro, o fim como começo.
        - Há muitos mundos no mundo.
        - Sonhar outros sonhos.
        - Só o homem nu compreenderá.
        - Ele flutua.

JACY


        “Fale de sua aldeia e estará falando do mundo”. A frase de Tolstoi se encaixa como uma luva no espetáculo Jacy do grupo potiguar Carmin.  A primeira boa surpresa está em estarmos assistindo a espetáculo criado fora do eixo Rio-São Paulo e a segunda, melhor ainda, é que se trata de excelente e criativa montagem.
        Uma frasqueira encontrada ao acaso na rua pelo ator/dramaturgo/diretor Henrique Fontes é o início de tudo. A abertura revelou objetos, cartas e documentos pertencentes a Jacy. Um homem? Uma mulher? De posse do cartão de um taxista o grupo iniciou processo de investigação detetivesca até chegar em Sara, cuidadora de uma senhora de nome Jacy que morreu aos 90 anos em Natal e o resto é história!
        A montagem mostra o processo de investigação, assim como, a vida dessa senhora nascida em 1920 que teve vida nada espetacular a não ser ter vivido em épocas conturbadas como a segunda guerra mundial e a ditadura militar e também ter se apaixonado e casado por capitão americano.
        São dois atores em cena: Quitéria Kelly e Henrique Fontes, auxiliados por Pedro Fiúza que opera som e luz, além de manipular imagens e adereços que são projetados em tela ao fundo do palco. Os recursos são extremamente simples, mas os resultados são muito criativos e significativos. O texto escrito por Pablo Capristano e Iracema Macedo sofreu tratamento dramatúrgico por Henrique Fontes e Pablo Capistrano. A direção de Henrique Fontes é sóbria focando toda a atenção no trabalho dos atores. Quitéria Kelly, além da bela presença, apresenta com versatilidade tanto cenas narradas como interpretativas, o mesmo podendo se dizer de Henrique Fontes. Os desenhos que o ator faz mostrando Jacy se curvando com a idade é um dos momentos mais belos a que já presenciei no teatro (vide foto acima).
        As citações da situação política potiguar, assim como, de fatos acontecidos no passado revelam uma universalidade que faz jus à frase de Tolstoi citada no início desta matéria. Em vários momentos do espetáculo, os atores comentam ironicamente algo parecido com “Mas agora as coisas mudaram...”. Pois é!!
        Jacy faz pensar e também comove pela simplicidade com que foi concebido ao contar história trivial que podia ter ocorrido com qualquer um de nós. Excelente exemplo de teatro documental (gênero que corre o risco de resultar monótono e tedioso) que precisa ser visto.
        O Grupo Carmin completa dez anos neste janeiro e tem respeitável currículo como é mostrado no programa da peça. Espera-se que São Paulo tenha a oportunidade de assistir a outros trabalhos do grupo.

14/06/2017









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