Em tempos de Copa, Fernanda Capobianco marca mais um gol
para o aconchegante e belo Instituto que leva o seu sobrenome: após a mais que
bem sucedida carreira do premiado Cais ou
Da Indiferença das Embarcações
(agora em cartaz na Oficina Cultural Oswald de Andrade) estreou ontem no local Gotas d’Água Sobre Pedras Escaldantes que
tem todas as qualidades para também cumprir uma temporada de sucesso.
O texto é um dos primeiros trabalhos para teatro do
dramaturgo/cineasta alemão Rainer Werner Fassbinder (1945-1982) e já contém
todos os elementos que iriam caracterizar a sua obra perenizada pelo cinema:
manipulação pelo sexo, violência, homossexualismo e paixões avassaladoras e
destrutivas. Neste caso o amoral Leopold manipula as três personagens que o
rodeiam: Franz, o jovem frágil e indefeso; sua ex-namorada Ana e a estranha
Vera, um caso antigo de Leopold. O texto tem diálogos ágeis e uma narrativa bem
estruturada dividida em cinco tempos: o primeiro contato dos dois homens/a
relação dos mesmos, meses depois/a chegada de Ana/ a chegada de Vera/o contato
final de Vera e Franz.
Bons atores são fundamentais para uma peça que tem sua base
na relação tensa entre as personagens e o presente elenco cumpre a tarefa
plenamente. Luciano Chirolli tem uma das melhores interpretações de sua
carreira como Leopold que é o centro de todas as atenções e gerador de todas as
reações das outras personagens; sentado imponentemente com as pernas muito
abertas ele aparenta toda a imponência vulgar de alguém que suas vítimas vêm
como um semideus. Nana Yazbek é correta na interpretação de Ana, a personagem
menos envolvente da trama. Gilda Nomacce tem uma entrada exuberante em cena,
exibindo todo o seu charme nos primeiros momentos e todo o seu talento no
comovente diálogo final com Franz. A grande surpresa da montagem é Felipe
Aidar, um jovem ator que, ao que fui informado, faz sua estreia profissional
neste espetáculo e que se sai muitíssimo bem na interação com os tarimbados
Luciano e Gilda.
O cenário de André Cortez aprofunda o espaço do subterrâneo
do Instituto e tem um efeito muito interessante com o deslocamento de uma das
paredes. Esperava-se um maior uso desse recurso cenográfico.
A direção de Rafael Gomes privilegia o trabalho dos atores,
salientando a expressão corporal dos mesmos e em especial de Felipe Aidar na
passagem da primeira para a segunda cena. O deslocamento dos móveis da casa e
até o estranhamento causado por um rodapé solto são recursos muito bem usados
pela direção para mostrar o desmoronamento moral daquelas frágeis criaturas.
Mais uma vez quero comentar o diálogo final de Vera e Franz,
onde ela vê em Franz o seu passado e ele a vê como seu futuro. Momento sublime
de texto que Gilda Nomacce e Felipe Aidar junto com o diretor Rafael Gomes
souberam tão bem transpor para a cena. São esses instantes de emoção comungados
com o público que nos fazem amar cada vez mais o teatro.
Cabe informar que, com o mesmo título, a peça foi filmada
pelo cineasta francês François Ozon em 2000.
Gotas D’Água Sobre Pedras Escaldantes está em cartaz no
Instituto Capobianco às sextas (21h30), aos sábados (21h) e aos domingos(20h)
até 21 de setembro. VALE A VIAGEM!!
O que ecoou em mim foi o fascínio que o dominador exerce sobre o dominado. Essa submissão afetiva, muito bem construída pelo autor, está muitíssimo bem representada por elenco e direção. Obrigada José!
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