UMA
NOITE DE CELEBRAÇÂO DA LIBERDADE
No final do ano de
1970 estreava no Areninha (andar superior do icônico Teatro de Arena) o
espetáculo Teatro Jornal (Primeira Edição) idealizado por Augusto Boal
para driblar a férrea censura imposta pela ditadura civil-militar. O elenco era
composto por jovens egressos de um curso de teatro, entre eles Dulce Muniz,
Denise Falotico (hoje, Del Vecchio) e Celso Frateschi. No mesmo ano estreava a
última montagem do Arena (A Resistível Ascenção de Arturo Ui) e pouco
depois o Arena deixava de existir. Naqueles anos de triste memória Boal e
Guarnieri cantavam em Arena Conta Zumbi (1965):
“Triste tempo
presente
Em que falar de amor
e flor
É esquecer que tanta
gente
Tá sofrendo tanta dor”
50
anos depois vivemos outro “triste tempo presente” com um governo maldito que
esperemos que comece a acabar em 30 de outubro.
Na
noite de 15 de outubro de 2022 Celso Frateschi estreou no Teatro Anchieta o
espetáculo O Canto do Cisne em comemoração aos seus 52 anos de vida
teatral.
O
Canto do Cisne é uma curta peça em um ato que o autor russo Anton Tchekhov
(1860-1904) chamou de “estudo dramático” onde o velho ator Vassili rememora
momentos de sua carreira com o ponto Nikita (antiga função que consistia em
soprar as falas para os atores quando estes se esqueciam das mesmas).
Dependendo das inserções que o intérprete faça de trechos das peças
rememoradas, uma encenação desse texto pode durar uma ou três horas.
Mantendo
excelente equilíbrio cênico a montagem de Vivien Buckup dura cerca de uma hora
onde Celso/Vassili rememora os trechos de peças de Shakespeare originalmente
citados por Tchekhov, mas inclui uma linda homenagem a dois espetáculos
brasileiros emblemáticos da resistência teatral nos anos de chumbo Liberdade,
Liberdade (citando a fala de abertura, onde Paulo Autran clamava “Eu
sou um homem de teatro...”) e Arena Conta Zumbi (“Minha voz
não pode muito, mas gritar eu bem gritei...Por querer liberdade.”).
O
espetáculo oferece mais uma excelente atuação de Celso Frateschi, com certeza
um dos melhores atores do teatro brasileiro, além de grande ativista pela
liberdade e pelos direitos humanos. Celso está muito bem acompanhado em cena
por Thais Ferrara, um/uma Nikita cômica e humana na medida certa.
O
espaço cênico criado por Sylvia Moreira, bastante poético, remete a um palco
vazio com elementos como um pilar grego e estrelas ao fundo. Os figurinos
também são assinados por Sylvia.
A luz de Wagner
Freire, o importante visagismo de Leopoldo Pacheco (o velho Vassili esqueceu de
tirar a maquiagem!) e a linda trilha de Dan Maia completam a ficha técnica
desta cuidada e bela produção.
Não bastasse a emoção
gerada pelo espetáculo, o professor/pesquisador Welington Andrade subiu ao
palco ao final do espetáculo e, após aguardar os aplausos do público e as
manifestações pró Lula, prestou uma emocionada homenagem a Frateschi,
relembrando sua carreira e sua atuação como cidadão brasileiro.
E a emoção não parou
por aí! Presente na plateia a mais que querida Luiza Erundina que foi alvo de
uma salva de palmas tão intensa quanto aquela antes dirigida a Frateschi e ao
espetáculo.
Noite memorável que só podia terminar com um coquetel oferecido no saguão do também icônico Teatro Anchieta. Muitos abraços e muitos votos de esperança em um Brasil melhor.
O Canto do Cisne faz parte do projeto O Teatro de Onde Eu Venho que marca os 50 anos da carreira de Celso Frateschi. Realizado pelo SESC Consolação de outubro a dezembro. (vide detalhes na programação da unidade)
16/10/2022
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