quarta-feira, 29 de maio de 2019

A VIDA ÚTIL DE TODAS AS COISAS



        Não são só as mercadorias que têm prazo de validade. Os animais, entre eles nós os humanos, também temos um tempo para ser saudável, desenvolver e depois começar a decair até expirar. Hoje já podemos trocar órgãos vencidos por meio de transplantes. No futuro a Family Made Factory (só podia ter nome em inglês) irá nos oferecer novas formas de vida. De vida? Sem querer ser spoiler (outro nome em inglês!), é mais ou menos disso que trata a peça de Kiko Rieser em cartaz na cidade. Um avô com prazo de validade prestes a vencer, seu filho e sua neta são as personagens da peça, além da atendente da Family Made.
        Rieser se muniu de ótima equipe técnica para produzir sua peça: a competência e a criatividade de Marisa Bentivegna estão presentes no cenário repleto de gavetas de onde podem sair desde os pesos para musculação da neta até os relatórios da Factory; Gregory Slivar é responsável pela trilha sonora que comenta a ação e embala as entre cenas; Aline Santini se encarrega dos belos efeitos luminosos e os sóbrios figurinos são de Kleber Montanheiro que dá um tom de futurismo apenas nas roupas da atendente.
        E para completar, o elenco! João Bourbonnais dá vida ao avô que começa a demonstrar “vencimento” com seus lapsos de memória; Louise Helène inicia como uma menina frívola preocupada com seu físico e tem seu bom momento dramático ao final da peça; Eduardo Semerjan empresta vigor à revolta do pai que resiste a trocar seu velho pai por algo muito parecido com ele e, finalmente, Luciana Ramanzini como a burocrática atendente da Factory é responsável pelos momentos mais engraçados da peça (na verdade, a burocracia do seu atendimento tende para o trágico, mas acaba-se rindo da kafkiana situação).
        A meu modo de ver, dez minutos a menos não fariam mal à encenação. A cena onde o pai comenta com a filha sobre a escolha daquele apartamento pela falecida esposa criada pelo dramaturgo para mostrar a reumanização dele é muito longa e perde-se em detalhes que não acrescentam nada à trama. Outra cena longa é aquela final onde a atendente repete à neta o que poderia ser feito com seu pai (é o mesmo discurso que ela fez em cena anterior para o pai em relação ao avô).
        A peça tem excelente final aberto onde o público deve concluir qual será a decisão da jovem.
        Kiko Rieser é artista preocupado com o seu tempo e com os rumos que a humanidade vem tomando e sua peça é compatível com seu pensamento.


        A VIDA ÚTIL DE TODAS AS COISAS está em cartaz na Oficina Cultural Oswald de Andrade às quintas e sextas às 20h e aos sábados às 18h até 15/06. Entrada franca.

 

        29/05/2019

         

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