sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

O JARDIM DAS CEREJEIRAS



        No ano 2000 ao escrever sobre O Jardim das Cerejeiras dirigida por Elcio Nogueira, Mariangela Alves de Lima abria sua matéria em O Estado de S. Paulo com a seguinte frase: “Na história do teatro brasileiro, as encenações de Anton Chekhov são mais escassas do que as de tragédias gregas ou dos textos clássicos de outros períodos da história”. Uma análise rápida dos textos clássicos estrangeiros montados em São Paulo mostra que nos últimos dezoito anos esse cenário mudou e o nome de Tchekhov é bastante presente deixando, às vezes, atrás de si os clássicos gregos, Brecht, Beckett, aqueles americanos tão caros à cena paulistana (Tennessee Williams, Eugene O’Neill e Arthur Miller) e até Shakespeare! (vide o ano de 2014).

Anton Tchekhov (1860-1904)

        O desencanto presente na obra do dramaturgo russo e a passividade de seus personagens seriam algumas das razões da escolha dos nossos encenadores por sua obra nos dias de hoje? Existe interessante análise desse assunto no recém-lançado Tchekhov e os Palcos Brasileiros de Rodrigo Alves do Nascimento (Editora Perspectiva).   
        Uma comédia de Tchekhov abre a temporada teatral paulistana. Comédia? O Jardim das Cerejeiras é assim classificada pelo autor, talvez pelas interferências das personagens dos criados Duniacha, Iacha e Firs e principalmente do irmão de Liuba, Gaev que na verdade estão mais para patéticos do que para engraçados. O tema principal da peça, no entanto, não é nada cômico, pois trata da decadência da elite russa diante da ascendência de uma nova classe dona do dinheiro.
        O Grupo TAPA comemora seus 40 anos de vida com a encenação dessa que foi a última peça escrita por Tchekhov e a escolha não podia teria sido mais acertada. O belíssimo texto revela-se bastante atual, tem o perfil de seu diretor Eduardo Tolentino de Araujo e dá chance de grandes interpretações para atrizes e atores que acompanham o TAPA desde a sua fundação, assim como a outros que foram se incorporando ao grupo.
        Contando com a belíssima iluminação do constante colaborador Nelson Ferreira e com o despojado cenário cuja autoria não consta do programa, Tolentino realiza espetáculo delicado, de rara beleza e com interpretações antológicas. É particularmente belo o momento em que a contrarregragem transforma velho guarda roupa em janela na qual Liuba, Gaev e Vária ficam admirando o jardim das cerejeiras.
        Sergio Mastropasqua empresta ao seu Lopakhin toda a ambiguidade requerida pelo personagem. Natália Beukers é uma deliciosa surpresa como a criada Duniacha. Anna Cecília Junqueira tem a responsabilidade de interpretar Vária, uma das mais importantes personagens da peça, e o faz com muita dignidade. A personagem do criado Firs é feita com a habitual competência de Guilherme Sant’Anna, apesar de a barba dificultar o total entendimento de suas falas.
        Brian Penido Ross está muito à vontade como Gaev, perdido em seus sonhos e devaneios e Clara Carvalho mais uma vez empresta seu imenso talento para a personagem principal da peça que é Liuba, proprietária do cerejal que está prestes a ser destruído por conta da especulação imobiliária representada por Lopakhin. Sua belíssima interpretação soma-se a outras maravilhosas Liubas vividas no Brasil por Vanda Lacerda (1968 – RJ), Cleyde Yáconis (1982 – SP), Nathalia Timberg (1989 – RJ), Tônia Carrero (2000 – SP) e Carolina Fabri (2014 – SP).

Programas de montagens a que assisti

        O que virá após a derrubada do cerejal? Existe a esperança profetizada pelos jovens Pétia e Ânia?   Muitas perguntas, poucas respostas, mas o que sabemos é que Tchekhov antecipou em sua obra a Revolução Russa que aconteceria 13 anos após ela ter sido encenada pelo Teatro de Arte de Moscou, dirigida por Stanislavski.

        O JARDIM DAS CEREJEIRAS está em cartaz no Teatro Aliança Francesa até 24/02 com sessões de quinta a sábado às 20h30 e domingo às 19h. Além das apresentações o grupo fará, durante a temporada, ciclo de leitura de dramaturgos russos toda segunda feira às 19h.
        A peça abre com chave de ouro a temporada teatral paulistana.

IMPERDÍVEL

        11/01/2019

        
        
        
        

2 comentários:

  1. Olá, José! Fico feliz que de algum modo você tenha tomado contato com meu livro sobre a recepção de Tchékhov no Brasil! Espero que tenha gostado!

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  2. Oi Rodrigo. Não só tomei contato como também tenho o livro como referência em relação às montagens tchekhovianas no Brasil. Belo e abrangente trabalho. PARABÉNS.

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